Nova crise. Os sinais já estão aí

Fez este sábado dez anos que se assistiu à queda do gigante norte-americano Lehman Brothers. Com as economias ainda a melhorar já há ameaças de uma nova crise a curto prazo.

Dez anos depois do colapso do gigante norte-americano Lehman Brothers, os alarmes voltam a soar. O boom imobiliário, a concessão de crédito desenfreada – principalmente para a compra de casa – e a desvalorização das moedas em países emergentes são alguns sinais que levam muitos a prever que uma nova crise está aí à porta, sem ainda termos conseguido recuperar da anterior.

O alerta já foi dado pelo ex-presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, ao garantir que a atual situação financeira mundial se encontra num plano tão perigoso como o vivido em 2007, ano que antecedeu a maior falência financeira de sempre, a do Lehman Brothers. Esta semana foi a vez de Nouriel Roubini, o homem que previu a última crise financeira, avisar dos riscos de um novo colapso dentro de dois anos. 

Por cá, os economistas contactados pelo SOL também reconhecem esses riscos. «Apesar dos bancos serem agora mais seguros do que em 2007, as repercussões políticas e económicas do pós crise estão ainda a ser sentidas. Pode dizer-se que a alavancagem passou das empresas para o consumidor. O crescente boom nos preços em alguns setores, como o imobiliário, deixam alguns sinais preocupantes. Sem dúvida que haverá uma nova crise, a questão será saber se o sistema financeiro ficou agora mais preparado para enfrentar dificuldades», diz ao SOL Nuno Mello, team leader & senior broker da XTB.

Outro fator crítico, de acordo com o responsável, diz respeito ao ressurgimento e ao fortalecimento dos partidos populistas um pouco por toda a Europa que poderão trazer instabilidade. O mesmo acontece com a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, «com a crescente introdução de novas tarifas e sanções comerciais, poderá provocar uma recessão económica a nível mundial».

A opinião é partilhada por Rui Bárbara, economista do Banco Carregosa, que ainda assim acredita que a dimensão da crise será menor do que a de 2008. «É certo que vamos ter uma recessão mais cedo ou mais tarde porque é impossível viver sem recessões. Elas fazem parte dos ciclos económicos e ainda ninguém acabou com os ciclos económicos. Pode é não ser uma crise financeira com o a que começou em 2008, porque essas tendem a ocorrer de 70 em 70 anos», refere ao SOL.

No entanto, lembra que os atuais sinais já considerados preocupantes, como o boom imobiliário e o aumento da concessão de crédito, são consequências da política monetária utilizada para combater os efeitos da crise iniciada em 2008. E deixa uma garantia: «alguns deles, como a concessão de crédito ou os preços do imobiliário, nem sequer estão aos níveis da bolha de pré 2008».

Para Rui Bárbara, os sinais mais preocupantes estão relacionados com a dívida dos países (dívida soberana), especialmente dos países desenvolvidos, que é maior do que era em 2008, e com o rendimento real da classe média do mundo ocidental, que está estagnado.

 

Crédito e imobiliário ao rubro 

Mas sem dúvida que o aumento da concessão de crédito é dos fatores críticos e que podem contribuir para o despoletar de uma nova crise. E os números falam por si: o montante concedido pelos bancos para a compra de casa rondou os 919 milhões de euros em julho, o segundo valor mais elevado deste ano. Os dados foram revelados pelo Banco de Portugal e já coincidem com a entrada em vigor das recomendações do regulador. No mês anterior, já na antecipação das novas regras – em que as instituições financeiras foram recomendadas a atribuir novos créditos apenas a clientes que gastem até 50% do seu rendimento líquido com as prestações mensais de todos os empréstimos detidos (habitação e consumo) – foram concedidos 990 milhões de euros, o valor mais elevado desde junho de 2010. Nos meses anteriores, o montante emprestado tinha variado entre os 634 milhões e os 876 milhões de euros mensais.

Mas no acumulado dos primeiros sete meses do ano, o valor do novo crédito à habitação ultrapassou os cinco mil milhões de euros, mais 26,4% do que no mesmo período do ano anterior. Um montante que renova máximos de 2010. Já o saldo na carteira dos bancos rondou os 93 milhões de euros.

Mais moderada foi a concessão do crédito ao consumo, que também está incluído nas recomendações do supervisor, tendo sido emprestados 387 milhões de euros, em julho. Um montante que ficou abaixo dos 419 milhões de euros concedidos um mês antes. No acumulado dos primeiros sete meses do ano, as novas operações ultrapassaram os três mil milhões de euros, mais 17,6% do que no período homólogo.

Também o mercado imobiliário não deixa os especialistas mais tranquilos. Só no primeiro trimestre deste ano, os preços das casas subiram 12,2% em Portugal, depois de já terem aumentado 10,5% em 2017. A subida foi superior nas casas usadas (13%), face à verificada em habitações novas (9,7%).

E a tendência é para continuar a subir. A Standard & Poors (S&P) já divulgou um relatório onde estima que os preços vão subir 9,5% este ano mas que nos próximos anos – em 2019, 2020 e 2021 – vão aumentar menos, respetivamente, 7%, 6% e 5%. Segundo a agência de rating, as pressões vão abrandar com o crescimento económico mais lento, os crescentes custos do endividamento e a deterioração da acessibilidade.

Mas os alertas não ficam por aqui. A queda do valor de moedas emergentes desperta temor de nova crise mundial. O epicentro da crise cambial está na Turquia – desde o começo do ano, a lira turca perdeu quase 40% de seu valor – mas já atingiu a Argentina, África do Sul, Rússia, Índia e Brasil, onde o real voltou ao nível de 2016, período pré-impeachment de Dilma Rousseff.