Debaixo de fortes críticas de médicos, o ministro da Saúde demarcou-se ontem dos atrasos na abertura de concursos para colocar jovens especialistas, atribuindo as responsabilidades às Finanças. É preciso uma assinatura no despacho e não é a sua. “São precisas duas assinaturas e um despacho conjunto. Este ano há um atraso maior porque o processo está no Ministério das Finanças à espera de ser concluído”, afirmou Adalberto Campos Fernandes, que até aqui não tinha sido tão direto na separação de águas quanto ao tempo de resposta de ambos os ministérios.
Ontem foi publicado um despacho que autoriza a abertura de concursos para recrutamento de médicos, mas só para a especialidade de medicina geral e familiar. Foi assinado por Mário Centeno a 15 de fevereiro e permitirá aos médicos que concluíram esta especialidade em outubro do ano passado preencherem 110 postos de trabalho em centros de saúde.
No caso das especialidades hospitalares, para as quais ainda não existe uma indicação concreta sobre quando serão abertos os concursos, estão à espera não só os médicos que concluíram o internato em outubro como também os da primeira leva da formação em 2017, que terminaram a formação como especialistas em abril – portanto, há dez meses, compasso de espera que nunca se tinha verificado nos últimos anos. Há cerca de 700 médicos nesta situação e tanto Ordem como sindicatos têm alertado que, quanto maior a demora, maior a probabilidade de optarem por ir para o setor privado ou emigrar. No único concurso que abriu no ano passado para recém-especialistas, destinado aos jovens médicos que concluíram a formação em medicina geral e familiar, 52 das 218 vagas acabaram por ficar por preencher depois de os restantes candidatos terem optado por não concorrer.
O ministro da Saúde reafirmou que o concurso será aberto dentro de dias, prazo que tinha indicado a 10 de janeiro no parlamento, desvalorizando ainda assim que o atraso seja tão excecional como apontam a ordem e os sindicatos e lembrando que os concursos nunca foram imediatos mal os médicos concluíam a formação, embora essa seja há muito a reivindicação no setor. “Essa questão dos dez meses é uma questão de fazer contas, todos os anos tem havido atrasos. Este ano há um atraso maior.”
Críticas sobem de tom Hoje, o bastonário dos médicos acompanhará a entrega de uma carta aberta no parlamento por parte de um grupo de recém-especialistas que se mobilizou nas últimas semanas para contestar os atrasos nos concursos. “Na passada sexta-feira, um mês depois [da ida ao parlamento], o ministro reafirmou que está por dias e até o primeiro-ministro ironizou a questão no Parlamento, afirmando mesmo que até podia dizer que está por segundos, não importa é quantos segundos”, disse Miguel Guimarães. “Perante estes factos, sou forçado a admitir que já não podemos acreditar no ministro da Saúde.”
O Sindicato Independente dos Médicos assume um tom igualmente duro: “É lamentável que um ministro do governo da República aceite pública e cordatamente ser um ministro de 2.a Classe”, escreveu o SIM no seu site. “V.Ex.a já há muito que para o SIM passou a linha vermelha… por ser um mau pagador de promessas, por ser um negociador sem credibilidade porque não respaldado no governo, e pelo desrespeito que tem demonstrado para com os médicos do SNS”, lê-se na nota.
As críticas à morosidade das respostas por parte das Finanças no que toca à gestão de recursos humanos no SNS não são exclusivas dos médicos. Em entrevista ao i na edição ontem, Carlos Martins, presidente do Hospital de Santa Maria, assume que é mais difícil substituir hoje pessoal do que no tempo da troika. “Não posso substituir sem autorização das Finanças, senão fico sob alçada de responsabilidade criminal”, afirma o presidente do maior hospital do país.