As suspeitas de crimes de corrupção ativa, corrupção passiva e participação económica que estão na base da investigação a António Mexia – e o levou a ser constituído arguido, assim como ao presidente da EDP Renováveis, João Manso Neto, ao ex-presidente da REN, Rui Cartaxo, e a um outro administrador desta empresa, João Conceição – no âmbito da investigação dos custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) poderão cair por terra com o parecer da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) sobre o projeto de decreto-lei CMEC com a data de 2004, entregue agora ao Parlamento. Ou seja, três anos depois de serem implementados os CMEC, pondo fim aos contratos que, até essa altura, estavam em vigor: os contratos de aquisição de energia (CAE).
Nesse parecer, o regulador já chamava a atenção para vários problemas (12 em concreto), nomeadamente a incerteza associada à discricionaridade de decisões futuras e a verificação da disponibilidade das centrais. O documento que já está nas mãos dos deputados lembra que «a extinção antecipada dos CAE, por motivos não imputáveis ao produtor, está sujeita à celebração do acordo de cessação. Tratando-se de um acordo, o que representa um encontro de vontades, pode suceder que nem todos os produtores acordem na extinção dos CAE».
Uma questão que foi aprovada por decreto-lei ainda em 2004, pelo Governo de Santana Lopes, que definia as condições de cessação dos contratos de aquisição de energia (CAE) e a criação de medidas compensatórias relativamente à posição de cada contrato. «A cessação de cada CAE confere a um dos seus contraentes, entidade concessionária da RNT ou produtor, o direito a receber, a partir da data da respetiva cessação antecipada, uma compensação pecuniária, designada por custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), destinada a garantir a manutenção do equilíbrio contratual entre as partes contraentes, subjacente ao respetivo CAE, e a obtenção de benefícios económicos equivalentes aos proporcionados por esse contrato que não sejam adequadamente assegurados através das receitas expectáveis em regime de mercado», diz o decreto.
A intervenção de Pinho
Também nesse ano, e novamente pelas mãos de Santana Lopes, foi aprovado um outro despacho que concedia autorização legislativa ao Governo definir as condições de medidas compensatórias para a antecipação da cessação dos CAE.
Estas condições de passagem de CAE para CMEC foram aprovadas com João Talone na liderança da EDP. Só em julho de 2007, os CMEC entraram em vigor, por despacho de Manuel Pinho, então ministro da Economia do Governo de José Sócrates. Nesta altura, António Mexia já era o presidente executivo da EDP, daí o gestor já ter vindo defender-se lembrando que coube à EDP cumprir as novas regras, uma vez que, nessa altura, o Estado ainda era o maior acionista.
«Foi uma negociação entre o Governo da altura e a Comissão Europeia, que auditou o processo e o aprovou em setembro de 2004. Na altura estabeleceu um montante máximo de compensações que nunca foi atingido até hoje. A EDP sempre cumpriu a lei», afirmou Mexia depois de ter sido constituído arguido.
O certo é que foi com base nos critérios aprovados em 2004 que a ERSE veio afirmar que o Estado tinha pago 500 milhões de euros a mais à elétrica portuguesa, desde 1 de julho de 2007 a 30 de junho de 2017. Altura em que o valor pago pelos consumidores ultrapassou os 2,5 mil milhões de euros, ou seja, uma média de 250 milhões de euros por ano. Um valor que, segundo a análise da entidade, representou custos extras. «A introdução do regime dos CMEC possibilitou a passagem para um quadro menos exigente para os detentores dos centros eletroprodutores do que o regime dos CAE, com um acréscimo acumulado que se estima em cerca de 510 milhões de euros», referiu. Um valor que, na altura, foi rejeitado pela EDP, afirmando que não encontra qualquer fundamento para a alegada sobrecompensação.
O certo é que nem todas as empresas de energia cumpriram a passagem dos contratos de aquisição de energia (CAE) para os custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) que foi imposta em 2007. A EDP, que na altura tinha como principal acionista o Estado, fez essa passagem, ao contrário dos produtores de energia concorrentes – Turbogás e Tejo Energia – que alegaram a «complexidade legislativa» para continuarem a funcionar com os CAE, uma vez que o novo sistema contemplava mais riscos, conforme apurou o SOL junto de fonte do setor.