Um ex-governante angolano acusado de corrupção, um antigo procurador português suspeito de ter recebido dinheiro para arquivar inquéritos e dois intermediários. Foi assim que o caso Fizz chegou a tribunal em janeiro. Amanhã, depois de vários meses de produção de prova, começam as alegações finais. Este é um processo inédito na Justiça portuguesa – que abalou as relações entre Lisboa e Luanda – mas que já não tem Manuel Vicente, ex-vice-presidente angolano, como arguido, uma vez que a sua parte foi separada e foi decidido o envio para os tribunais angolanos.
Orlando Figueira, ex-magistrado do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Paulo Blanco, advogado que representou o estado angolano, e Armindo Pires, homem de confiança de Vicente respondem pelos crimes de corrupção, branqueamento de capitais e falsificação de documento.
A alegada participação de Vicente
A acusação considera que, agindo sempre na sombra mas sempre a par de tudo o que se estava a passar, Manuel Vicente terá feito uma proposta a Orlando Figueira – se o magistrado acelerasse e arquivasse dois inquéritos que o visavam, teria um emprego no privado com uma remuneração muito acima do seu vencimento enquanto procurador (sobretudo depois dos cortes salariais). A promessa teria sido feita numa fase difícil da vida de Figueira, quando este passava por um divórcio.
E terá sido essa a razão, defendem as procuradoras Inês Bonina e Patrícia Barão, para que o ex-procurador tenha arquivado dois inquéritos que visavam Vicente e tenha apagado referências ao ex-governante angolano num apenso de um dos inquéritos. Tudo isso antes de sair com licença sem vencimento. Depois assinou um contrato com a sociedade Primagest que o MP diz estar ligada à Sonangol – de que Vicente fora presidente antes de chegar ao governo.
No decurso desse contrato e de um crédito que pediu ao Banco Privado Atlântico, entraram nas suas contas 760 mil euros, dinheiro que o MP diz serem 'luvas'.
As versões dos arguidos
Mas tanto Orlando Figueira como Paulo Blanco apresentaram uma versão pouco antes do início do julgamento que veio abalar a tese da acusação. Trazendo para o centro de todo este caso o banqueiro Carlos Silva e o advogado Daniel Proença de Carvalho, ambos garantem que o MP não quis chegar aos verdadeiros responsáveis pelo convite de trabalho feito a Figueira – referindo que fora Carlos Silva.
Adiantam ainda que Daniel Proença de Carvalho teve um papel fundamental, enquanto advogado do banqueiro, na cessação do contrato com a Primagest e que esta empresa sempre esteve na esfera de Carlos Silva e não da da Sonangol (a petrolífera estatal angolana atesta que nada tem a ver com a sociedade).
Orlando Figueira revelou ainda que nunca contou esta versão na fase de investigação, porque tinha feito um acordo de cavalheiros com Daniel Proença de Carvalho, exatamente para que nunca falasse no nome do advogado nem no do banqueiro.
Estas versões são desmentidas por Proença de Carvalho e pelo presidente do Banco Provado Atlântico, Carlos Silva.
Depois de diversas testemunhas e de muitos avanços e recuos, o coletivo presidido pelo juiz Alfredo Costa reservou os dias deamanhã e de sexta-feira para as alegações finais.