Carlos Ghosn, presidente do grupo Nissan e da aliança Renault-Nissan-Mitsubishi Motors surpreendeu tudo e todos ao ser detido em Tóquio por alegada evasão fiscal. O empresário francês – de origem brasileira e libanesa – entrou no grupo no final dos anos 80 e juntou-se à Nissan no final dos 90, quando o construtor nipónico fez a aliança com o parceiro francês. Em 2005, passou a chairman e presidente-executivo de ambas as empresas, tornando-se no primeiro gestor do mundo a assumir a liderança simultânea de duas empresas da Fortune Global 500. Foi enviado para o Japão para relançar a marca japonesa que, na altura, quando foi selada a aliança com a Renault, estava à beira da falência. O sucesso chegou rápido, mas o CEO manteve um discurso modesto: «Quando cheguei à Nissan, não levei um plano, tinha apenas uma folha em branco nas mãos»,
Chegou a ser considerado o homem de negócios estrangeiro mais influente no Japão, mas, no início desta semana, o seu percurso ascendente sofreu um corte abrupto.
Ghosn é suspeito de diversos crimes, incluindo fraude fiscal, estando a responder às autoridades de Tóquio, que conduzem a investigação. A agência de notícias nipónica Kyodo diz que o gestor terá ocultado remunerações no valor de 44 milhões de euros, ao longo dos últimos cinco anos. Além destas suspeitas, o gestor também está a ser investigado por alegadamente ter usado recursos das empresas em benefício próprio. O fabricante automóvel admitiu que, com base em denúncias, levou a cabo uma «investigação interna nos últimos meses sobre conduta imprópria, envolvendo o presidente Carlos Ghosn» e Greg Kelly, outro alto dirigente. Em causa estará o uso de dinheiro e recursos da empresa para fins pessoais.
A empresa referiu ainda em comunicado que a investigação mostrou que «durante muitos anos tanto Ghosn como Kelly têm registado valores de compensação, no relatório de valores mobiliários da Bolsa de Valores de Tóquio, que eram inferiores ao valor real». E o fabricante automóvel foi mais longe ao afirmar que, em relação a Ghosn, foram descobertas «várias outras ações significativas de má conduta, como o uso pessoal de ativos da empresa», dizendo ainda que «o envolvimento de Kelly também foi confirmado».
Desilusão
Essas informações já foram partilhadas pela marca com o Ministério Público japonês, cooperando «plenamente com a investigação» e garantindo que continuará a fazê-lo. Hiroto Saikawa lamentou a situação e pediu desculpas aos acionistas. «Sinto-me desiludido, indignado e magoado. E à medida que formos divulgando mais detalhes sobre o caso, estou certo de que as pessoas irão sentir o mesmo que eu», confessou o presidente executivo da Nissan.
O estilo de Ghosn ficou fortemente associado a uma estratégia de redução de custos, uma política que permitiu ao fabricante automóvel recuperar a sua sustentabilidade e regressar aos lucros.
Considerado um dos CEO mais brilhantes da atualidade, Carlos Ghosn é – ou era – o rosto do sucesso da aliança entre Nissan, Renault e Mitsubishi ao tornar a empresa campeã de vendas. Só nos primeiros seis meses do ano comercializou 5,5 milhões de veículos em todo o mundo, fazendo uma feroz concorrência à rival Volkswagen.
Origens
Carlos Ghosn nasceu em 1954, em Porto Velho, numa família libanesa imigrada no Brasil. Tinha seis anos quando voltou para o Líbano com os pais, que o inscreveram numa escola de jesuítas. Mais tarde, o futuro patrão da Renault diria que foi o ensino dos jesuítas que lhe deu «o gosto do desafio e da competitividade». Mas é em França que estuda engenharia e que inicia a sua sua carreira no grupo Michelin, de onde sai para integrar a equipa da Renault.
O segredo do seu sucesso passa pela motivação. «A motivação é o elemento mais importante da força de uma empresa. A solução está sempre nas pessoas que fazem a empresa», referiu Ghosn em várias entrevistas: «O segredo está em saber motivá-las e mobilizá-las em torno de objetivos muito claros e indiscutíveis, integrando-as no processo de procura de soluções».
Na sequência da polémica com a sua detenção, a Renault já anunciou que Thierry Bolloré será o CEO interino da marca com os mesmos poderes e responsabilidades. Ghosn foi entretanto demitido do cargo de CEO da Nissan e o Governo francês já se manifestou preocupado com a situação e repercussões que o caso poderá ter na aliança Renault-Nissan-Mitsubishi. Neste período, a administração irá reunir-se de forma regular «para proteger os interesses da Renault e a sustentabilidade da aliança». Escusando-se a tecer mais comentários sobre o caso e aos procedimentos judiciais contra Ghosn no Japão, a Renault garante que «pediu à Nissan, na base dos princípios da transparência, confiança e respeito mútuo estabelecido no Quadro da Aliança, que providenciem toda a informação na sua posse em relação à investigação interna relacionada com Ghosn».