Ainda não há data marcada para eleger o novo coordenador da Comissão de Trabalhadores (CT) da Autoeuropa – após o pedido de demissão de Fernando Gonçalves na passada sexta-feira -, mas o i sabe que as eleições deverão ocorrer na próxima quarta ou quinta-feira. Até lá irá subir uma pessoa da lista do ex-coordenador (lista E) que ficou de fora na última composição da estrutura de representação dos trabalhadores, de forma a completar os 11 lugares disponíveis.
Só nessa altura, e já com todos os lugares ocupados, é que a CT irá eleger o novo coordenador, mas o i sabe que José Carlos Silva (que pertence à lista C e conta com alguns elementos afetos à CGTP) e Fausto Dionísio (da lista D) são os mais bem posicionados para suceder a Fernando Gonçalves.
Só quando esta questão estiver resolvida é que o novo conselho consultivo da CT poderá começar a negociar um novo acordo para o trabalho em laboração contínua – a partir de agosto, altura em que será implementada uma quarta equipa, que terá de implicar uma compensação financeira. As negociações com a administração da fábrica de Palmela deveriam ter arrancado na sexta-feira, mas a demissão do coordenador levou a um adiamento de pelo menos uma semana.
Ao i, Fernando Gonçalves garante que sai de consciência tranquila e diz que a decisão foi “a mais acertada”, justificando o abandono do cargo com um “sentimento de contestação à pessoa do presidente e à própria ação da CT, com especial enfoque no cargo do coordenador”.
O responsável afirma ainda que a estrutura “sempre trabalhou em equipa e é assim que deve continuar a trabalhar, principalmente quando surgem momentos importantes de negociação como esta da laboração contínua”.
Esta decisão surge depois do referendo realizado na quarta–feira e que resultou em 57% dos votos para o não, enquanto o sim obteve 38% dos votos. Ao todo votaram 3174 dos 5700 trabalhadores. Para a CT ser destituída era obrigatório que dois terços dos trabalhadores votassem, bastando depois uma maioria simples para determinar a saída dos atuais representantes laborais.
Contestação pode subir de tom
Apesar de Fernando Gonçalves falar em dever cumprido, nem todos os trabalhadores pensam assim. “Dei tudo o que tinha, sempre trabalhei para este projeto e dei o meu melhor para resolver os problemas”, refere, mas o i sabe que o regresso do ex-coordenador à linha de produção, assumindo as funções que tinha anteriormente, poderá provocar alguma contestação interna.
Alguns trabalhadores da fábrica de Palmela confessaram ao i que o trabalho de Fernando Gonçalves na liderança da CT representou “uma fraude” face às promessas que tinha feito aos colaboradores, e dão como exemplo o trabalho ao sábado.
Fernando Gonçalves acreditava que seria possível encontrar soluções alternativas em diálogo com a empresa, mas a administração da Autoeuropa considerou que não havia possibilidade de produzir o volume de carros necessário sem o trabalho obrigatório aos sábados, pelo que o novo horário entrou mesmo em vigor no passado mês de fevereiro. “A única explicação que nos deu foi que a definição dos horários de trabalho é uma prerrogativa legal da empresa e, como tal, o parecer da CT tem apenas caráter consultivo”, referem os trabalhadores.
Mas as críticas não ficam por aqui. O mesmo grupo de trabalhadores acusa Fernando Gonçalves de usar o veículo (modelo Sharan) que a administração atribuiu à comissão para fins pessoais – uma situação que “não caiu bem” internamente. “Fernando Gonçalves era atualmente um embaraço para a comissão de trabalhadores e a situação agravou-se quando se vendeu por uma Sharan”, revelam.
A verdade é que este braço-de–ferro entre fações dos próprios trabalhadores não é novo. Já em janeiro, um grupo de trabalhadores fez uma vigília à porta da fábrica, garantindo que não se sentia representado pela CT e, nessa altura, fez um abaixo-assinado para apresentar várias propostas alternativas às solicitadas por esta estrutura.
“Precisamos de uma CT que se guie pelos interesses dos trabalhadores, que diga a verdade e não venda derrotas como se fossem vitórias, e que quando estabelece um objetivo não volte atrás perante a chantagem da empresa”, já veio referir um grupo de trabalhadores que criou o movimento “Juntos”.
Recorde-se que os novos horários foram uma consequência direta do aumento das encomendas do novo SUV. A meta já foi anunciada: atingir até final do ano um volume de produção na ordem dos 240 mil veículos, a maioria dos quais é o modelo T-Roc.
Ao que o i apurou, neste momento já estão a ser produzidos diariamente 870 veículos, dos quais 650 correspondem ao novo SUV, o que dá uma produção de 26 a 27 T-Roc por hora. Mas a ideia é aumentar para 28 a 29 por hora, com vista a dar resposta à crescente procura.
E as contas são simples: com mais T-Roc a saírem da fábrica, as exportações devem acelerar. Em janeiro, as vendas ao exterior do setor automóvel subiram cerca de 46% em termos homólogos, equivalentes a cerca de 680 milhões de euros, devido essencialmente à fábrica de Palmela.
Aliás, o modelo que está a ser fabricado exclusivamente na Autoeuropa desde agosto vai ter um peso importante nas vendas da marca alemã: o T-Roc deverá representar 40% das vendas da marca até 2027. Trata-se de uma das apostas da Volkswagen, com a empresa a destacar a importância económica do segmento dos veículos utilitários desportivos (SUV).
Segundo Herbert Deiss, presidente da Volkswagen, está previsto um grande crescimento deste segmento nos próximos anos. “Acreditamos que os SUV vão crescer 50% nos próximos dez anos. Isto afetará todas as regiões, como a Europa, a China e os Estados Unidos”, revelou durante a apresentação mundial do modelo, em Itália.