«José Eduardo dos Santos não tem seguidores. Ninguém o seguia pela sua ideologia – até hoje ninguém sabe qual era a sua ideologia. Ninguém o seguia pelo seu carisma, ninguém o seguia pela afabilidade ou pela simpatia. As pessoas seguiam José Eduardo dos Santos porque ele tinha o poder e esse poder redistribuía os fundos do Estado», diz ao SOL José Eduardo Agualusa. O escritor angolano está convencido que o ex-Presidente de Angola, «deixando o partido, perdendo o último controlo que ainda tinha, fica completamente isolado». Por isso, acha que, «do ponto de vista político, ele acabou».
Durante tantos anos no poder, o ex-Presidente angolano não conseguiu estabelecer vínculos fortes de amizade. «Como é que um Presidente que permanece tanto tempo no poder não cria ligações de amizade, nem cria seguidores, nem dentro, nem fora do país?», questiona retoricamente o escritor nascido no Huambo. «José Eduardo dos Santos não tem amigos fora – estadistas, outros políticos importantes -, não criou essas redes de amizade, nem dentro, nem fora do país».
Agualusa lembra uma história que lhe contou Mário Soares, que um dia visitou Eduardo dos Santos na antiga residência oficial do Futungo. O antigo Presidente português disse-lhe, a certa altura, «‘você está aprisionado aqui dentro’». E era verdade, «ele viveu estes anos todos aprisionado dentro do palácio. Não saía, não criou relações. Portanto, agora, perdendo o poder total, ele ficará completamente isolado e esquecido, não acredito sequer que vá ter muita gente a visitá-lo em casa».
Para o autor de A Sociedade dos Sonhadores Involuntários, «a questão que se coloca agora é saber até que ponto José Eduardo dos Santos negociou o seu afastamento e a saída do poder e do partido, não para preservar a sua própria figura – até porque está doente -, mas para preservar os filhos. Se ele ainda podia ter alguma manobra, alguma forma de exercer pressão, vai perdê-la completamente. Tenho impressão que alguns dos filhos vão enfrentar dias difíceis. Essa é a grande interrogação: o que vai acontecer a Isabel dos Santos, a Zenu, a Tchizé?».
«Se esses processos avançarem, quer dizer que não foi exatamente assim, que ele já não tinha sequer maneira de fazer isso, que ele estava mais isolado do que as pessoas pensavam», conclui o escritor.