A auditoria interna da Autoridade Nacional de Proteção Civil à atuação das autoridades no incêndio de Pedrógão Grande pode vir a ser divulgada pelas vias oficiais. Depois de o jornal “Público” ter noticiado a existência e o teor do documento, entregue pelo governo ao Ministério Público antes de ser divulgado e que desde novembro ficou sujeito ao segredo de justiça, o Ministério da Administração Interna disse ao final do dia que, “face à especulação entretanto criada”, não vê “inconveniente na publicitação” do relatório.
A nota enviada às redações adiantava que a mesma observação foi transmitida à Procuradoria-Geral da República, “de modo a que seja avaliado o levantamento do segredo de justiça”. Se o governo reiterou ao longo do dia nada ter a esconder neste caso, o conteúdo do relatório – que arrasa a coordenação nas primeiras horas de resposta ao incêndio e revela que há informação apagada dos registos operacionais – e o facto de ter sido mantido em segredo sete meses estão a merecer duras críticas. BE, PSD e CDS exigem mesmo que o relatório da Direção Nacional de Auditoria e Fiscalização da ANPC seja entregue no parlamento.
O caso assemelha-se à pressão feita em torno da divulgação da lista de vítimas mortais dos incêndios de Pedrógão Grande.
Em julho, perante a existência de informação sobre mais vítimas mortais do que as confirmadas por fontes oficiais, o governo invocou segredo de justiça para não divulgar a identidade das vítimas, isto depois de o levantamento feito pelo Instituto de Medicina Legal ter sido submetido às autoridades. “A identificação das vítimas é matéria do processo-crime que se encontra neste momento sob direção do MP, a quem compete definir os termos e modos da sua divulgação”, disse, na altura, o Ministério da Justiça. Também o MAI, tutelado então por Constança Urbano de Sousa, negou a existência de qualquer lista secreta, remetendo antes para o segredo de justiça – tal como ontem, pelo mesmo motivo, negou ter ocultado o relatório da auditoria.
Em julho, o PSD viria a exigir a divulgação imediata dos nomes e acabaria por ser Joana Marques Vidal a desbloquear a situação. “Confirma-se, pois, a existência, até ao momento, de 64 vítimas mortais, cuja identidade se considera poder, agora, ser publicitada com segurança e sem perturbação da investigação”, informou a 25 de julho a PGR, divulgando então os nomes das pessoas que perderam a vida no fogo de 17 de junho.
O i tentou perceber junto da PGR, ainda antes da tomada de posição do MAI, se o relatório da auditoria foi submetido ao MP a pedido da investigação ou por iniciativa do governo e se seria levantado o segredo de justiça sobre o relatório – tal como na lista de vítimas mortais –, mas não obteve resposta direta a estas perguntas.
Seis arguidos Durante o dia, o DIAP de Leiria, onde corre termos a investigação, confirmou apenas que o documento, tendo sido integrado no processo, está sob segredo de justiça. E fez um ponto de situação sobre o caso: nos últimos dias de abril foram constituídos mais quatro arguidos, subindo para seis o número de arguidos no inquérito que investiga os fogos de Pedrógão. Sem revelar identidades, o MP diz apenas que todos são pessoas singulares e que em causa estão crimes
Em dezembro tinham sido constituídos os primeiros dois arguidos no inquérito: Mário Cerol, segundo comandante do CDOS de Leiria, e Augusto Arnaut, comandante dos bombeiros de Pedrógão.
A Ascendi, responsável pela limpeza das bermas da estrada, confirmou entretanto que foram constituídos arguidos dois dos seus colaboradores afetos à subconcessionária Ascendi Pinhal Interior, que também não nomeou. “A Ascendi Pinhal Interior e os seus colaboradores têm vindo a colaborar com as autoridades judiciárias, contribuindo com o que está ao seu alcance para o esclarecimento dos acontecimentos verificados, estando seguros de que cumpriram todo o quadro legal aplicável, não lhes sendo imputável qualquer responsabilidade”, disse a empresa ao i. O “Expresso” avançou entretanto que outro dos arguidos é Sérgio Gomes, comandante do Centro Distrital de Operações de Socorro de Leiria, que não esteve presente nos primeiros momentos de combate às chamas por estar a acompanhar um familiar no hospital. Falta assim conhecer a identidade de um arguido, embora o MP não confirme oficialmente nenhum dos nomes.