uando o Papa Francisco assumiu funções, fez duas perguntas ao gestor das redes sociais do Vaticano: «O que é o Twitter?» e «Quantas pessoas seguem a página?». Gustavo Entrala – especialista espanhol em comunicação digital que esteve na última sexta-feira num encontro em Lisboa com vários jornalistas, organizado pelo Opus Dei – explicou-lhe o que era a rede social e disse-lhe que a conta tinha três milhões e meio de seguidores. Do outro lado, a resposta foi positiva: o novo Papa queria continuar a marcar presença no Twitter.
Hoje, Entrala já não faz parte da equipa que criou e que gere a conta oficial do Vaticano – denominada Pontifex para que pudesse vir a ser utilizada por qualquer Papa –, ainda em 2012, durante o pontificado de Bento XVI. Mas continua a ser conhecido como o homem que pôs o Papa no Twitter, num contexto curioso: enviou uma carta à Santa Sé a explicar que tinha uma agência de comunicação digital e a oferecer os seus serviços, depois de um desabafo de Bento XVI sobre como a presença na Internet podia ter evitado alguns problemas no interior do Vaticano. A resposta demorou quatro meses a chegar e manifestou-se sob a forma de um telefonema de Federico Lombardi, porta-voz do Papa, em 2009, pedindo-lhe que fosse a Itália. E aí esteve, com a sua equipa, por uma semana, a desenvolver «um trabalho intenso» – com direito ao primeiro brainstorming entre os responsáveis do Vaticano, brincou Entrala. O primeiro tweet de Bento XVI viria a ser publicado em dezembro de 2012. Hoje, as redes sociais são encaradas pela Santa Sé como o sexto continente, que também é necessário evangelizar.
Quem faz o Twitter da Santa Sé? Não, não é o Papa. É uma equipa de duas pessoas, «com acesso a tudo o que o Papa vai dizer nos próximos dois meses». Mas nada avança sem a aprovação do Papa, que «está a favor de tudo e é muito colaborativo», disse Entrala. Hoje, a conta tem 47 milhões de seguidores, distribuídos entre nove contas de línguas diferentes. «800 mil pessoas seguem o Papa em latim!», contou o especialista com um sorriso de surpresa.
Já com o Papa Francisco, o Vaticano rendeu-se ao Instagram. É lá que estão os jovens, e o Papa não quis passar ao lado do potencial que a sua presença nessa rede pode ter. Nos dias de hoje a conta totaliza cinco milhões de seguidores. Quanto a uma presença no Facebook, Entrala explicou que não faz parte da estratégia de comunicação do Vaticano. Porquê? «Porque o Facebook tem mais tipos de interação e exige uma equipa maior». Além disso, «é mais relevante o que se diz no Twitter do que no Facebook», defendeu o especialista. É é nessa rede social, aliás, que estão mais jornalistas e políticos.
Uma visão sobre o digital
No encontro, Gustavo Entrala teceu ainda algumas considerações sobre o digital. Assinalou como, numa primeira fase, imperava «um deslumbramento pela tecnologia», defendendo que isso ajudou «à criação de um monstro». Até porque as redes sociais «geram no ser humano uma reação muito parecida àquela que o álcool, as drogas e o sexo desencadeiam» – «um prazer rápido».
Entrala recordou, também, como tanto Bento XVI como o Papa Francisco têm sido alvo de mensagens a insultá-los, a par da quantidade significativa de contas falsas criadas em nome deles.
As redes sociais, continuou, «não são plataformas neutras» e manipulação política e fake news são uma constante. É por isso que, na visão do perito, faz falta a existência de uma regulação. «O algoritmo das redes sociais não distingue uma fotografia de pornografia de uma obra de arte. Os olhos humanos têm critério, o algoritmo não», argumentou. É por isso que várias plataformas estão a contratar pessoas para analisar os conteúdos partilhados. «A tecnologia assusta e dá medo, mas vamos aprendendo e vamo-nos adaptando».