Tancos. Parlamento vai ter comissão de inquérito

Ministro da Defesa sob pressão. CDS diz que polémica com a recuperação das armas colocou em causa prestígio internacional do País.

O líder parlamentar do PSD, Fernando Negrão, anunciou esta quarta-feira que os sociais-democratas votarão a favor da proposta de inquérito parlamentar, agendada para o próximo dia 24. Os sociais-democratas demoraram uma semana a tomar posição oficial, mas Fernando Negrão refutou a ideia de qualquer atraso. Faltava-lhe conhecer o texto para tomar uma decisão, e bastaram 15 minutos para formatar a lista de argumentos.

Assim, os sociais-democratas defenderam que o inquérito se deve debruçar sobre os "problemas de articulação de órgãos do Estado", uma situação de "vergonha" que é preciso esclarecer. Para Fernando Negrão "há aqui um problema que envolve outras pessoas, para além daquelas que estão envolvidas em inquéritos criminais", Por isso, as audições, segundo o PSD, centrar-se-ão "nessas pessoas e nos responsáveis máximos dessas instituições". Dito de outra forma, o PSD, tal como o CDS quer apurar responsabilidades políticas do ministro da Defesa, Azeredo Lopes, no caso que já tem dois inquéritos judiciais em curso, um sobre o roubo de material de guerra no paiol de Tancos, em junho de 2017, e outro, sobre a recuperação das armas em outubro do mesmo ano.

A forma da recuperação das armas levou o ministério público a pedir a detenção de nove pessoas, sob suspeita de encobrimento do furto. Duas estão em prisão preventiva.

O Bloco de Esquerda também se voltou a pronunciar sobre a proposta de inquérito do CDS. O líder parlamentar, Pedro Filipe Soares, acusou o CDS de "populismo", mas assegurou que o seu partido não votará contra a proposta, optando pela abstenção. Contudo,  o deputado defendeu que o BE se "empenhará em dar dignidade"  à iniciativa e "corrigir" erros, a começar nas limitações decorrentes de existirem investigações judiciais em curso. 

Apesar das críticas, a proposta será viabilizada no próximo dia 24 de outubro uma vez que o PS também já anunciou que não iria inviabilizar o inquérito.  Falta ainda o parecer jurídico dos serviços da Assembleia da República para avaliar eventuais incompatibilidades legais, mas o resultado deverá ser conhecido já na próxima semana.

 

CDS diz que caso põe em causa prestígio internacional

Após o agendamento da proposta, em conferência de líderes, o líder parlamentar Nuno Magalhães,  explicou aos jornalistas que o pedido de inquérito parlamentar ao caso de Tancos  visa "apurar responsabilidades políticas", separando-as das responsabilidades criminais, que estão sob investigação judicial.  O deputado considerou também que o caso "pôs em causa o prestígio de Portugal do ponto de vista internacional", uma vez que, o governo deu "garantias e tudo o que pareceu ser um grande sucesso de recuperação das armas, não o foi". Em causa está, não só o roubo de material de guerra como o anúncio da sua recuperação, quatro meses depois, com sinais claros de tensão entre a Polícia Judiciária e a Polícia Judiciária Militar. No final do processo, os contornos da recuperação das armas de guerra levaram o Ministério Público a abrir outro inquérito por suspeitas de se forjar a entrega do material de guerra. O caso levou à detenção do diretor da Polícia Judiciária Militar, entretanto substituído.

A proposta de inquérito prevê ainda que se reflita sobre a articulação das Forças Armadas e as demais entidades de polícia criminal, além do próprio funcionamento do Ministério da Defesa Nacional. 

A este propósito, Nuno Magalhães recuperou a resposta do primeiro-ministro sobre a confiança no ministro da Defesa, proferida no último debate quinzenal. O deputado considerou que António Costa cometeu um "lapso" ao afirmar que confiava no ministro da Defesa e na ministra da Justiça. O CDS não questionou a confiança na ministra da Justiça, que tutela a Polícia Judiciária. Por isso, Nuno Magalhães concluiu "que até o primeiro-ministro concordará com esse parágrafo [na proposta de inquérito]". Ou seja, também é preciso avaliar a falta de coordenação entre os diversos órgãos políciais criminal e as Forças Armadas.

O anúncio de um inquérito parlamentar ao caso de Tancos surgiu há mais de uma semana, no mesmo dia em que oito pessoas foram detidas no âmbito da operação Húbris. Esta semana foi detida mais uma pessoa, o ex-porta-voz da Polícia Judiciária Militar, Vasco Brazão, regressado da República Centro Africana, onde se encontrava em missão. O arguido acabou por ficar em prisão domiciliária, mas sem vigilância eletrónica. O último arguido conhecido no processo escreveu no facebook que estava “arrependido, mas de consciência tranquila” e que os militares cumprem as ordens. Ora, a frase deixou um lastro de incómodo no seio dos militares e o vice-almirante Cunha Lopes disse mesmo que esse tipo de argumento era revelador do desconhecimento do que “é ser autoridade de polícia criminal”, citado pelo DN.