Pelas primeiras horas de hoje, o navio humanitário Aquarius, escoltado por dois navios da marinha italiana, alcançou o porto de Valência, em Espanha. À sua espera encontrava-se uma enorme operação humanitária montada pelas autoridades espanholas, com cerca de mil voluntários da Cruz Vermelha, entre os quais 400 tradutores, e dezenas de polícias espanhóis. No exterior do hangar que alojará temporariamente os 629 migrantes, transportados tanto pelo Aquarius como pelos dois navios italianos, encontra-se uma faixa onde se pode ler em várias línguas: “Bem-vindos a casa”.
Numa primeira fase, os voluntários da Cruz Vermelha encarregaram-se da alimentação e cuidados de saúde dos migrantes, para, de seguida, serem identificados e repartidos pelos vários locais que se disponibilizaram para os acolher. Segundo a Cruz Vermelha, 77 homens e uma mulher tiveram de ser transferidos para o hospital assim que pisaram o solo.
Entretanto, e depois de uma acesa troca de acusações com o governo italiano, Paris aceitou acolher alguns dos migrantes. “O governo francês colaborará com o governo espanhol para lidar com a chegada dos migrantes”, anunciou o primeiro-ministro francês, Carmen Calvo, este sábado. “França aceitará os migrantes que demonstrem vontade para virem para cá”, complementou, com o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, a agradecer o gesto francês, referindo que é “precisamente este o tipo de cooperação de que a Europa precisa”.
Uma cooperação que parece não estar nos planos do ministro do Interior italiano, Matteo Salvini. Na sua página de Facebook, Salvini anunciou a recusa em receber mais dois navios humanitários com migrantes a bordo, entrando, agora, em confronto com a Holanda. Os navios, Lifeline e Seefuchs, partiram da Holanda para auxiliar os migrantes em risco no Mediterrâneo. “Mais dois navios com a bandeira da Holanda, Lifeline e Seefuchs, chegaram da costa líbia, esperando descarregar a carga humana abandonada por traficantes”, escreveu o ministro italiano na rede social. “Estes senhores sabem que a Itália já não quer ser mais cúmplice do negócio da imigração ilegal, e, por isso, terão de procurar outros portos”. Em reação, a Mission Lifeline, responsável pelo navio com o mesmo nome, chamou “fascista” a Salvini. A resposta não tardou, com o ministro a garantir que “insultos e ameaças” não o travarão.
Se Salvini pretende dissuadir os migrantes de chegarem à Europa com as suas recentes decisões, o mais provável é, alertam as tripulações humanitárias, que não seja bem sucedido. “Não vai fazer com que as pessoas parem de vir”, garantiu Ruben Neugebauer, do navio Sea Watch, acrescentando que “continuarão a vir de qualquer maneira, mas mais morrerão”. As tripulações alertam também para a escassez de alternativas de portos, caso o governo italiano mantenha a postura, por os navios terem de fazer distâncias mais longas até aos portos de abrigo, porventura espanhóis, dificultando o resgate.
Ainda que faça do encerramento dos portos uma bandeira política, proclamando a vitória perante os seus apoiantes, Salvini não deu ordens para que todos os navios vejam os seus pedidos recusados. Os navios italianos de resgate de migrantes continuam a poder desembarcar, como foi o caso do navio da guarda-costeira Ubaldo Diciotti, com 937 migrantes a bordo.
Não menos de 800 pessoas já terão morrido, em 2018, ao tentarem atravessar o Mediterrâneo em embarcações precárias, segundo dados das Nações Unidas.