António Costa passou a semana a anunciar grandes investimentos que serão feitos no setor dos transportes nos próximos anos. Entre eles, a solução para a tão badalada falta de capacidade do aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa. Neste sentido e alegando sempre existir máxima urgência em resolver a questão, o Estado e a ANA – Aeroportos de Portugal assinaram o acordo que permitirá a expansão da capacidade aeroportuária de Lisboa na passada terça-feira. «Não discuto mais se a decisão é certa ou errada, esta é a decisão», disse António Costa sobre a solução Montijo + Portela, que tem estado envolvida em várias polémicas.
Uma das mais importante tem sido o facto de não existir ainda garantia de que não tenha um impacto negativo em termos ambientais [ver págs. 56-57]. Facto é que o estudo, que avalia as questões ambientais, não está pronto, mas este ponto não foi suficiente para impedir a assinatura do acordo. Apesar da chuva de críticas a propósito deste ponto, o acordo foi assinado.
A piorar tudo está o facto de António Costa ter garantido ontem, no primeiro debate quinzenal do ano, que «não há plano B» se o estudo de impacto ambiental chumbar a construção do aeroporto do Montijo.
Já no dia da assinatura do documento, Costa tinha sido firme na intervenção que fez. Tão firme que deu a entender que, com estudo ou sem estudo, o Montijo deverá ser a nossa realidade em matéria de expansão da capacidade aeroportuária: «A decisão é esta e há que a pôr em prática».
Com o acordo assinado fica definido que «a ANA investirá 1,15 mil milhões de euros até 2028, incluindo 650 milhões de euros para a primeira fase da extensão do atual aeroporto de Lisboa, e 500 milhões de euros para a abertura de um novo aeroporto civil no Montijo. Já 156 milhões de euros serão investidos para compensar a Força Aérea e melhorar acessos ao Aeroporto Humberto Delgado e ao futuro aeroporto no Montijo».
Sempre com a tónica no argumento de que a discussão sobre um novo aeroporto em Lisboa já dura há 50 anos, todos os intervenientes deixaram claro que já não há margem para outra solução que não seja um aeroporto complementar no Montijo. Mas vamos por partes.
Com o argumento de que construir um aeroporto de raiz levaria anos, o Governo defende esta evolução da base militar para um aeroporto comercial. Como principal continuará o Humberto Delgado, hub (plataforma de ligações aéreas) da TAP. O acordo prevê que as taxas aeroportuárias no Montijo sejam 15% a 20% mais baixas do que as praticadas no aeroporto Humberto Delgado.
Durante muito tempo, chegou a dizer-se que seria um aeroporto low cost, para onde iriam as companhias low cost. Thierry Ligonnière, presidente executivo da ANA-Aeroportos de Portugal, negou: «A segregação não é no modelo económico. O Montijo será um modelo ponto a ponto e não low cost. Terá uma qualidade fantástica de serviço e estará dedicado a companhias dedicadas a ponto a ponto». A verdade é que nem todos ficaram convencidos.
Interessa a quem?
O tema tem merecido a atenção dos portugueses e, ainda que todas as opções sejam sempre amplamente discutidas, esta solução em particular tem levantado questões várias, nomeadamente, as que se ligam a grandes interesses económicos.
Satisfeitos com a decisão estão setores como o comércio, a indústria e o turismo. Aliás, na verdade a solução de um aeroporto complementar no Montijo não podia reunir mais consenso por parte dos agentes económicos. No grupo das empresas que mais interesse têm em ver este projeto ser realidade estão, por exemplo, a Autoeuropa, The Navigator Company, Secil ou Lisnave. Mas não só. É preciso não esquecer a própria Vinci.
Numa opinião, publicada esta semana pelo Jornal i, Joana Mortágua explicava: «A Vinci ganhou a privatização da ANA – Aeroportos de Portugal e, com isso, o monopólio no setor. É a ANA quem manda onde se vai construir o novo aeroporto. Porquê? Porque o governo quer construir uma das infraestruturas mais importantes para o país sem gastar um cêntimo. Aquela que para nós é uma discussão complexa, porque é estratégica para o futuro, para a Vinci é uma conta simples: qual é mais rápido e barato? Montijo».
Mas há mais. Como também Joana Mortágua referiu, «de fora fica o prolongamento do Metro Sul do Tejo, travessias ferroviárias complementares ou a ponte Barreiro-Seixal. Qualquer outro investimento será certamente deixado para negociações pós-nupciais com a Lusoponte, que tem como maior acionista, espante-se, a Vinci. Não foi à toa que as ações da Mota-Engil (concessionária da Lusoponte) subiram 4% nos últimos dias».
Aliás, em agosto do ano passado, era notícia que foi exatamente a certeza de o aeroporto do Montijo ia para a frente que fez com que a Mota-Engil e a Vinci decidissem reforçar na Lusoponte. Os dois grupos aceitaram pagar 23,3 milhões de euros pela parte que a Teixeira Duarte detinha na Lusoponte.
Recorde-se ainda que haverá transformações quando o assunto é a ponte Vasco da Gama. De acordo com o Jornal Económico, o Governo tem em cima da mesa a possibilidade de acrescentar uma faixa a esta estrutura. A ideia é servir o novo aeroporto sem tirar faixas ao transporte que já se faz. Também não está excluída a ideia de implementar um sistema de metropolitano ligeiro.
Os números da Portela + 1
O novo aeroporto do Montijo, que o Governo quer que esteja a funcionar em pleno em 2022, terá 36 posições de estacionamento de aviões. Além disso, está contemplada uma pista de 2400 metros; uma área de controlo de passageiros com 14 balcões e 16 postos automáticos; uma área de check-in com 10 balcões + 20 baggage drop e ainda um edifício central com 101 200 metros quadrados.O resultado da Portela+1 será o aumento dos 38 movimentos por hora (aterragens mais descolagens) para 72 movimentos.