Quase um ano depois de ter sido anunciado o negócio entre a Prisa e a Altice, a operação avaliada em 440 milhões de euros chegou ao fim, mas por desistência. Uma venda que tanto para as empresas concorrentes como para os próprios reguladores estava condenada à nascença, mas que seria a tábua de salvação para o grupo espanhol que precisava, na altura, de financiamento rápido.
Mas o cenário entretanto mudou. A Prisa chegou no início do ano a acordo com os credores para prolongar o vencimento da dívida até 2022, altura em que terá de reembolsar 1500 milhões de euros aos investidores. Uma decisão que veio dar maior folga financeira a curto prazo. O acordo estabeleceu que não haverá amortizações obrigatórias durante os três primeiros anos (até dezembro de 2020) com o calendário de reembolsos posteriores a ser «ajustado à geração de caixa esperada» pelo grupo.
Com uma situação mais desafogada, o grupo espanhol já veio garantir que continua interessado em alienar a dona da TVI, mas «sem pressa» em concretizar no curto e médio prazo, uma vez que considera a Media Capital uma empresa «muito sólida».
Para já, segundo a mesma, «serão analisadas as opções, com muita tranquilidade», visto que o acordo que tem com os bancos já contemplava a possibilidade do negócio de venda à Altice não se realizar . «Não precisamos de vender a curto prazo ou com urgência», refere, informando ainda que, neste momento, não há qualquer outro grupo interessado.
Com esta desistência, a Altice culpou os reguladores portugueses de terem impedido a compra da Media Capital ao afirmar que se perdeu «uma oportunidade crucial» para o setor das telecomunicações e dos media em Portugal. Aliás, esse foi um dos principais argumentos usados por Alexandre Fonseca, CEO da Altice Portugal, quando foi ouvido no Parlamento.
A Altice lamentou que, «apesar de ter desenvolvido os melhores esforços nesse sentido, os reguladores não tenham emitido as decisões necessárias à concretização da transação em tempo útil», revelou, acrescentando que «os esforços da Altice para obter atempadamente uma decisão favorável incluíram a apresentação de um conjunto muito abrangente de compromissos».
E destaca que esses remédios apresentados à Concorrência teriam uma vigência alargada, seriam monitorizados por um mandatário independente e sujeitos a um mecanismo acelerado de resolução de litígios, com destaque para a separação das várias áreas de negócio. Ao mesmo tempo, estava prevista a implementação de uma oferta a plataformas concorrentes, atuais ou potenciais, do canal generalista TVI a um preço bitolado pelos custos históricos, e a renúncia a conteúdos exclusivos, com atribuição de condições preferenciais aos concorrentes.
Custos para os consumidores
O negócio que estava a ser alvo de uma investigação aprofundada por parte da Autoridade da Concorrência (AdC) não chegou a ver luz ao fundo do túnel e o regulador já depois de ter dado como extinta essa análise – face à desistência da operação – garantiu que esta compra poderia significar um aumento de custos de 100 milhões de euros por ano para os concorrentes e que acabaria por se refletir nos consumidores, ao aumentar, por exemplo, o preço pago pelas famílias em pacotes de telecomunicações.
De acordo com a AdC, dos vários aspetos analisados verificou que a a Altice passaria a deter, em resultado do controlo do grupo Media Capital «um nível de poder económico que lhe daria a capacidade e o incentivo para implementar diversas estratégias de encerramento dos mercados à concorrência, de que resultariam aumentos de custos muito significativos para os seus concorrentes, ao nível dos mercados de televisão por subscrição e de serviços multiple play».
Também os canais de televisão concorrentes à TVI sairiam, no entender da AdC, prejudicados, com a possibilidade de terem piores condições de preços, qualidade de serviços e posicionamento na grelha.
Para a Concorrência, os compromissos «resultariam num mero conjunto de intenções, de difícil especificação e monitorização, facilmente contornáveis ou manipuláveis pela empresa», além de que introduziriam «um nível de rigidez no mercado e de intervenção nas ‘normais’ negociações entre operadores de telecomunicações e de produtores de canais que, no limite, contribuiriam para distorcer o ‘normal’ funcionamento do mercado».
Concorrentes aplaudem
Para a Impresa, a não concretização deste negócio era «o único desfecho possível», considerando mesmo que é a melhor solução que protege o mercado, a sociedade portuguesa e os consumidores. Fonte oficial do grupo lembra quem desde que foi anunciada esta operação, «sempre alertou para os riscos que a mesma poderia acarretar para a concorrência e para o pluralismo no setor dos media, pelo que sempre acreditou que este seria o único desfecho possível».
Aliás, em abril deste ano a operadora garantiu que iria para tribunal «no momento certo» para travar esta negócio. «Esta operação não pode, sob qualquer circunstância, ser permitida porque acarreta danos significativos ao nível da concorrência, danos irreparáveis e que se aplicam tanto ao setor das comunicações eletrónicas como da comunicação social», chegou a afirmar no Parlamento.
Já a Vodafone Portugal considera que este é o desfecho que «mais favorece os consumidores, a concorrência, o bom desenvolvimento dos setores de media e telecomunicações e o país». Em relação à providência cautelar interposta no final de março junto da Autoridade da Concorrência (AdC) para suspender a análise deste regulador ao negócio, a operadora garantiu que tais instrumentos «deixaram de ter razão de ser, motivo pelo qual […] serão retirados».