Ana Gomes não alinha nos ataques do PS a Catarina Martins. A afirmação de que o partido é permeável aos grandes interesses económicos gerou uma onda de críticas à coordenadora do Bloco, mas a eurodeputada entende que enquanto o PS não fizer uma reflexão sobre os anos de José Sócrates «fica permeável a esse tipo de críticas».
Ao SOL, Ana Gomes defende que «o PS precisa de pôr a mão na consciência e assumir o erro de se ter deixado capturar por um sujeito como o Sócrates, independentemente do processo judicial e daquilo que vai ser julgado».
A socialista diz não ter «dúvida nenhuma de que estamos perante um indivíduo que instrumentalizou o PS para um projeto pessoal de poder e de enriquecimento e o PS tem de analisar porque é que se deixou instrumentalizar e tirar consequências disso. Isso aconteceu porque efetivamente havia gente permeável a interesses».
Aos que criticaram a coordenadora dos bloquistas por ter colado o PS aos interesses económicos, Ana Gomes responde que não serve «para fazer de virgem ofendida. Haverá quem sirva, mas não é o meu caso».
A relação entre o PS e o Bloco tem tido altos e baixos. O episódio do chumbo inesperado da taxa sobre as energias renováveis foi um dos piores momento dessa relação. Catarina Martins ajudou a tornar o ambiente ainda mais tenso quando afirmou que «o PS é permeável aos grandes interesses económicos». Nem é comum, desde que existe a geringonça, o PS atacar os bloquistas, mas durante esta semana não houve nenhum dia em que Catarina Martins não fosse alvo de críticas.
Nem o presidente do partido evitou disparar contra o parceiro de coligação. «Não aceitamos nenhuma superioridade moral de nenhum partido, inclusive dos nossos aliados», afirmou Carlos César, na TSF.
Socialistas dispensam «sermões» do Bloco
A reação do líder parlamentar surgiu seis dias após a entrevista e depois de alguns socialistas terem apelado à direção do partido para não deixar o BE sem resposta. Francisco Assis foi o primeiro a considerar as declarações de Catarina Martins «um ataque de caráter» ao partido. Assis, que liderou a contestação à geringonça quando Costa assinou os acordos, voltou ao tema na quinta-feira, num artigo no Público, e acusou o Bloco de Esquerda de violar «regras fundamentais da própria convivência democrática». A posição assumida pelo eurodeputado foi aplaudida dentro do PS, mesmo por alguns dos defensores da aliança à esquerda. Manuel Alegre disse ao Diário de Notícias que «não é aceitável ter uma situação em que há dois partidos que passam a vida a dar lições de moral a um outro, que as recebe, calado».
O ataque da líder do Bloco ao PS serviu também para despertar alguns dos críticos da geringonça. «Se ela diz que o PS e o governo são permeáveis aos interesses económicos, a minha pergunta é: qual é o interesse do Bloco em apoiar o governo?», diz ao SOLo ex-dirigente do partido, José Junqueiro.
Álvaro Beleza também se mostrou agastado com os ataques do BE e defendeu que «já chega de sermões semanais do Bloco, como se fossem os guardiões da boa moral», porque «o PS não recebe lições de ética política republicana de ninguém». Fernando Jesus, deputado do PS que fez parte da direção da bancada nos tempos de António José Seguro, disse ao i que a atitude do BE é «condenável».
Presidente do PS quer maioria absoluta nas legislativas
O ambiente já foi melhor, mas ninguém dramatiza a troca de críticas entre os parceiros e dos dois lados existe a ideia de que a geringonça vai até ao fim da legislatura. A seguir às eleições, a conversa é outra. Carlos César não escondeu que o ideal seria o PS conquistar a maioria absoluta para não depender dos outros partidos. Numa entrevista à Rádio Renascença, esta semana, o presidente do PS descreveu a geringonça como «um bem menor». O «bem maior seria o PS ter um Governo com maioria absoluta», acrescentou.
Ao contrário de António Costa, o presidente do PS faz depender a renovação da geringonça dos «desenvolvimentos desta segunda metade da legislatura» e dos «resultados eleitorais». António Costa já afirmou que, mesmo com maioria absoluta, «seria útil» renovar os acordos se existir disponibilidade do PCP, Bloco de Esquerda e PEV.
Os socialistas sabem que esse é um resultado difícil de alcançar e até lá não podem fechar a porta a nenhum cenário.