O que já é certo e as incertezas do próximo OE

Continuam a existir muitas dúvidas, principalmente nas questões em torno da função pública e do imobiliário. Costa já afastou algumas medidas que eram dadas quase como certas.

Falta pouco mais de uma semana para ser conhecido o Orçamento do Estado (OE) para o próximo ano e vão sendo reveladas algumas medidas, enquanto outras são definitivamente afastadas. Ao mesmo tempo, continuam as negociações entre o Governo e os partidos que o apoiam. É o caso do aumento extraordinário das pensões, da revisão das reformas antecipadas ou da contagem do tempo de serviço de várias carreiras para o descongelamento das progressões. Já afastada está a redução dos impostos sobre a energia de 23 para 6%. Uma medida que teria um impacto de 500 milhões de euros, o que no entender do primeiro-ministro, não lhe parece «de todo comportável».

Ainda assim, António Costa deixou uma garantia nesta matéria: «Há outras formas mais saudáveis, que julgamos serem possíveis, e nas quais estamos a trabalhar para reduzir a fatura energética dos portugueses».

No entanto, enquanto se espera pela versão final do documento, que só deve ser fechado nos últimos dias do prazo, vão surgindo cada vez mais vozes a apontarem para um orçamento eleitoralista. Do lado de Mário Centeno há apenas uma garantia: «Vamos ter um OE com muitas medidas, algumas que transitam já do passado, que terão impacto na recuperação de rendimentos, no reforço da confiança e na melhoria do economia». 

Desconto IRS

O principal foco vai para os emigrantes, com o Governo a acenar com desconto de 50% no IRS para aqueles que decidam voltar a Portugal. O Executivo acredita que se trata de um «incentivo forte» para fazer  regressar quem emigrou entre 2011 e 2015 e esta é uma uma das medidas já anunciadas por António Costa e que poderá passar por benefícios fiscais a deduções dos custos do regresso. A ideia é que estes emigrantes fiquem entre três a cinco anos, a pagar metade da taxa do IRS que pagariam, dando-lhes ainda a possibilidade de conseguirem deduzir integralmente os custos da reinstalação. No entanto, parece tratar-se de uma medida que estará longe de convencer os emigrantes a voltar ao seu país de origem. 

Já para quem vive em Portugal, não vai haver grandes alterações, apesar das pressões dos partidos que apoiam o Governo do PS. O PCP defende a criação de dez escalões de IRS, enquanto o Bloco de Esquerda exige a reposição dos oito que existiam antes do «enorme aumento de impostos» de Vítor Gaspar. 

Mas há uma certeza: o imposto voltará a baixar em 2019, devido ao desagravamento que ficou estabelecido com o OE 2018. Ou seja, esta nova descida em 2019 está relacionada com o facto de as alterações aos escalões não terem sido totalmente refletidas na retenção na fonte durante este ano.

Açúcar penalizado

O Governo pretende criar quatro escalões de impostos para refrigerantes, em vez dos atuais dois, conforme as quantidades de açúcar presentes nas embalagens. O objetivo é taxar de forma mais elevada as bebidas com maiores valores de açúcar. A taxa irá aumentar para 20 euros (é de 16,46 euros) nas bebidas com mais de 80 gramas de açúcar por litro. Entre 50 e 80 gramas, a taxa será de oito euros, entre 25 e 50 gramas, a taxa desce para seis euros e, até 25 gramas, será de um euro por litro. No entanto, néctares e iogurtes líquidos mantêm-se fora da lista de produtos tributados. Já no ano passado, o Executivo agravou outros produtos, o conhecido ‘fat tax’. 

Função Pública

Este será sem dúvida um dos calcanhares de Aquiles de António Costa. Ainda esta semana, o primeiro-ministro revelou que prefere aumentar os salários mais baixos na Função Pública a promover melhorias salariais a todos os funcionários públicos. «Iremos tão longe quanto for possível para que os funcionários públicos façam parte da melhoria dos rendimentos. Estamos em fase de negociações com os sindicatos. Mentiria se dissesse em que não há uma margem que podemos negociar».

Também o líder parlamentar do PS tinha admitido que estava em estudo a possibilidade de o Orçamento do Estado para o próximo ano contemplar um aumento do salário dos trabalhadores da administração pública, «pelo menos» nos níveis remuneratórios mais baixos. «Pensamos que é possível trabalhar – e estamos a trabalhar – para ver se há também um aumento da remuneração base, pelo menos até a um determinado nível salarial», disse Carlos César.

