O mundo acordou hoje com a notícia de que os EUA, o Reino Unido e França tinham decidido avançar para um bombardeamento contra depósitos de armas químicas na Síria. Durante uma hora e dez minutos mísseis e aviões anti-radar levaram a cabo um ataque que se começou a desenhar há muito tempo.
É preciso recuar sete anos para perceber este conflito, que já fez mais de 465 mil mortos, mais de um milhão de feridos e obrigou mais de cinco milhões de sírios a abandonar o seu país e outros seis milhões a deixar as suas casas. Um conflito que dizimou cidades e uma parte significativa do património cultural da Síria.
Desde que o presidente sírio, Bashar al-Assad, chegou ao poder em 2000, depois da morte do seu pai, a insatisfação dos sírios foi crescendo. E em 2011, embalados pela chamada Primavera Árabe, decidiram sair às ruas da cidade de Deraa. Pediam melhores condições de vida e igualdade – uma democracia. Em resposta a essas manifestações, o governo de Assad decidiu empregar a força e calar os que não estivessem consigo.
Violência gera violência, e do lado dos sírios que estavam nas ruas aumentou a revolta, dando lugar à criação do Exército Síria Livre, que o presidente tentou controlar com mais e mais repressão. Em 2012, a muitos anos e a muitas mais mortes de distância dos recentes acontecimentos, o país estava à beira de uma guerra civil. De um lado os que queriam a mudança armados, do outro as forças comandadas por Assad, que muito cedo classificou os que lutavam pelo fim do regime como terroristas suportados por estrangeiros.
Forças e interesses internacionais
Mas afinal que estrangeiros eram esses? Ou, pelo menos, que estrangeiros foram esses que ao longo do tempo decidiram interferir?
O antigo presidente dos EUA, Barack Obama, decidiu que era preciso intervir na Síria, porque além da guerra civil, a partir de 2013 o Estado Islâmico foi-se estabalecendo no território sírio. Mas nem a “linha vermelha”, como chamou Obama ao uso de armas químicas (sarin e gás de cloro) por Assad, fez os EUA avançar para uma intervenção militar, dado que, da outra fação, em jeito de retaliação, multiplicavam-se os ataques fatais. Um deles, num subúrbio de Damasco, matou mais de mil pessoas.
Na altura, não houve intervenção militar, mas o Conselho de Segurança da ONU exigiu que o presidente Sírio se comprometesse a eliminar todas as armas químicas de que dispunha. Em vão, como têm mostrado, nos últimos anos, várias fotografias chocantes de crianças e adultos atingidos alegadamente pelo efeito destas armas.
Do lado de Assad, posicionaram-se desde o início estados como a Rússia e o Irão. Quatro anos depois das primeiras manifestações de descontentamento dos sírios, os russos tiveram mesmo um papel central para o regime, ao intervirem com meios aéros contra os rebeldes. Do lado iraniano, o suporte tem-se centrado no envio de militares e no apoio financeiro.
Mas se por um lado Assad tem o suporte desses dois países, os rebeldes moderados contam com o apoio dos Estados Unidos, França, Reino Unido e outros países ocidentais. Isto além da Arábia Saudita e da Turquia.
As ameaças de Trump
A questão é ainda mais complexa, porque além dos interesses dos envolvidos, incluindo dos países que estão a apoiar cada um dos lados, a Síria está dividida entre grupos religiosos – os muçulmanos sunitas contra os xiitas, de que faz parte o presidente Bashar al-Assad.
Por entre estas guerras religiosas internas foram nascendo e fortificando-se outros grupos, como o ISIS.
No contexto atual, em que as forças de Bashar al-Assad dominam as principais cidades, mas existem ainda diversas regiões dominadas pelos rebeldes, o Ocidente (EUA, França e Reino Unido) decidiu esta madrugada bombardear Damasco, por fortes suspeitas de que estariam a ser usadas armas químicas por Bashar al-Assad.
O presidente norte-americano Donald Trump há muito que já tinha mostrado a sua indignação com imagens de crianças e adultos inocentes a morrer às mãos do regime. Esta semana, perante nova acusação contra o presidente sírio pelo alegado uso de armas químicas na zona de Douma, controlada pelos rebeldes, o presidente dos EUA ameaçou com "bons, novos e inteligentes mísseis". A ameaça foi feita através da sua conta oficial de Twitter, onde, mais tarde, também fez saber que não iria revelar quando esse ataque ocorreria: poderia estar ou não para breve.
Não foi preciso esperar muito para saber. A única certeza, para já, é que nada disto ficará por aqui. A Rússia já avisou que haverá consequências.