O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, confirmou esta terça-feira que o Brasil se vai retirar do Pacto Mundial de Migração da ONU, assinado pelo anterior governo em dezembro. O pacto foi uma resposta ao fluxo global sem precedentes de migrantes, que levou a uma crise humanitária internacional. As negociações tiveram como objetivo conseguir garantias mínimas da salvaguarda dos direitos humanos. O pacto foi assinado por mais de 160 países.
O novo governo já tinha assinalado a sua oposição ao pacto ainda antes de tomar posse, logo no dia da sua ratificação, em Marrocos. O ministro dos Negócios Estrangeiros do novo executivo, Ernesto Araújo, considerou que “ a imigração não deve ser tratada como uma questão global, mas sim de acordo com a realidade e soberania de cada país”.
As Nações Unidas receberam a notícia com muita preocupação, pelo que o gesto possa significar a nível de cooperação internacional e de direitos humanos no Brasil. Em comunicado, a declarou que “é sempre lamentável quando um estado se dissocia de um processo multilateral”. A velocidade da decisão, apenas oito dias depois de tomar posse, surpreendeu a direção da ONU, que teme que seja o primeiro passo para se afastar de outros acordos, processos de cooperação e até mesmo pactos consolidados nas leis internacionais.
Está a ser questionada a permanência do Brasil em órgãos como o Conselho de Direitos Humanos, tratados ambientais e os vários órgãos especializados em áreas sociais, direitos indígenas, das mulheres e até mesmo nos comités contra a tortura. Bolsonaro é um admirador confesso da ditatura militar, conhecida por torturar opositores, e enquanto candidato o presidente brasileiro sugeriu várias vezes o assassinato de adversários políticos.
A saída do Pacto Mundial de Migração da ONU é ilustrativa da alteração das relações diplomáticas do Brasil, desejada por Bolsonaro. O Brasil afasta-se da orientação geral das Nações Unidas, alinhando-se com a abordagem unilateral do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que também se recusou a assinar o pacto, tal como Israel e a Austrália.
Bolsonaro justificou a decisão no Twitter, escrevendo que “o Brasil é soberano para decidir se aceita ou não migrantes”, acusando o pacto migratório de ser uma “pressão do exterior”. A crítica do presidente do Brasil e do seu executivo tem colocado o ónus na alegada perda de soberania dos estados que ratificam o pacto.
No entanto, o secretário-geral da ONU, António Guterres, durante a Conferência Intergovernamental para adotar o pacto, considerou que tais preocupações, expressas por outros executivos, eram uma falsidade. Garantiu que “o pacto não é um tratado”, adicionando que “não é legalmente vinculativo. É apenas um enquadramento para a cooperação internacional” e alicerçado em “processos de negociação baseados na boa fé”.
Um embaixador, citado anonimamente pelo jornal brasileiro “Estadão”, considera que “a mensagem que o Brasil manda é que, aos países em desenvolvimento, a ONU pode não ser tão relevante no futuro, e isso é de uma enorme gravidade”. A coordenadora da ONG Conectas afirmou que “hoje há muitos mais brasileiros vivendo no exterior do que migrantes no Brasil”, e que o afastamento do acordo poderá ter impacto nos brasileiros espalhados pelo mundo.