Também o ministro das Finanças, que inicialmente afastou essa possibilidade, acabou por admitir que tudo dependeria da folga que iria ter. 

Recorde-se que os sindicatos exigem aumentos salariais entre 3% e 4% para o próximo ano para todos os trabalhadores.

Também duras têm sido as negociações em relação à contagem do tempo exigida por várias carreiras especiais, nomeadamente os professores, para efeito do descongelamento das progressões na carreira. À exigência de contagem do tempo de serviço dos professores juntam-se outras carreiras especiais da Função Pública, como enfermeiros, funcionários judiciais, guardas prisionais, polícias e profissionais da GNR.

Pensões

Para já, há uma garantia: em janeiro, as pensões voltam a ser atualizadas de acordo com a lei que tem em conta a inflação e o crescimento do PIB. Esta atualização, permitirá, segundo as contas do Governo, que 98% dos pensionistas tenham em 2019 um aumento superior ao valor da inflação. Mas, além deste acréscimo previsto na lei, o Executivo e os parceiros políticos têm estado a negociar um aumento extraordinário para os pensionistas, pelo terceiro ano consecutivo, que tem sido atribuído em agosto e que varia entre seis e 10 euros. 

Tanto o BE como o PCP exigem que no próximo ano esta subida seja atribuída logo em janeiro. Em causa está uma atualização extraordinária por pensionista cujo montante global das pensões seja igual ou inferior a 1,5 vezes o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), ou seja, de 643,35 euros em 2018.

Mas apesar de ser ainda uma matéria em negociação, o primeiro-ministro já deu a entender que não haverá espaço para aumentos extraordinários em 2019. «Houve dois anos consecutivos com atualização de pensões. Quando discutimos se vamos ou não ter um novo aumento extraordinário, é preciso ter em conta que não estamos no mesmo níveis de há dois anos atrás, pelo contrário, estamos numa situação em que em dois anos consecutivos as pensões sobem», referiu António Costa.

Reformas 

Uma das prioridades para o BE e que o primeiro-ministro já admitiu negociar para 2019 diz respeito ao fim do fator de sustentabilidade para as carreiras longas. Este ano já foi implementado o fim da penalização para quem tem pelo menos 46 anos de contribuições e começou a descontar para a reforma aos 16 anos de idade ou antes – o que poderá abranger entre mil e duas mil pessoas. O Governo prepara-se ainda para acabar com a regra que obriga os funcionários públicos a reformarem-se aos 70 anos de idade.
Imobiliário

Também aqui que estão centradas as maiores dúvidas. O Governo admitiu alterações às regras do Adicional ao IMI (AIMI) no próximo ano. O imposto foi criado em 2017 e incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários (VPT) dos prédios urbanos situados em território português. Outra incerteza diz respeito à chamada ‘taxa Robles’, mas não verá a luz do dia, tendo em conta a reação de António Costa à medida. 

Segundo assumiu o primeiro-ministro, a proposta do BE sobre a especulação imobiliária «repete o imposto de mais valias que já existe» – e acrescentou que foi «feita à pressa».

Uma ideia que vai ao encontro do que foi defendido pela consultora Deloitte, ao defender que o Governo devia apostar em «definir critérios» que permitam aplicar a lei que já hoje existe e que «é clara no sentido de que quem compra e vende imóveis no âmbito de uma atividade económica, isto é, tendo apenas como intuito o lucro», deverá ver as mais-valias obtidas tributadas pela totalidade.

Reforço Verbas 

O Governo já prometeu «o maior orçamento de sempre na Cultura» para o próximo ano, assim como para a Ciência. No debate sobre o estado da Nação, António Costa afirmou que as verbas para Investigação e Desenvolvimento vão atingir 1,5% do PIB em 2019, «reforçando a convergência com o objetivo de 3% do PIB em 2030».

Entrega PEC

Para as empresas, já foi deixada uma garantia: o Orçamento do Estado para o próximo ano vai eliminar a obrigatoriedade da entrega do Pagamento Especial por Conta (PEC), uma obrigação que será substituída por um «conjunto de outros instrumentos que nalguns casos já existem para que as empresas possam cumprir com as suas obrigações fiscais». O fim do PEC é, de há muito, uma reivindicação do PCP.