O conselho de administração executivo da EDP prepara-se para rejeitar o preço oferecido pela China Three Gorges (CTG) no âmbito da oferta pública de aquisição (OPA) sobre a elétrica portuguesa. Os investidores chineses, que pretendem ficar com a totalidade da elétrica, oferecem 3,26 euros por cada ação da EDP, avaliando-a assim em cerca de 11 920 milhões de euros. Para a EDP Renováveis, a contrapartida ainda é menos atraente: 7,33 euros.
O conselho de administração da elétrica deverá reunir-se esta semana para definir a forma de se defender da OPA, tendo para o efeito já contratado vários bancos de investimento como assessores, entre eles o UBS, revelou a Bloomberg.
Para já, a única palavra dada por António Mexia foi dirigida aos trabalhadores, pedindo que se mantenham “focados” e prometendo que irá mantê-los a par “dos desenvolvimentos”.
“Neste momento, reitero a importância de nos mantermos focados no nosso trabalho e na execução daquilo que são os objetivos com os quais nos comprometemos, guiados pela excelência que sempre nos caracterizou”, revelou num email enviado aos trabalhadores da EDP e da EDP Renováveis.
O i já tinha avançado ontem que um dos entraves ao sucesso da OPA seria o preço, uma garantia que voltou a ser confirmada pelos analistas contactados pelo i. A opinião é unânime: o valor oferecido pela empresa chinesa é baixo e chega a ser inferior ao que foi oferecido ao Estado, em 2011, no processo de privatização, altura em que foram pagos 3,45 euros por ação.
Ainda assim, há quem admita que a proposta poderá ser revista. “Atendendo ao grau de endividamento, à lentidão do trabalho de redução da dívida ao longo dos anos, à tendência de redução da subsidiação por parte dos Estados da zona euro, ao abrandamento da geração de receitas e de lucros, aos múltiplos a que negoceiam os comparáveis da EDP, entre outros, o preço da oferta pode estar adequado. Porém, se considerarmos o controlo de uma empresa que gera um resultado anual entre os 900 milhões e os mil milhões de euros num horizonte temporal de sete a dez anos, não nos causaria estranheza se houvesse uma ‘melhoria’ nas condições da OPA”, revela ao i João Queiroz, do Banco Carregosa.
Face a este cenário de preço baixo, os analistas admitem que é natural que possam vir a surgir eventuais ofertas que tenham um caráter mais “oportunístico”, no sentido de impedir a tomada de controlo ou a detenção da totalidade do capital.
“Poderá surgir uma estrutura de investimento mais predadora que visasse obter um acordo favorável de uma parcela relevante do capital. Se um fundo detiver 5% a 10% dos direitos de voto, isso obrigaria a uma negociação direta”, refere João Queiroz.
A opinião é partilhada por Eduardo Silva, analista da XTB. “Se se considerar a oferta pública de aquisição como um valor reduzido face ao valor real da EDP e se o Estado português não se opõe à aquisição da empresa por parte de uma empresa estrangeira, existe uma excelente janela de oportunidade e uma forte hipótese de surgirem propostas de empresas concorrentes, uma vez que a EDP estará disponível para ouvir e negociar propostas com outros valores mais atrativos”, diz ao i.
Peso dos reguladores O sucesso da OPA não depende só do preço. Também os reguladores têm uma palavra a dizer e essas autorizações não se limitam apenas a Portugal, já que as entidades estrangeiras também têm de se pronunciar. O texto do anúncio preliminar indica 16 entidades diferentes.
As primeiras a serem mencionada são a Autoridade da Concorrência e a Comissão Europeia. A oferta só avança com “uma decisão da Autoridade da Concorrência ou da Comissão Europeia declarando a compatibilidade da transação com a Lei da Concorrência ou com o Regulamento das Concentrações Comunitárias”. Também o Departamento de Concorrência Federal do Canadá tem uma palavra a dizer.
“Esta OPA não terá vida fácil, uma vez que 25% do capital da REN pertence à State Grid of China, que, a par da CTG, é também uma empresa pública chinesa, pelo que, ao deter o mesmo acionista, será um grande entrave, pois deve haver uma separação entre a rede de transporte de energia (neste caso, a REN) e a comercialização e produção (EDP) da mesma”, diz Eduardo Silva.
Mas apesar desta complexidade, João Queiroz deixa um alerta: “Que, do ponto de vista da concorrência e do regulador setorial, esta operação possa servir para uma análise profunda ao mercado de produção, comercialização e distribuição de energia em Portugal, bem como a eficiência, a qualidade do serviço, os preços e a estrutura de mercado. Do ponto de vista do regulador de mercado de capitais, que faça cumprir a lei, tendo em atenção também os interesses dos pequenos acionistas.”
Steven Santos, analista do Big, lembra que por serem necessárias diversas aprovações regulamentares em geografias distintas (Europa, Portugal, Brasil e EUA), o processo gera complexidade adicional e, como tal, “ não nos permite projetar com relativa certeza o desenrolar de todo este processo regulamentar”.
Já ontem, o Presidente da República afirmou que não lhe compete pronunciar-se sobre a OPA, remetendo a questão para o mercado e para as instituições reguladoras e de supervisão. “As empresas têm a sua vida própria. Vivemos numa economia em que existe mercado, em que há instituições reguladoras ou de supervisão. E, portanto, não compete ao Presidente da República estar a pronunciar-se sobre isso”, justificou Marcelo.