Em meados de março, a Comissão Europeia enviou ao Governo uma carta na qual pedia que Portugal apresentasse um programa de estabilidade e de reformas com medidas que apostem na correção dos desequilíbrios macroeconómicos nacionais.
A carta envida ao ministro das Finanças, assinada pelo vice-presidente da Comissão Europeia (CE) com a pasta do Euro, Valdis Dombrovskis, e pelo comissário dos Assuntos Económicos, Pierre Moscovici, encorajava o Governo a «continuar no caminho das reformas», uma vez que são necessários «mais esforços» para corrigir, de forma sustentada, os desequilíbrios.
Os dois responsáveis exigem ao Executivo português que submeta um Programa Nacional de Reformas (PNR) e um Programa de Estabilidade (PE) «ambiciosos e detalhados», tendo em vista a «correção sustentável» dos desequilíbrios que ainda existem, apesar de os riscos estarem a diminuir «num contexto macroeconómico e financeiro favorável».
Ontem, o Governo entregou no Parlamento o PE com as previsões orçamentais e medidas para o período de 2018 a 2022 mais o PNR respetivo. A seguir ao Orçamento do Estado, o PE é o documento mais importante no âmbito das avaliações regulares a que o Governo é submetido por parte dos seus parceiros europeus.
Este permitirá atualizar as projeções plurianuais do Ministério da Finanças até 2022 em indicadores como o crescimento da economia, a inflação, a taxa de desemprego, o défice público, a dívida e o ajustamento estrutural das contas públicas.
No Orçamento do Estado para 2018, o Governo tinha avançado com uma meta para o défice de 1,1% – objetivo começou por ser de 1%, mas foi agravado em uma décima depois de incluídas medidas para responder aos incêndios do verão e do outono – mas agora, no PE, essa meta foi revista para 0,7%, já depois de o resultado final do défice no ano passado ter sido de 0,9% (sem contabilizar a recapitalização da CGD).
«A revisão em baixa da projeção para o défice em 2018 (por 0,4 pontos base para 0,7 % do PIB este ano) sublinha o esforço político para atingir as metas fiscais de Bruxelas», aponta ao SOL a equipa de research do BiG. No entanto, acrescenta, «enquanto o crescimento forte através de efeito base assim como custos de financiamento baixos ainda permitiram a Portugal reduzir o défice para 0,9% do PIB em 2017, Portugal será obrigado este ano a implementar alterações estruturais no lado da despesa» para reduzir o défice.
No PE, o maior ajustamento é esperado para 2019, altura em que o Governo conta reduzir o défice de 0,7% para 0,2%. As contas de Mário Centeno apontam ainda para um saldo positivo de 0,7% em 2020, 1,4% em 2021 e 1,3% em 2022.
Maior crescimento
O documento do Executivo aponta também para um maior crescimento económico. Para 2018 e 2019, a taxa de crescimento prevista é de 2,3%. Há um ano, o Governo apontava para 1,9% e 2%, respetivamente. As previsões mais recentes do Banco de Portugal já admitem uma subida do PIB para este ano de 2,3% depois de o Executivo ter assumido 2,2% para o crescimento do PIB este ano. «Em 2018, o país continuará a beneficiar de uma política expansionista do BCE. Este é o fator único, que tem garantido um crescimento forte», refere ao SOL Eduardo Silva, gestor da corretora XTB, acrescentando que «o Governo tem beneficiado de um crescimento económico a reboque das exportações» quando «curiosamente, Centeno apostava na procura interna como catalisador do crescimento».
Do lado da receita, o Governo perspetiva uma diminuição em percentagem do PIB na ordem dos 0,5 pontos percentuais (redução do peso da receita fiscal e das vendas de 0,4 pontos percentuais e 0,1 pontos percentuais, respetivamente).
No que diz respeito à dívida pública, com menos défice e mais crescimento, o Governo, no PE, considera que esta reduza. No documento, o Executivo inscreveu uma meta de dívida pública de 122,2% do PIB este ano e 118,4% no próximo. Em 2021 e 2022 a meta inscrita no PE é de 107,3% e 102%, respetivamente. «As metas propostas de redução do défice e dívida deverão ser alcançáveis, maioritariamente através de apoio do crescimento do PIB sólido (efeito-base) ao longo dos próximos anos», refere a equipa de research do BiG. Na opinião destes analistas, Portugal atingiu um «processo sólido da consolidação fiscal» mas ainda «não conseguiu implementar alterações estruturais do lado da despesa». No entanto, os especialistas apontaram para a incerteza de como o empréstimo de 450 milhões ao Novo Banco «será incorporado nas contas públicas». Ontem, o ministro reconheceu que irá ter impacto no défice, mas escusou-se a a adiantar qualquer valor.
No Programa de Estabilidade, o Executivo reviu ainda em baixa a sua previsão para a taxa de desemprego dos atuais 8,6% para 7,6%. A revisão prende-se com o crescimento do emprego do setor privado, que o Governo antecipa agora que cresça 2,2%, o dobro do ritmo previsto no Orçamento do Estado para 2018, entregue no Parlamento em outubro.
No PE o Executivo reitera ainda que pretende atingir o Objetivo de Médio Prazo (OMP) – apresentar um saldo estrutural de 0,25% – em 2020. O OMP é uma meta que está definida no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento, que é medida pelo saldo orçamental estrutural, ou seja, excluindo os efeitos do ciclo económico e os impactos das medidas extraordinárias e temporárias.
Valorizar rigor orçamental
«A conjuntura aponta para forte crescimento na Europa, Portugal por efeito de contágio irá continuar a beneficiar da política monetária da Europa», refere Eduardo Silva, da XTB.
Segundo o analista, «os anos complicados surgem mais para a frente, esse é o maior desafio, a partir de 2020 penso que as dificuldades de financiamento poderão surgir, se entretanto Portugal não fizer um esforço no sentido de reduzir a dívida».
Isto porque, conclui, «quando o país for ao mercado financiar-se, terá que ter conquistado a confiança dos investidores que valorizam o rigor orçamental».