Se o congresso do CDS não tivesse acontecido, nada seria hoje diferente. Da moção de Assunção Cristas às ideias de Adolfo Mesquita Nunes, da direção do partido à ambição eleitoral marcada pelo distanciamento do PSD, nada em Lamego foi diferente de Gondomar. Teve menos 6% de votação e mudou-se de coordenador autárquico. Não se trata exatamente de uma revolução partidária.
Aquilo que alguns esperavam – ou mesmo ansiavam – não sucedeu. As tensões internas geradas por discordância não se concretizaram. As tendências alternativas não colocaram moções a votos e as votações ao Conselho Nacional dispersaram-se entre Filipe Lobo d’Ávila, que anunciou renúncia parlamentar, e Abel Matos Santos, da tendência democrata-cristã dentro do partido democrata-cristão.
Claro que entre o último congresso e este surgiram dúvidas que motivaram suspense. Primeiro, o receio de derrotas eleitorais, que o resultado para a Câmara de Lisboa suspendeu. Em segundo, a falta de ideologia na visão política de Assunção – um tabu interno a que Adriano Moreira veio pôr termo neste congresso.
A partir do momento em que o fundador desmentiu que a matriz ideológica do partido tivesse atualmente sofrido «qualquer alteração» e que a democracia-cristã «tem de ser adaptada às exigências novas que aparecem», o congresso acabou. Assunção tinha aprovação para o refrescar pretendido.
A oposição interna que pretendia – e tem vindo a – atacá-la por alguma distância dos argumentos mais ideológicos ou mesmo por esquecimento das raízes do CDS deixou de ter argumentos. Afinal, não se poderia acusar Cristas de ignorar o berço da instituição quando o homem que fundou a instituição lhe concedera a sua bênção horas antes. Um autêntico certificado de democrato-cristianismo, por assim dizer.
Ou, de outro ponto de vista, um gesto institucional que transformou um congresso político numa cimeira de paz. Com o antecessor, Paulo Portas, a seu lado nas autárquicas; Nuno Melo, seu vice-presidente, a seu lado no partido; e Adriano Moreira, a seu lado no congresso, Assunção Cristas foi, como aliás o próprio Melo previra, «consagrada».
O que quer Assunção?
Mas, resumidamente, o que quer Assunção? Um partido de todas as direitas para todos os portugueses. Não é bem dito assim, mas é o objetivo assumido. Depois de o presidente do seu gabinete de estudos, Diogo Feio, ter proposto a procura de votos «à direita, à esquerda e ao centro», Cristas também propôs um programa abrangente (do Interior aos serviços públicos, do envelhecimento ativo à Cultura) de forma a concretizar a ambicionada expansão eleitoral.
Perante o fim do voto útil que a ‘geringonça’ trouxe, Assunção quer responder com uma maioria parlamentar que não esteja obrigada ao primeiro lugar. Para aí chegar, concentrou-se nas «propostas» por pastas atrás mencionadas e falou num CDS «casa das direitas» – uma ideia já antes desenvolvida por Mesquita Nunes e Francisco Mendes da Silva, dois ideólogos que protagonizarão a elaboração do programa eleitoral para as próximas legislativas.
Mas a dita «ambição de chegar a todos» não ficou por aí. Dentro da maioria parlamentar de direita, quer que o CDS seja o maior partido, ou seja, maior que o PSD. O novo slogan – «a primeira escolha» – foi proferido literalmente na cara de Rui Rio, que ficou visivelmente incomodado com a declaração de intenções (ou de guerra…) da líder centrista.
Não só lhe disse (e ao congresso) que o CDS correspondia «à verdadeira oposição ao PS», o partido de Governo, como deu a entender que o cargo de primeiro-ministro também pode ser seu. Pedro Nuno Santos, que representou o Executivo liderado por António Costa, nem pestanejou.
À saída, o super-secretário de Estado dos socialistas, maestro da ‘geringonça’, elevou as diferenças entre o projeto do PS para o país e o do CDS, mas deixou também claro que o «Governo fala com todos os partidos e com todas as bancadas parlamentares». Uma boa tirada rumo às intenções de Rui Rio em relação a entendimentos com o Partido Socialista.
Rio, que admitiu em Lamego que o CDS «é um adversário», viu Pedro Nuno Santos, um peso pesado de São Bento, representar Costa na reunião magna dos centristas quando no seu congresso, há bem pouco tempo, o representante do governo foi o menos conhecido Marcos Perestrello.