Quem acompanhou o crescimento de Rúben Semedo olha com total surpresa para a atual fase que o futebolista português está a atravessar fora das quatro linhas, em Espanha. Simplicidade, humildade, trabalhador e persistência são apenas algumas palavras utilizadas para descrever o internacional sub-21 que se encontra novamente a braços com a justiça espanhola.
Mas, afinal, quem é e quais são as origens do jogador que nos últimos quatro meses já foi detido por três vezes no país vizinho?
Aos 23 anos, a história de Rúben Semedo está (muito) longe de ser um conto de fadas. Cresceu no bairro social Casal de Mira, zona problemática na Amadora, e desde cedo que a vida o foi colocando à prova. Tinha apenas cinco anos quando surgiu a primeira adversidade: a prisão do pai, um dos momentos que mais marcaram a sua infância, como o próprio viria a revelar mais tarde. Foi a mãe de Semedo quem, a partir desse momento, ficou 100% responsável por criar o filho, desdobrando-se dia e noite para o sustentar. Na sua ausência, Rúben ia crescendo entre as habituais futeboladas e brincadeiras de rua.
“Portou-se sempre muito bem” Antes de chegar aos leões, aos 15 anos, Semedo jogou no Clube Futebol Benfica. No Fofó, como é conhecida a associação desportiva de Lisboa, “custa a acreditar que tenha sido exatamente como tem vindo a ser noticiado”. Quem o diz é Domingos Estanislau, presidente do Futebol Benfica há mais de 30 anos. O líder do Fofó, que mantém ainda hoje ligação com o atual jogador do Villarreal, lembra ao i que o “Rúben sempre se portou bem”. “Nunca fez nenhum disparate”, assegura. Estanislau recorda o jovem como um “rapaz normal, bom miúdo, humilde e que frequentava a escola”. Mais recentemente, “o Rúben vinha aqui e a malta cumprimentava-o, pedia autógrafos, e ele estava sempre disposto, sempre com um sorriso nos lábios”, conta. “Surpreende-me, evidentemente, tudo aquilo que está a acontecer”, reafirma o presidente, que tentou entrar em contacto com o defesa central assim que soube da notícia, mas sem sucesso. Também Armando Magarinhos, treinador de Rúben Semedo no Fofó, se mostrou perplexo com o que tem vindo a público desde terça-feira. “Sempre se revelou um bom miúdo, embora vivesse num bairro social onde, por vezes, não é tão fácil fugir de certos caminhos”, refere ao i. “Ele sempre se mostrou bastante equilibrado. Antes de o Rúben ter ido para Espanha estive bastantes vezes com ele e fiquei com a noção de que estaria equilibrado, e nada fazia prever este desfecho. Fico bastante surpreendido porque, e volto a repetir, não corresponde em nada àquilo que sempre conheci do Rúben”, sublinha o homem que orientou Semedo durante dois anos, entre os 13 e os 15 anos do futebolista.
Do Fofó para os leões e o primeiro problema Semedo aterrou na formação leonina em 2010, com apenas 15 anos. Foi no emblema de Alvalade que se registou o primeiro problema extrafutebol do defesa. Contudo, o episódio que remonta a 2013, quando tinha 19 anos, não tem sequer comparação com a gravidade dos factos de que agora está a ser acusado. À data, Semedo foi apanhado a conduzir sem carta de condução e Leonardo Jardim, treinador do conjunto verde-e-branco, obrigou o atleta a voltar para a equipa B como forma de castigo. “Foi aposta minha e da própria estrutura, por isso tem de ser exemplo para os outros jovens. Nas próximas semanas vai trabalhar na equipa B”, explicou, na altura, o atual treinador do Mónaco. Na B, Semedo encontrou Luís Dias como orientador. Numa entrevista concedida ao “Mais Futebol” em 2013, o então responsável da formação leonina falou do jogador e da falta de “equilíbrio” em momentos necessários. “Ele desmotiva-se e destrói-se. Nem sempre apresenta o equilíbrio que é necessário. Tem de perceber que só jogou [na equipa principal] porque os prováveis titulares não puderam fazê-lo e tem de estar preparado para passar muito tempo no banco”, comentou. Porém, o nascimento da filha, nesse período, traria um novo Rúben: mais empenhado, assíduo e focado, mas Dias manteve o alerta: “Tudo pode perder-se se ele não se mantiver dedicado.” Dias parece, no entanto, o único a ter esta visão do jogador português. O presidente leonino, Bruno de Carvalho, foi outra das figuras a mostrarem-se atónitas com a atual situação do ex-jogador do Sporting. “É uma surpresa o que se está a passar com o Semedo. Inclusivamente, nos dois empréstimos que houve [Reus e Vitória de Setúbal], as informações foram sempre boas, nunca ninguém se queixou dele”, disse ao espanhol “Marca”. “Tenho boas recordações dele. O Rúben Semedo sempre foi um rapaz trabalhador, que deu no duro para chegar à primeira equipa do Sporting”, garantiu ainda o líder do emblema de Alvalade àquela publicação. Por sua vez, o técnico Jorge Jesus considerou recentemente Semedo como “o futuro defesa da seleção nacional”.
Desde julho de 2017 no Villarreal No mercado de verão passado, o Villarreal ganhou a corrida por Rúben Semedo, depois de pagar 14 milhões de euros pelo defesa de 1,89 metros. Desde que aterrou em solo vizinho que a vida do português tem sido uma montanha-russa. As lesões que tem sofrido (e de que ainda se encontra a recuperar) têm afastado o português dos relvados, tendo somado apenas cinco jogos com a camisola do emblema espanhol. A outra metade da história já se sabe: na terça-feira, o português foi detido pelos crimes de agressão, sequestro e roubo, naquela que é a sua terceira detenção num período de quatro meses. Ontem, o futebolista preferiu ficar em silêncio durante o primeiro inquérito não judicial, levado a cabo por agentes da Guardia Civil espanhola. Hoje, Semedo será ouvido pelo juiz.