Juan Guaidó regressou à Venezuela e não foi preso. A oposição tinha alertado para a possibilidade de as autoridades deterem o autoproclamado presidente interino quando voltasse ao país, depois de ter violado a ordem do Tribunal Supremo de se ausentar. Quem afinal estava à espera de Guaidó era uma multidão de apoiantes e vários embaixadores acreditados em Caracas.
“Entrámos na Venezuela como cidadãos livres, que ninguém diga o contrário”, disse à chegada, aos jornalistas, o presidente interino reconhecido por mais de 50 países. Minutos mais tarde, na Praça de Las Mercedes, em Caracas, falando à multidão, sublinhou: “Estamos muito mais fortes do que nunca.”
Guaidó estava fora da Venezuela desde o dia 22 de fevereiro, tendo aproveitado para fazer um périplo por vários países que apoiam a sua causa, como Colômbia, Brasil, Argentina, Paraguai e Equador.
“Regresso para fortalecer a pressão interna que permita libertar o nosso país”, sublinhou Guaidó, que manteve a forma de regresso à Venezuela sob segredo até ao último momento (chegou num avião proveniente do Panamá) para evitar a ação judicial: o Tribunal Supremo da Venezuela emitiu uma ordem a proibi-lo explicitamente de sair do país, algo que Guaidó violou a 22 de fevereiro quando atravessou uma ponte fronteiriça com a Colômbia para liderar a entrada da ajuda humanitária, proveniente sobretudo dos EUA, que foi impedida de entrar pelo governo de Nicolás Maduro.
Momentos depois de o autoproclamado presidente ter posto os pés de novo em solo venezuelano, o vice-presidente dos Estados Unidos publicava no Twitter uma advertência explícita ao executivo venezuelano: “Qualquer ameaça, violência ou intimidação contra ele não será tolerada e será respondida rapidamente.” Já John Bolton, o conselheiro nacional de segurança norte-americano, avisara no domingo que se Guaidó fosse impedido de regressar ou fosse detido, haveria uma resposta firme de Washington.
À chegada, numa manifestação na Praça Alfredo Sadel, Guaidó apelou a uma nova mobilização contra o governo no próximo sábado e voltou a instigar os militares a desertarem: “As forças armadas, de que mais estarão à espera? Já viram como mais de 700 oficiais estão do lado da Constituição e andam por aí uns cínicos a dizer que é pouco”, referiu.
Maduro não tinha reagido ainda ao regresso de Guaidó na altura da escrita deste texto, mas a vice-presidente da Venezuela deixou no ar a ideia de que as autoridades se reservam o direito de tomar medidas contra o autoproclamado presidente. “O seu comportamento, as suas atividades serão cuidadosamente analisadas pelas instituições do Estado”, disse Delcy Rodríguez.
“O governo venezuelano possui instituições sólidas e sustentáveis. Tudo isto está contemplado na nossa legislação penal e está contemplado também em tudo o que tem que ver com o marco jurídico das nossas instituições. Dessa maneira, as instituições venezuelanas continuarão a preservar o Estado de direito no país”, acrescentou a vice-presidente numa entrevista ao canal de televisão russo RT.
Delcy Rodríguez encontrou-se no domingo com a presidente da câmara alta do parlamento russo, Valentina Matviyenko, que lhe transmitiu a preocupação de Moscovo quanto à possibilidade de uma intervenção militar dos EUA na Venezuela. Os russos “estão muito preocupados” com a possibilidade de Washington recorrer “a qualquer tipo de provocação para gerar derramamento de sangue e arranjar uma razão e um pretexto para intervir na Venezuela”, afirmou a política, citada pela agência TASS.
A vice-presidente venezuelana tem-se desdobrado em contactos com o governo russo nos últimos dias, nomeadamente com o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, com quem acordou transferir a sede europeia da empresa pública de petróleos venezuelana, a PDVSA, de Lisboa para Moscovo.
Delcy Rodríguez refere que a decisão se prende com o facto de o espaço da União Europeia “não dar garantia de respeito” pelos ativos da Venezuela – “países intolerantes que estão a despojar a Venezuela dos seus ativos”, incluindo Portugal.