A palavra racismo há muito que deixa espaço para discussões várias. É mais do que uma palavra e a questão é mais do que um tema. Nos últimos dias, em Portugal, esta palavra ganhou a atenção de todos. Os incidentes no bairro da Jamaica, no Seixal, vieram levantar ainda mais questões no debate sobre o tema. Mas afinal o que é o racismo? Nascemos racistas? Somos? Não somos? Ou aprendemos a ser? Questões como estas são já muito antigas e mereceram da parte de muitos uma vida inteira de pesquisa.
Uma das primeiras abordagens, num contexto científico, aconteceu em 1929, com o escritor Bruno Lasker a propor vários métodos para um estudo que achava ser urgente: Em “Race Attitudes in Children” defendia várias formas de analisar a perceção infantil sobre a matéria. E é pouco depois, já nos anos 30, que acontecem duas coisas importantes. Otto Klineberg, psicólogo canadiano, envolve-se numa luta que tinha como objetivo máximo acabar com a desigualdade salarial dos professores negros. À margem deste importante passo, aconteceu um outro. Já no final da década em questão, Kenneth Clark e a mulher, Mamie Phipps Clark, avançaram com uma análise cuja pergunta de partida ficaria na História. Também o nome do casal ficaria nos livros de Psicologia. “Quem ensina uma criança a odiar e a temer pessoas de outra raça?”.
Clark, que conquistou o título de primeiro professor universitário negro e o primeiro negro a assumir a presidência da Associação Americana de Psicologia, criou com a mulher o teste da boneca. Queriam descobrir os efeitos psicológicos da segregação racial nas crianças norte-americanas, em idade escolar.
Bonecas idênticas, exceto na cor, foram entregues a um grupo, com idades compreendidas entre os três e os sete anos. De forma a perceber as atitudes em relação à raça, era pedido que indicassem de que boneca gostavam mais e com qual queriam brincar. Os investigadores decidiram ainda questionar qual era mais bonita e mais feia.
A verdade é que as crianças negras mostravam uma preferência clara pelas bonecas brancas e chegavam mesmo a recusar as negras. De acordo com os investigadores, uma das conclusões era que, no caso dos negros, esta preferência representava um alto grau de rejeição à própria raça. Clark concluiu ainda que os preconceitos formados pelas crianças advinham de valores sociais que as obrigavam a se identificar com determinado grupo. No fundo, para os investigadores ficava claro que escolhiam a boneca branca porque tinham consciência de que a sociedade preferia pessoas de cor branca. “A segregação é a maneira como a sociedade diz a um grupo de seres humanos que eles são inferiores”, referiu Clark.
Já estávamos em 1950 quando o resumo do estudo foi publicado. Importantes conclusões trouxeram o nome de Clark até aos dias de hoje. Por exemplo: Ainda que os pais ou professores não ensinassem os filhos a odiar pessoas de outra raça, muitas vezes, de forma inconsciente, transmitiam atitudes dominantes na sociedade da época.
Clark acabou mesmo por ser uma das figuras importantes do conhecido caso de Linda Brown. O pai tentou inscrevê-la na escola primária mais próxima, mas era reservada a brancos. Foi com este caso, em 1954, que o Tribunal Supremo dos EUA determinou que a segregação racial nas escolas era inconstitucional. Clark foi perito neste caso contra a Junta de Educação de Topeka.
Os anos passaram e os estudos multiplicaram-se. O que dizem os investigadores hoje em dia? E o que dizer da realidade portuguesa em específico? Jorge Vala tem estudado o racismo do ponto de vista da Psicologia Social. Em 2017, dados do European Social Survey mostravam que uma larga percentagem de portugueses acreditavam no racismo. Mas que conclusões temos tirado de várias investigações? Uma pessoa branca leva menos tempo a formar uma opinião sobre um negro do que sobre um branco, afirmou Vala.
Neste mesmo ano, Harvard anunciava um teste onde era possível percebermos se somos ou não racistas. A ideia era revelar o “preconceito implícito”. Mas como é que isto surge? Vários psicólogos defenderam que somos racistas mesmo sem a intenção. Teríamos então o que chamam de “preconceito implícito”. O Teste de Associação Implícita (IAT) foi anunciado como uma forma de identificar então este “preconceito implícito”, traduzido por muitos como visões que alimentamos sem intenção.
Para mostrar que a questão deve ser bem pensada e de forma a desmontar o tema, vários países têm recorrido a campanhas de sensibilização. O Brasil, por exemplo, destacou-se com “Ninguém Nasce Racista”. O desafio foi lançado a várias crianças: Tinham de dizer frases racistas, que estavam num guião, a uma mulher negra que se sentava à frente.
Veja aqui o resultado: