Mesmo depois de Vieira da Silva ter sido ouvido na comissão do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social que se realizou na segunda-feira, o tema da Raríssimas foi um dos principais assuntos do último debate quinzenal com o primeiro-ministro.
Costa negou a acusação afirmando que Vieira da Silva “não violou o código de conduta”. “A única coisa que tenho para lhe dizer é que eu e o senhor ministro [Vieira da Silva] estamos de consciência tranquila sobre o que fizemos ou deixámos de fazer sobre essa matéria”, rematou Costa.
A resposta era dada a Hugo Soares, líder parlamentar do PSD, que acusou o ministro de ignorar “olimpicamente” a denúncia da Federação das Doenças Raras (FEDRA) e de ter violado “o código de conduta que o seu governo aprovou”. Em causa está a tomada de decisões sobre entidades em que tinham exercido funções. “Já não é só palavra dada que não é honrada, agora é também a letra da lei que não é validada”, remata o social-democrata.
O primeiro-ministro deixou ainda um desafio ao adversário político: “Se tem evidência que [o ministro] violou o código de conduta, acuse. Não se escude em retórica insinuadora”.
Para Assunção Cristas, líder do CDS, Vieira da Silva está “particularmente fragilizado”, não só pela polémica à volta da Raríssimas mas também pela falta de acordo com a concertação social sobre o valor do salário mínimo e o caso Autoeuropa. “Considera que o seu ministro tem condições de robustez e de peso político para tratar de temas tão importantes como estes?”, questionou a deputada democrata-cristã. Costa recusa-se a entrar “no concurso de demagogia”, do qual afirma sair “facilmente derrotado” e lembra que o diálogo com os parceiros “não significa aceitar tudo que alguns parceiros sociais propõem”.
Santa Casa da Misericórdia e o Montepio
“A que propósito e a que título solicitou à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa que investisse no Montepio”, questionou Hugo Soares. António Costa salvaguardou-se no comunicado enviado por Pedro Santana Lopes, ex-provedor da instituição, onde afirma terem existido reuniões com o governo e com o Banco de Portugal, que viram “com bons olhos essa possibilidade, tendo declarado sempre que respeitavam a esfera da autonomia da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa”. Ainda no documento, Costa citou que Santana Lopes, juntamente com a Mesa da Santa Casa decidiram que “antes de mais, deveria ser efetuada uma auditoria À situação quer da Caixa Económica do Montepio, quer do seu acionista, Associação Mutualista”.
Costa acrescentou que “a auditoria ainda não está concluída”, o que implica que ainda não foi tomada uma decisão sobre o assunto.
O assunto volta a ser discutido durante a intervenção do CDS, quando Assunção Cristas pergunta ao primeiro-ministro “se fica confortável com a Santa Casa pôr no Montepio mais de 200 milhões de euros” e se “acha que é razoável retirar dinheiro para os que mais precisam para alocar no banco”. O chefe do executivo recusou-se a ser “instrumentalizado na luta interna dentro do PSD”. “Trabalhámos sempre com muito respeito por Santana Lopes e não tenho mais nada a acrescentar ao que ele disse sobre esta matéria”, rematou.
Governo não vai renacionalizar CTT
Face às questões de Catarina Martins, do Bloco de Esquerda, que acusou os acionistas privados de estarem a “pilhar a empresa” e a “destruir os CTT” António Costa descartou a possibilidade de reverter a privatização dos CTT. “Não é intenção do governo nacionalizar os CTT. Sendo uma entidade pública sob concessão não havia lugar a nacionalização, quando muito haveria lugar ao resgate da concessão”.
Sobre o resgate, a questão terá de esperar pela avaliação da Anacom (Autoridade Nacional de Comunicações). “A questão do resgate pôr-se-á ou não nos termos do contrato e nos termos da avaliação que cabe em primeiro lugar à Anacom”, explica o primeiro-ministro lembrando que o regulador já identificou uma situação de incumprimento do contrato e aplicou sanções aos CTT. “Se isso é suficiente, duvido que seja. Há uma coisa que devemos refletir: se um serviço público como o serviço postal deve ser avaliado pela valorização acionista em bolsa ou pela qualidade dos serviços prestado aos cidadãos”, afirmou.
A multa da Anacom, relembra Heloísa Apolónia, d'Os Verdes, “fez baixar o preço do correio em 0,003%”, mas ressalvou que “desde a privatização, o preço aumentou 47%”. “O que isto quer dizer é que vale a pena prevaricar”, acrescentou.
A coordenadora do Bloco de Esquerda advertiu o primeiro-ministro de que “se o Estado fica à espera, não vai ter nada para resgatar”, lembrando que “a entrega diária acabou e, nas zonas rurais, o correio é entregue apenas uma ou duas vezes por semana”. “Há pensionistas que desesperam com o atraso nos vales das pensões”, acrescentou, “a população mais frágil está abandonada”.
Jerónimo de Sousa, do PCP, e Carlos César, do PS, criticaram o antigo governo por ter procedido à privatização da empresa.
Prendas de Natal e insultos
A discussão aqueceu entre António Costa e Assunção Cristas. A líder do CDS trouxe um espelho retrovisor como prenda de Natal para António Costa, depois do primeiro-ministro lhe ter prometido um no ano anterior, “para olhar para trás e ver que está a voltar a padrões antigos”.
O chefe do executivo não se deixou ficar e chegou mesmo a utilizar o espelho oferecido pela líder do CDS para mostrar a Jerónimo de Sousa que “o que incomoda a direita” é que ao olhar pelo retrovisor “via 505 euros de salário mínimo nacional” onde vê “amanhã 580 euros”, “uma taxa de desemprego que estava nos 12,6% e que agora está nos 8,5%” e ainda a diferença entre uma “economia a arrefecer” durante a segunda metade de 2015 comparada com “o maior crescimento económico” este ano.
Costa criticou Cristas por já não perguntar sobre a dívida, afirmando que a deputada centrista “andou apaixonada pela dívida”. “Porque é que não me fala mais da dívida? Já não está preocupada com a dívida? A senhora deputada tem a coerência de um salta-pocinhas”, afirmou o primeiro-ministro.
Para além de salta-pocinhas, Costa rebaixou Cristas: “Já reparei que a senhora deputada quanto mais irrelevante politicamente é, mais sobe o tom do insulto que usa no seu debate político”. Para o secretário-geral do PS a “relevância” de Cristas não passa dos “2,59% da sociedade portuguesa”, tirando o resultado que teve “à boleia” do PSD