A contestação interna dentro da Autoeuropa está a ganhar maiores contornos. A guerra não se limita a implementação dos novos horários de trabalho que estão a ser impostos pela administração a partir de janeiro e sobre os quais, ao que o SOL apurou, não há qualquer margem de negociação. Estende-se agora à própria Comissão de Trabalhadores (CT). O SOL sabe que há um grupo de trabalhadores que não se sente representado pela estrutura liderada por Fernando Gonçalves e já fez um abaixo-assinado para apresentar várias propostas alternativas às que foram apresentadas pela CT.
Foi com base nesse documento criado pelo movimento Juntos que os trabalhadores aprovaram dois dias de greve marcados para dia 2 e 3 de fevereiro, altura em que já terão entrado em vigor os novos horários de trabalho, caso a administração da fábrica de Palmela não tenha recuado nas suas intenções. No entanto, para que a paralisação se concretize é necessário que seja convocada pelos sindicatos, como o Site-Sul, que foi o rosto da última greve.
Ao mesmo tempo, este grupo de trabalhadores defende que «em «todos os passos no processo de negociação com a administração, a Comissão de Trabalhadores se apresente com um advogado». O próximo encontro está marcado para dia 5 de janeiro, uma vez que nos próximos dias a fábrica de Palmela vai estar parada por falta de peças.
Tal como foi defendido pela CT, este grupo pede aumentos salariais de 6,5% em 2017/2018, mas acrescenta outro aumento de 6,5% em 2018/2019 com um mínimo de 50 euros por cada ano. E pedem à administração que seja preparado um turno de fim de semana de 12h ao sábado (0h às 12h) e 12h ao domingo (12h às 24h), que permita que as folgas não sejam rotativas, nem de apenas um dia, apurou o SOL.
O baixo-assinado recorda ainda que «o trabalho por turnos já é uma forma de organização do trabalho prejudicial à vida familiar e à saúde dos trabalhadores», lembrando ainda que, «segundo o contrato coletivo em vigor, a fábrica não tem permissão para impor laboração contínua e trabalho ao sábado à noite sem o consentimento dos trabalhadores».
Estas exigências vão ser defendidas pelo Site-Sul junto da administração no encontro que se vai realizar a 9 de janeiro. «A postura da comissão sindical e do sindicato tem sido de reivindicar, junto da administração, condições de trabalho que correspondam à vontade e interesses dos trabalhadores. Será isso que continuarão a fazer, sem condicionalismos externos, demagogia nem populismos», revelou o sindicato, acrescentando ainda que, «tal como na greve de 30 de agosto, o sindicato está e estará com os trabalhadores na construção da unidade, para uma resposta forte e determinada às tentativas de cerceamento dos direitos».
Sem margem para negociar
Tal como o SOL anunciou, a administração da Autoeuropa está apenas disponível para negociar com a Comissão de Trabalhadores os novos horários de trabalho a implementar a partir de agosto, ou seja, altura em que arranca o horário contínuo. Aliás, essa indisponibilidade já foi reconhecida por Fernando Gonçalves, que admitiu surpresa depois de ter sido isso que ficou combinado com o ministro Vieira da Silva no final da semana passada.
«Depois da reunião com o ministro do Trabalho, o que ficou combinado foi que retomaríamos as negociações na segunda-feira, o que aconteceu. Mas quando chegámos a essa reunião, o que nos foi comunicado pela administração foi que não havia nada para decidir, que iam impor o horário anunciado», referiu o dirigente.
Ainda assim, a Comissão de Trabalhadores prepara-se para apresentar o seu caderno reivindicativo que ainda não está fechado, já que vai ser submetido a discussão durante o mês de janeiro.
Fernando Gonçalves chama ainda a atenção para a existência de um «sentimento de revolta» dos trabalhadores devido a «um acumular de situações ao longo dos últimos anos».
Exigências da TC
A existência de uma creche a funcionar 24 horas por dia é uma das soluções encontradas pela CT para minimizar as alterações dos novos horários de trabalho, especialmente quando a fábrica de Palmela começar a funcionar de forma contínua, ou seja, a partir de agosto.
A verdade é que esta solução vai ao encontro das declarações feitas pelo ministro Vieira da Silva, na sexta-feira passada, após a reunião entre Comissão de Trabalhadores e administração da Autoeuropa, ao assumir que o «Governo assumirá as suas responsabilidades, que podem ser concretizadas com um envolvimento mais forte no que toca ao reforço da criação de equipamentos sociais de apoio à família que responda a um novo quadro horário, por exemplo».
A par dos aumentos salariais, esta estrutura quer que todos os trabalhadores que a 1 de janeiro estejam com contrato a termo há mais de 12 meses passem imediatamente a efetivos e defende uma redução do prazo para a promoção de carreiras. Por outro lado, a empresa deverá comprometer-se a não fazer qualquer despedimento coletivo até 31 de dezembro de 2019.
A estrutura liderada por Fernando Gonçalves defende ainda a redução da idade da reforma. Para isso, defende a criação de um grupo multidisciplinar «para elaborar e apresentar uma proposta ao Parlamento com o objetivo de reduzir a idade de reforma para trabalhadores em regime de turnos rotativos na indústria automóvel», revela o caderno reivindicativo a que o SOL teve acesso.