Esmond Bradley Martin morreu com uma faca no pescoço numa hora desconhecida, provavelmente na madrugada desta segunda-feira, embora a sua mulher só o tenha encontrado pela tarde, ensanguentado e deitado na cama da casa que mantinha nos arredores de Nairóbi. A polícia queniana diz, para já, que a teoria principal é a de que Martin foi assassinado na sequência de um assalto falhado. No mundo do conservacionismo e das campanhas contra o tráfico de marfim, porém, sabe-se que o ouro que paga os chifres de elefante e rinoceronte paga muitas vezes também a morte de quem os protege. Aconteceu com Wayne Lotter há um ano. Pode ter acontecido com Esmond Bradley Martin agora.
Martin morreu aos 75 anos, mas longe de terminar o seu trabalho de investigação das rotas de comércio de marfim pelo mundo. Antes dos seus primeiros relatórios, muito meticulosos e inovadores, pouco se conhecia sobre as quantidades de chifres em circulação nos mercados negros.
Foi Esmond Bradley Martin quem revelou pela primeira vez, na década de 1970, os números arredondados da maré de chifres que por aqueles anos eram livre e violentamente arrancados aos cadáveres de elefantes e rinocerontes africanos, sobretudo no Quénia, para onde se mudou nessa década, mas também então em Angola, Moçambique, Nigéria, Sudão e Egito.
“O Esmond foi um dos grandes heróis desconhecidos do conservacionismo”, escrevia esta segunda-feira Iain Douglas-Hamilton, o fundador da organização Save The Elephants, com quem o nova-iorquino trabalhou 45 anos. Hamilton, um de entre dezenas conservacionistas que lamentam publicamente a morte de Martin, prossegue: “O seu trabalho meticuloso em torno dos mercados de marfim e presas de rinoceronte deu-se muitas vezes em alguns dos locais mais remotos e perigosos do mundo e foi levada a cabo em horários tão exigentes que um homem com metade da sua idade teria ficado exausto”.
“Estava muito à frente dos outros no que diz respeito a saber que quantidades de marfim e presas de rinoceronte estavam em circulação”, escreve, por sua vez, Paula Kahumbu, a líder queniana da organização WildlifeDirect.
Esmond Bradley Martin foi um geógrafo de formação que cedo se envolveu nos trilhos do conservacionismo, pelo momento em que o mundo se apercebia letargicamente que os elefantes e rinocerontes africanos se aproximavam com perigo da extinção num continente que chegaram a ocupar, há não muito tempo, na ordem dos milhões. Se há cem anos, por exemplo, existiam cinco milhões de elefantes em África, hoje esse número ronda os 400 mil. Já os rinocerontes em liberdade caíram para a ordem dos 30 mil indivíduos.
Os seus relatórios revelaram em muitas instâncias o percurso das presas e contribuíram, quase a sós, para que a China proibisse o comércio interno de chifres de rinoceronte na década de 1990 e apenas no mês passado ilegalizasse todo o comércio de marfim. “Atirou uma corda de salvação aos elefantes africanos e fez renascer uma nova esperança na batalha para acabar com a caça furtiva de dezenas de milhares de animais todos os anos por causa das presas”, escreveu Simon Denyer, jornalista do “Washington Post”.