São quase 4 horas da madrugada de sábado, 14 de abril, e a guerra na Síria entrou agora numa nova fase. Uma coligação formada pelos Estados Unidos, Reino Unido e França acaba de lançar uma vaga de ataques contra objetivos militares daquele país, ligados à conceção, armazenamento e utilização de armamento químico por parte do regime sírio.
Estes bombardeamentos ocorrem na sequência de um ataque com armas químicas efetuado na semana passada, a 6 de abril, numa área totalmente cercada pelos militares sírios, e em consequência do qual cerca de 80 pessoas, incluindo crianças, terão encontrado uma morte horrível, por asfixia. Foi, como descreveu a primeira-ministra britânica, Theresa May, um cenário de “puro horror”. Foi, a meu ver, uma verdadeira manifestação do Mal.
Recorde-se que o regime sírio já se tinha comprometido, há alguns anos, a abandonar todo o seu arsenal de armas químicas. Se o fez na altura, não deixou de as fabricar.
Tem também importância o facto de os ataques do ocidente terem sido lançados a um dia e a uma hora em que todos os mercados financeiros do mundo estão fechados. Para segunda-feira prevejo descidas acentuadas dos mercados acionistas, quedas nas taxas de juro (pois os investidores irão procurar a segurança que os títulos de dívida fornecem, e com essa procura acrescida as taxas de juro descerão), e, finalmente, a continuação da subida do preço do petróleo. Por isso, talvez seja boa altura para atestar o depósito de combustível do seu automóvel, antes que os preços dos combustíveis subam ainda mais. Não hesite, seja rápido.
Até porque a situação na Síria tem todo o potencial para se complicar ainda mais. Falta conhecer as reações práticas dos principais aliados da Síria, que são a Rússia (com uma importante base naval em território sírio, que lhe permite projetar poder no Mediterrâneo), e o Irão (país que segue a vertente xiita do Islão, tal como a elite dirigente síria, e que precisa de aliados para afirmar o seu poder no Médio Oriente, e também para contrabalançar a enorme influência da Arábia Saudita, que é o seu maior rival estratégico).
Moscovo já fez saber, pelo seu embaixador em Washington, que apesar de nenhum alvo russo ter sido atingido, estes ataques do ocidente “não ficarão sem consequências”. Por isso, aguardemos. A guerra civil na Síria já dura há sete anos, mas nunca esteve tão internacionalizada como hoje. Como assinalou António Guterres, este é o regresso da guerra fria
Um último ponto. Os ataques do ocidente foram desencadeados por uma operação militar síria que resultou numa morte atroz para dezenas de pessoas. Por isso, a meu ver, não é apenas a definição de áreas de interesse e de influência no jogo geopolítico que está aqui em jogo. É a mensagem que existem crimes de guerra, e que mesmo em guerra não vale tudo (aliás, os crimes de guerra não prescrevem: por isso é que ex-oficiais do regime nazi ainda são perseguidos pela justiça em diversos países, apesar das suas avançadas idades, e depois condenados).
Na minha opinião, na Síria – já descrita por António Guterres como “o Inferno na terra” – os nossos aliados, os Estados Unidos, o Reino Unido e a França travam verdadeiramente uma luta contra o Mal. Está bem, podem acusar-me de maniqueísmo. Mas o Mal existe mesmo, muitas vezes sob uma aparência banal, outras vezes mais descarada, como foi o caso no dia 6 de abril, e é um imperativo moral combate-lo.
Por tudo isto, estou curioso para obter as reações dos portugueses quando acordarem e souberem da notícia. Em especial, quero conhecer as reações dos partidos políticos com assento parlamentar.