Marítimo. Irredutíveis no apoio ao profissional que “nunca facilita”

Ao impedir Fábio Pacheco de treinar junto dos colegas, acusando-o de ter facilitado no jogo contra o Benfica, o presidente do clube madeirense comprou uma guerra com a equipa: plantel e técnicos estão ao lado do médio

É um momento complicado aquele que vive o Marítimo por estes dias. A goleada sofrida no Estádio da Luz na última jornada (5-0) marcou mais um capítulo na péssima série de resultados nos últimos três meses – apenas uma vitória nas últimas 11 jornadas –, mas acabaria por causar mais mossa do que qualquer outro desfecho menos conseguido. E tudo devido às declarações após o fim do encontro e posterior tomada de posição do presidente Carlos Pereira.

Horas depois do apito final, o longevo líder do clube madeirense acusou alguns atletas de terem facilitado no jogo com os encarnados. “Era um jogo em que 90 por cento da responsabilidade e favoritismo estavam do lado do Benfica. Contudo, nos 10 por cento que nos cabiam, tínhamos de dar tudo, e não existirem alguns a dar tudo e outros a não darem praticamente nada! Aliás, esses não deram 90 por cento de favoritismo ao Benfica, deram 100 por cento! Fiquei muito desiludido com a postura de alguns elementos. Os 90 por cento que lutaram foram traídos pelos 10 por cento que não lutaram! Só me custa perceber porque é que a equipa técnica não vê e o presidente viu… Deixo isto para uma análise muito profunda e muito criteriosa que o Daniel Ramos tem de fazer ao filme daquele jogo”, disparou Carlos Pereira, conhecido pelo temperamento difícil e volátil.

A atitude mais relevante, todavia, acabou por ser tomada já durante a semana. Na terça-feira, o médio Fábio Pacheco foi impedido de treinar com o resto do plantel, por ordens expressas do presidente. Um cenário que deveria manter-se até à realização de uma reunião entre Carlos Pereira – que estava fora da Madeira –, Fábio Pacheco e a equipa técnica, liderada por Daniel Ramos.

Contra o presidente, todavia, está o facto de todo o plantel se ter colocado ao lado do médio e do treinador, refutando terminantemente qualquer postura de falta de profissionalismo que tenha sido levantada pelo dirigente. Bem como a forma como Carlos Pereira resolveu fazer as insinuações: em público e através da comunicação social, em vez de optar por uma conversa privada com a equipa.

A explicação pode ser clínica A tal reunião aconteceu ontem e uma certeza saiu dali: Fábio Pacheco será esta sexta-feira alvo de uma análise pelo… departamento clínico do Marítimo, no sentido de perceber se haverá alguma explicação médica para a alegada quebra de rendimento na segunda parte do encontro com o Benfica. A reintegração do médio nos trabalhos irá depender dos resultados do relatório, como explicou Carlos Pereira.

“Tentámos clarificar alguma quebra de rendimento que tem havido. O Fábio Pacheco, enquanto pessoa, é excelente mas, enquanto atleta, acho que houve uma quebra de rendimento. Já falei com o departamento clínico para fazer uma avaliação daquilo que é uma quebra de rendimento ao longo do jogo e que pretendemos ver clarificada. Amanhã vai ao departamento clínico para fazer essa avaliação; depois, em função do relatório do departamento clínico, tomaremos a decisão mais adequada. O que faremos, em primeiro lugar, é pela prevenção da saúde do atleta que, na nossa opinião, teve uma quebra de rendimento na segunda parte. Para que não volte a acontecer”, frisou o dirigente.

Por todos, paga só um Fábio Pacheco, médio de 29 anos, natural de Paredes e formado no Paços de Ferreira, chegou esta temporada ao clube insular, proveniente do Vitória de Setúbal. Cumpriu, até à data, 22 jogos (e um golo, na derrota por 3-1 no Dragão) com a camisola do Marítimo, com quem tem contrato até 2020.

Na primeira de duas épocas ao serviço dos sadinos, Fábio Pacheco fez dupla no meio-campo com Dani, experiente jogador (então com 33 anos) que conquistou dois campeonatos, três Taças e duas Supertaças da Roménia ao serviço do Cluj, onde jogou na Liga dos Campeões. Ao nosso jornal, o médio, hoje a atuar no Vizela (Campeonato de Portugal), garante acreditar a 100 por cento na inocência do antigo colega. “Não acredito que seja possível ter acontecido nada do que o presidente do Marítimo disse. Conhecendo o Fábio, diria que é praticamente impossível ele facilitar seja com quem for. Foi infeliz na abordagem ao lance de que tanto falam [segundo golo do Benfica, apontado por Grimaldo], nada mais que isso”, realça Dani, endereçando críticas ao comportamento de Carlos Pereira: “Quando se perde, arranja-se sempre desculpas, e penso que é isso que se está a passar neste caso.”

Ainda mais contundente foi António Araújo, agente de Fábio Pacheco. “O Fábio nunca pôs em causa o seu nível de profissionalismo nem o grande homem que é. Isso de colocar em causa a sua continuidade não pode acontecer porque o jogador nada fez para merecer tal constrangimento. Perderam 5-0 com o Benfica. Mas já não tinham perdido 5-1 com o Sporting? Se tiveram uma tarde menos feliz, culpa-se só um? Tem de se culpar e julgar todos. Se o jogador teve um lance menos bom, os outros não tiveram? Se é para suspender, que se suspenda toda a gente”, disparou o empresário em declarações à Rádio Renascença, adiantando ainda que o caso já está entregue ao advogado do jogador.

“O que espero é que o presidente do Marítimo tenha a dignidade de se retratar disto e que reintegre o jogador o mais rapidamente possível. Mas já ninguém lhe tira a tristeza, a frustração e tudo o que já levou no dia de ontem e continua a levar no dia de hoje”, indicou António Araújo.

Também o Sindicato dos Jogadores (SJPF) manifestou a sua solidariedade para com o atleta, considerando que o impedimento do jogador treinar com os companheiros constitui uma “violação inaceitável do direito ao trabalho”. Carlos Pereira, no entanto, não se mostrou minimamente preocupado com a posição do organismo liderado por Joaquim Evangelista. “Não conheço o sindicato. O sindicato não acompanha os treinos, não acompanha os jogos, a credibilidade dessas pessoas é muito duvidosa, não tenho nada a comentar”, sentenciou.