Hell’s Angels e Bandidos, um combate que já vem de longe

Tanto Mário Machado, ex-líder da Frente Nacional, como os grupos de motards envolvidos nos confrontos de sábado já têm uma vasta história de violência e criminalidade

No dia em que se deu o confronto no restaurante do Prior Velho, em Loures, arredores de Lisboa, Mário Machado vestia um casaco com o emblema dos Red & Gold, um grupo de motards com ligações aos conhecidos Bandidos.
A rivalidade entre os Bandidos e os Hell’s Angels já vem de há muito e o nome de Manuel Machado também já tinha sido associado a este conflito. Em 2009 houve suspeitas de que o ex-líder dos Hammerskin, um grupo neonazi internacional com uma célula em Portugal, tivesse tentado matar um motard dos Hell’s Angels, em Faro, com um tiro que lhe acertou na perna. A vítima nunca apresentou queixa, mas como foi considerado crime público, a investigação foi feita na mesma. Machado acabou por ser ilibado da tentativa de homicídio, tendo a acusação sido transformada em ofensa à integridade física.

Além disso, Mário Machado já fora condenado a quatro anos e três meses de prisão em 1997, pelo envolvimento no homicídio do jovem cabo-verdiano de 27 anos Alcino Monteiro, no Bairro Alto, em Lisboa.

O líder da Frente Nacional, uma fação neonazi que se separou do Partido Nacional Renovador em 2004, cumpriu ainda dez anos de prisão por discriminação racial, coação agravada, posse ilegal de armas e ofensa à integridade física qualificada, tendo saído em liberdade em maio de 2017. Apesar de poder ter saído em liberdade condicional mais cedo, Machado foi condenado a mais dois anos e nove meses por tentativa de extorsão depois de ter enviado uma carta a Rute Pereira, companheira de um antigo colega do skinhead no movimento Portugal Hammerskins, onde exigia 30 mil euros sob ameaça de morte diante dos filhos.

Cinco meses depois de ter sido libertado, Mário Machado foi detido na Suécia, onde ia participar num evento ultranacionalista chamado Movimento de Resistência Nórdica, e deportado para Portugal após 30 horas de detenção, ficando proibido de visitar o país. 
 
Quem são os Hell’s Angels e os Bandidos

Ambos os grupos têm origem norte-americana, mas atualmente estão presentes em vários continentes. Os Hell’s Angels (que traduzido para português quer dizer Anjos do Inferno) apareceram na Califórnia em 1948, enquanto os Bandidos foram criados no Texas em 1966. Ambos são relacionados com atividades criminosas como posse e tráfico de droga, posse de armas, roubo de mercadorias, extorsão e até mesmo rapto e tráfico humano.

Segundo os respetivos sites oficiais, apenas os Hell’s Angels têm elementos em Portugal. Ao nosso país juntam-se outros 55, num total de 463 membros. Já os Bandidos, que fazem parte dos amigos dos Red & Gold Family, um grupo de motards sueco, afirmam estar presentes em 31 países, incluindo Espanha.

Os Hell’s Angels são identificados pela imagem da “cabeça da morte”, um emblema que é constituído por uma caveira de perfil, virada para a esquerda, com um capacete vermelho do qual saem umas asas douradas. Por outro lado, os Bandidos optaram pelo símbolo de um mexicano carrancudo que ostenta um sombrero e tem uma arma na mão direita e uma catana na esquerda.

Além dos logótipos, os blusões identificativos incluem, por cima, o nome do grupo a que os elementos pertencem e, por baixo, a localidade ou país de origem. Os blusões dos Bandidos incluem ainda um emblema com “1%”, uma referência às declarações da Associação Americana de Motociclistas quando, depois do motim de Hollister, que aconteceu na Califórnia em 1947, afirmou que 99% dos motociclistas eram cidadãos bons e decentes. Desta forma, 1% seriam os criminosos.

História do conflito

Entre 1994 e 2002, os dois grupos tiveram dois grandes confrontos: a grande guerra nórdica de motas, até 1997, que envolveu a Dinamarca, a Noruega, a Suécia e a Finlândia; e a guerra de motas do Quebeque, no Canadá, que durou oito anos.

A grande guerra nórdica resultou de um conjunto de conflitos entre os Hell’s Angels e os Morticians, que depois mudaram o nome para Undertakers, e os Morbids. Ambos os grupos de motards juntaram-se aos Bandidos contra os Hell’s Angels, recebendo depois apoio por parte dos Klan e dos Outlaws. Do outro lado da barricada estavam, com os Hell’s Angels, os Avengers, os Screwdrivers e os Untouchables.

Ao longo de cerca de dois anos morreram 11 pessoas, entre as quais uma mulher, e 96 ficaram feridas. Foram ainda registadas 74 tentativas de homicídio. Três elementos de cada um dos grupos foram julgados e acusados, tendo recebido condenações entre os quatro anos de prisão e perpétua.

Depois da grande guerra nórdica houve ainda confrontos em 2001, na Dinamarca, que resultaram na morte de dois motards.

A guerra do Quebeque começou por ser entre os Hell’s Angels e os Rock Machine, mas os Bandidos acabaram por apoiar os segundos contra o adversário comum. A base do conflito foi o tráfico de droga, em especial depois da prisão do fundador dos Rock Machine, que tinha em sua posse 11 toneladas de cocaína.

Estima-se que tenham morrido 162 pessoas relacionadas com este conflito, entre elas um rapaz de 11 anos, vítima de um todo-o-terreno armadilhado por um dos grupos de motards, em agosto de 1995.