Liga das Nações. Já não há volta a dar: vem aí a era dos Silvas

Com uma grande exibição coletiva, alicerçada na inspiração e no talento do tridente ofensivo formado por Bernardo, Rafa e André Silva, Portugal saiu da Polónia com a vitória (2-3) e o bilhete para a final four praticamente carimbado

André, Rafa, Bernardo. Se ainda havia dúvidas, o encontro de ontem em Chorzów dissipou-as por completo: a seleção nacional está a partir de agora entregue ao talento da dinastia Silva. Mas também há Cancelo, Dias, Rui, Neves ou o Luís Miguel (que prefere que lhe chamem Pizzi) a mostrar que já são homens feitos e merecem pisar os mesmos terrenos dos consagrados Patrício, Pepe e William. E do capitão, claro, quando este decidir sair do período sabático a que se dedicou neste período pós-Mundial, primeiro para se adaptar à nova vida na Juventus e agora com outro tipo de preocupações…

Este é um Portugal diferente – a ausência de Ronaldo a isso obrigaria sempre. É claro que nenhuma equipa fica melhor sem um dos melhores futebolistas da História, mas a verdade é que a seleção nacional tem demonstrado, nos últimos jogos, saber viver muito bem sem o CR7. Os artistas aparecem mais soltos, com mais liberdade para colocar em campo toda a sua criatividade e sem a obrigação de procurar sempre “a” referência, e isso nota-se no futebol praticado pela equipa. Que ontem até contou com uma grande… meia surpresa no onze: Rafa, chamado à última hora para o lugar do lesionado Gonçalo Guedes, mereceu a titularidade de Fernando Santos devido a uma indisposição súbita de Bruma – e viria a justificá-la a 100 por cento.

E a coisa até nem começou risonha. Portugal não entrou mal, mas ficaria em desvantagem logo aos 18 minutos. Piatek, o tal novo menino-bonito do futebol europeu – leva nove golos na Serie A, a mesma onde joga um tal… pronto, o caro leitor já percebeu a ideia -, subiu mais alto que Cancelo e bateu Rui Patrício. O guardião luso estava, é preciso referi-lo, a ser bloqueado por Lewandowski, que ontem cumpriu a centésima internacionalização pelo seu país – e a experiência nestas coisas conta (mesmo) muito.

 

Aquele sofrimento habitual A esta versão de Portugal, todavia, pouco afeta um golo sofrido. E isso ficou bem claro a partir daqui: num futebol enleante, cheio de virtuosismo mas também de eficácia a nível da decisão, os Silvas, coadjuvados na perfeição pelos homens dos setores mais recuados, lançaram o cerco à baliza de Fabianski e colheram o primeiro fruto dessa ameaça constante aos 31’, com um passe subtil de Cancelo a pedir a desmarcação de Pizzi. O médio do Benfica acedeu ao convite do lateral-direito da Juventus, fugiu à marcação e foi à linha fazer meio golo: o toque de André Silva foi o outro meio.

Estava dado o mote para a reviravolta. Pizzi voltou a testar a atenção do guarda-redes que atua há mais de uma década na Premier League com um remate de longe logo a seguir, mas um dos grandes momentos da noite chegaria a dois minutos do intervalo: um passe magistral de Rúben Neves a partir do círculo central encontrou Rafa, que se esgueirou por entre os centrais contrários. A receção do extremo do Benfica foi igualmente genial, tirando logo aí o guardião do caminho e ficando com a baliza à sua mercê. Acabou por ser Glik, central do Mónaco (agora já não de Leonardo Jardim – ver página 46), a atirar a bola para a própria baliza, na tentativa de a roubar ao jogador português, mas era impossível tirar qualquer ponta de beleza a um lance destes.

Veio a segunda parte e veio a recompensa para Bernardo Silva, provavelmente o melhor em campo. O criativo do Manchester City pegou na bola na zona central, aguentou a carga do adversário e disparou de pé esquerdo. Fabianski ainda tocou, mas ela levava o selo do golo.

O selecionador da Polónia decidiu então refrescar a equipa – ou algo do género: é que os elementos lançados foram os trintões Grosicki e Blaszczykowski, a quem alguém um dia teve a brilhante ideia de dar a alcunha de Kuba para facilitar. E, já depois de um falhanço clamoroso do central Bednarek, foi precisamente o extremo, que havia sido vilão no Euro 2016, ao permitir a Rui Patrício a defesa do penálti que colocou Portugal nas meias-finais, a devolver emoção ao encontro com um golo sensacional do meio da rua – desta vez, o guarda-redes do Wolves nem com asas lá chegaria.

Por esta altura, Fernando Santos já tinha trocado Pizzi pelo fresco Renato Sanches e estaria nos pés do médio do Bayern, aos 84’, a grande oportunidade de Portugal matar o jogo: após um passe de morte, Renato ultrapassou o guardião adversário e atirou para a baliza, com o defesa Kedziora a evitar em cima da linha o que seria o golpe final para os polacos. Em cima do minuto 90, nova ocasião de golo iminente para Renato Sanches: desta feita, o remate do menino da Musgueira foi quase perfeito… mas a defesa de Fabianski também.

Faltava o último lance de grande perigo, com o recém-entrado Bruno Fernandes a falhar de forma escandalosa, com a baliza à sua mercê, após excelente trabalho de André Silva. “A Polónia tem enorme qualidade, temos de dar mais de 100 por cento”, dizia o aniversariante Fernando Santos na quarta-feira. Missão cumprida, dizemos nós.

 

Quase nas meias A vitória na Polónia deixa Portugal muito perto do apuramento para a final four da mais jovem competição da UEFA. A Seleção nacional soma agora seis pontos, fruto do triunfo de ontem e também da vitória caseira sobre a Itália a abrir a prova (1-0), tendo cinco de vantagem sobre os dois adversários, que se irão enfrentar este domingo. Em caso de empate, Portugal assegura desde logo o apuramento para as meias-finais, mesmo tendo ainda de viajar até à Itália e receber a Polónia.

“Numa qualificação que só tem quatro jogos, cada jogo é muito mais importante do que uma qualificação normal, que tem dez jogos. O jogo encerra essa dificuldade, para Portugal e para a Polónia”, lembrava o selecionador nacional na véspera deste encontro. “Dominámos o jogo. Sofremos de canto, normalmente não sofremos, e a Polónia defende bem e é perigosa no contra-ataque. Mas felizmente reagimos bem. Ganhámos bem, a minha equipa acredita nela e é bom que estes jogadores cresçam em jogos com pontos”, realçou ontem após o apito final.