E quando se pensa que Diego Armando Maradona já dificilmente pode surpreender algum adepto de desporto em questões futebolísticas, tantos são os caminhos que já percorreu, eis que El Pibe é apresentado como treinador… na segunda divisão do México. Maradona irá orientar esta temporada o Dorados de Sinaloa, modesto emblema mexicano onde, por exemplo, Pep Guardiola encerrou a carreira de futebolista, e começou a fazer manchetes logo no primeiro contacto com os jornalistas – que eram mais de 200.
“Não estamos aqui para nos divertirmos. Não viemos como turistas, viemos para trabalhar. Assumo esta responsabilidade como se fosse um novo filho”, prometeu, garantindo ainda que, sob o seu comando, o atual 13.º e antepenúltimo classificado da segunda liga mexicana (três empates e três derrotas em seis jogos) irá “jogar ao ataque e para vencer” todos os jogos. Com um discurso firme, Maradona falou inclusive sobre o passado com as drogas de forma totalmente aberta. “As pessoas podem dizer muita coisa, mas eu deixei a minha doença há 15 anos. Eu estava a cair muito baixo, a consumir-me a mim próprio. Passo a passo até ao abismo. Mas cortei com isso, graças às minhas filhas. Fiquei sem um tostão – e não tenho vergonha de vos dizer isto –, mas voltei a trabalhar”, realçou.
Aos 57 anos, Maradona assume um clube que pertence à empresa Grupo Caliente, do empresário e político mexicano Jorge Hank Rhon, gestor de vários casinos por todo o país e ainda dono do Tijuana, que está na primeira divisão. Esta será a sexta experiência como treinador. Depois de passagens curtas pelos bancos de Textil Mandiyú e Racing Club nos anos 90, o antigo astro argentino chegou surpreendentemente à liderança da seleção das pampas em outubro de 2008, numa altura em que a Argentina corria sérios riscos de ficar fora do Mundial 2010. Maradona logrou o apuramento e levou a equipa do seu país aos quartos-de-final na África do Sul, onde acabou goleado pela Alemanha (0-4).
O vínculo com a federação argentina não foi renovado e Maradona só voltaria ao banco de uma equipa em 2011, no Al-Wasl, dos Emirados Árabes Unidos. Seria despedido um ano depois, após falhar o objetivo do título. Na última temporada, nova experiência naquele país asiático, agora na segunda divisão, ao serviço do Al-Fujairah. El Pibe até fez um bom trabalho, mas acabou por rescindir em abril último depois de falhar a subida, que era o objetivo primordial.
Com direito a honras militares Se o caro leitor está, por esta altura, a pensar que ainda há pouco tempo via notícias de Maradona a assumir um cargo num clube da Bielorrússia… tem toda a razão. De facto, o homem que levou a Argentina à glória mundial em 1986 e pôs o Nápoles no mapa do futebol italiano e europeu foi apresentado, com pompa e circunstância, como presidente honorário do Dínamo Brest em maio. A chegada ao clube, de resto, foi “à Maradona”: numa viatura militar (praticamente um tanque) e sob os aplausos de milhares de pessoas.
Na altura, Maradona assinou por três anos com o clube onde alinha o central português Dénis Duarte (ex-Vitória de Guimarães). Agora, a equipa bielorrussa voltou a realçar que o compromisso irá manter-se. “As suas principais funções prendem-se com dar popularidade ao futebol bielorrusso, ajudar a desenvolver as suas infra-estruturas e o futebol juvenil, participar no mercado de transferências e atrair patrocinadores. Maradona pode ocupar posições em organizações externas. Por isso, continuará a ocupar o cargo de presidente honorário do Dínamo Brest, ao mesmo tempo que é treinador do Dorados”, referiu em comunicado o atual sétimo classificado da liga bielorrussa.
Como é sobejamente conhecido da generalidade do público, Maradona manteve-se ativo publicamente durante os últimos anos, com várias intervenções polémicas pelos mais variados motivos. No último Mundial, por exemplo, teve constantemente apontados para si os holofotes mediáticos nos jogos da Argentina, com destaque para o encontro com a Nigéria, que valeu o apuramento para os oitavos-de-final, festejado por El Pibe com gestos obscenos para com os adeptos contrários – acabaria mesmo por se sentir mal já após o apito final, sendo assistido por médicos.
Durante a prova, foram constantes as suas críticas à equipa, e particularmente ao selecionador Jorge Sampaoli. Já depois da eliminação nos “oitavos”, às mãos da França (3-4), Maradona chegou mesmo a oferecer-se para regressar de borla ao cargo que ocupou há quase dez anos – e que neste momento está entregue à dupla Lionel Scaloni-Pablo Aimar (antiga estrela do Benfica). “Eu trabalharia de graça, não pediria nada em troca. Sinto-me triste por ver tudo o que foi construído com tanto esforço ser destruído tão facilmente. Tenho uma raiva que não se pode transmitir, uma fúria interior muito grande porque quem vestiu esta camisola não pode ver a seleção ser batida por uma equipa croata que não é a Alemanha, o Brasil, a Holanda ou a Espanha. Há que dizer a verdade”, disparou então, apontando o dedo à federação argentina no programa De la mano del Diez, que tinha no canal venezuelano Telesur: “É dirigida por gente que não sabe nada de futebol. Pensavam que o Sampaoli ia resolver todos os problemas com computadores, drones e 14 ajudantes. A Argentina não sabe como jogar, está à deriva. Querem que o Messi faça tudo, mas ele passa a bola aos colegas e estes devolvem-lhe paralelepípedos!”.
Estrela à escala global Apesar de todas as tiradas e de todos os comportamentos menos próprios, o nome de Diego Maradona continua a envolver um mediatismo e notoriedade enormes. Terá sido, também, com esse facto em mente que o proprietário do Dorados de Sinaloa pensou naquele que muitos consideram o melhor futebolista de sempre para assumir o comando da equipa. Basta ver o vídeo abaixo, referente a um treino do clube, para se perceber isso:
Em termos comerciais, pelo menos o próprio Maradona já está a ganhar. É que está já em fase de pré-produção uma série sobre a sua vida, que será realizada por uma produtora mexicana e exibida em plataformas de streaming. “Maradona, bendito sonho” passará em revista a vida de El Diego desde a sua juventude na Villa Fiorito até aos mais recentes passos como treinador. Não foram ainda divulgados o número e duração dos episódios nem a data de estreia da série. Vários são os exemplos na cultura popular argentina de homenagens a Maradona, como a música “La Vida Tombola”, de Manu Chao, ou o premiado documentário “Maradona by Kusturica”, do renomado realizador sérvio.