Desde há dois anos que se fala numa ‘solução’ para o crédito malparado ou em risco de não ser pago. Só que este problema não tem uma solução mágica, apenas iniciativas que aliviem um pouco a enorme quantidade do empréstimos de cobrança duvidosa, de quase um terço das empresas que operam em Portugal.
Assim, uma entidade em que participará, entre outros, o chamado ‘banco de fomento’ (o nome oficial é Instituição Financeira de Desenvolvimento) ficará com créditos problemáticos de empresas que sejam economicamente viáveis, embora tenham graves problemas de tesouraria. É uma distinção muito difícil de fazer na prática, embora não em teoria. E por bem sucedida que se revele a nova entidade, não evitará a perda de dinheiro público (dos contribuintes) e privado (de alguns bancos).
O endividamento das empresas portuguesas, que se faz sentir sobretudo na construção e nas pequenas e médias empresas (PME), superou mesmo a dívida do Estado. Está acima da média europeia, apesar de algumas ligeiras melhorias recentes. E trava, claro, a concessão de novos empréstimos bancários. Os bancos, por sua vez, apenas terão provisionado cerca de metade do crédito malparado que concederam, o que cria uma situação delicada. Sobretudo numa altura em que foi exigida aos bancos portugueses uma mais alta capitalização, para prevenir riscos.
Os gestores bancários também têm, naturalmente, responsabilidade no peso do crédito malparado na economia portuguesa. Houve um excesso de otimismo da banca em emprestar dinheiro a empresas com escassas garantias, desde logo de viabilidade económica futura.
As persistentes taxas de juro a níveis historicamente muito baixos dificultam a rendibilidade dos bancos. Mas foram, em boa parte, esses juros baixos que levaram muitas empresas a endividarem-se mais do que o razoável. E a decisão da agência de notação Standard & Poors de tirar do nível ‘lixo’ a dívida pública portuguesa, bem como a dívida do BPI e do Santander Totta, sendo obviamente benéfica para a economia portuguesa, não fará subir os juros, pelo contrário.
Em particular em empresas de pequena dimensão há uma tradicional alergia, entre nós, a aumentar os capitais próprios com dinheiro vindo de fora, eventualmente admitindo novos sócios. Receia-se, porventura, que esses sócios venham limitar a autonomia de gestão do tradicional ‘dono’ da empresa. Ora a gestão da maioria das PME nacionais não parece ser de alta qualidade em matéria financeira.
Da parte dos bancos também existiu uma certa tendência para manter nos balanços empresas devedoras sem qualquer hipótese de futuro. As falências ainda são encaradas na sociedade portuguesa como algo pecaminoso, que envergonha – em vez de serem vistas como uma experiência que correu mal, mas da qual se aprende para novas tentativas. Acresce que, apesar de várias alterações, a legislação portuguesa lida mal com as insolvências e a execução de hipotecas.
Por outro lado, o facto de vivermos em clima de muito baixa inflação (a deflação ameaçou várias vezes nos últimos anos) retirou aos devedores o alívio que era, no último quartel do século XX em Portugal, a forte alta dos preços. A inflação reduzia o valor real da dívida. Agora, o BCE tenta há longos meses atingir uma inflação na zona euro de 2% ao ano. Ainda não o conseguiu: está em 1,5%.