O Centro Nacional de Procriação Medicamente Assistida decidiu aconselhar para já os centros de tratamento a passarem a questionar as famílias sobre se pretendem continuar os tratamentos sabendo que os filhos poderão pedir para conhecer a identidade dos dadores de sémen e óvulos. Já no que toca às colheitas, a pergunta deve também ser feita aos candidatos. Quanto ao futuro dos cerca de 5000 embriões criopreservados que resultaram de dádivas de gâmetas, em última instância poderão ter de ser destruídos, disse ao i Eurico Reis, juiz que integrava o conselho e que cessou hoje a sua participação após ter apresentado o pedido de demissão em protesto contra a decisão do TC, que considera reacionária.
Recorde-se que o TC declarou inconstitucionais alterações à lei que possibilitaram as chamadas barrigas de aluguer (gestação de substituição) mas também determinou o fim do anonimato na dádiva de gâmetas, ao estabelecer que as crianças nascidas de tratamento que impliquem óvulos ou sémen de dadores devem poder conhecer a identidade civil dos pais biológicos. Até aqui, a legislação assegurava a confidencialidade do processo, permitindo apenas informações de natureza genética – por exemplo para despistar doenças – e não civis.
Se os embriões são ou não para destruir, o que fazer com os gâmetas guardados ou no caso de pessoas que tenham nascido de tratamentos em que tenham estado envolvidos gâmetas importados do estrangeiro e para os quais não seja possível identificar os dadores, cabe ao parlamento decidir. De qualquer forma, geram-se situações de desigualdade, diz Eurico Reis.
Certo é, para já, que, no caso do fim do sigilo, os efeitos que decorrem para já do acórdão são retroativos, disse ao i Eurico Reis, que teme que toda a atividade nesta área que implique a doação de gâmetas fique paralisada nos próximos tempos.
Outra consequência da decisão do TC, alerta, é que com o fim do anonimato obrigatório, um casal de mulheres ou mulheres solteiras poderão fazer-se acompanhar de um dador conhecido para fazer uma inseminação artificial, dado que nada na lei o impede. Surgem assim novos enquadramentos para a atividade no setor.
Marcelo, que inicialmente vetou as alterações feitas à lei em 2016 mas acabou por promulgar uma segunda versão do diploma, agora chumbada em grande medida pelo TC, já disse que cabe ao parlamento propor novas iniciativas legislativas. ""Tem de ser respeitada essa decisão e no futuro caberá ao parlamento, se quiser, voltar a legislar sobre a matéria e ponderar em que termos é que isso será feito", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas, em Beja, durante uma visita à feira agropecuária Ovibeja, sublinhando que o Tribunal Constitucional reviu a sua jurisprudência sobre esta matéria.
Até ao momento, apenas dois casais tinham tido luz verde para avançar com a gestação de substituição. Os sete pedidos que estavam em avaliação foram declarados extintos na reunião do conselho nacional que teve lugar esta sexta-feira. Só quando e se houver nova legislação é que os casais poderão solicitar de novo este tipo de procedimento.