Venda de edifício puxa por lucros da Caixa

Alienação de imóvel resultou em 50 milhões de euros de mais-valias para o banco. Comissões também subiram e ultrapassaram os 120 milhões.

O aumento das comissões, a redução da estrutura e, acima de tudo, a venda de um edifício em Lisboa ditaram os resultados da Caixa Geral de Depósitos (CGD) que, no primeiro trimestre, apresentou lucros de 126,1 milhões de euros. Trata-se de um aumento de 85% face aos 68 milhões de euros registados em igual período do ano passado e acaba por refletir a implementação do plano estratégico que tem vindo a ser levado a cabo pelo banco público.

Durante este período, a venda de um edifício na Rua do Ouro, permitiu uma encaixe de 36 milhões de euros, decorrente da mais-valia de 50 milhões de euros. O processo de alienação do imóvel da baixa pombalina arrancou há cerca de um ano e, no entender do presidente executiva da CGD, teve um «desenlace positivo». O comprador foi o grupo de hotéis Sana, que já no ano passado tinha adquirido um quarteirão na mesma rua a outro banco, o Millennium BCP.

A atividade doméstica também foi favorável: apresentou lucros de 86 milhões de euros, enquanto a atividade internacional teve um peso de 40 milhões de euros (BNU Macau: 17 milhões; BCI Moçambique: 8 milhões; Suc. França: 6 milhões; com as restantes operações a totalizarem 9 milhões de euros).

O banco público lembra que estão ainda pendentes da luz verde das autoridades locais as vendas das operações na África do Sul (Mercantile Bank Holdings Limited) e de Espanha (Banco Caixa Geral S.S.). Já as vendas do Banco Caixa Geral – Brasil, S.A. e do Banco Comercial do Atlântico (Cabo Verde) são processos que estão a decorrer, tal como o encerramento da sucursal no Luxemburgo.

Nos primeiros três meses do ano, a margem financeira caiu 2,8% para 283,4 milhões de euros, uma quebra justificada pelo contexto de taxas de juro em mínimos «e o seu impacto na carteira de crédito e de ativos financeiros». Já os resultados em operações financeiras fixaram-se em 13,8 milhões no final de março deste ano, um valor que foi «condicionado pela evolução dos derivados de cobertura de taxa de juro, dada a evolução das taxas de longo prazo», revelou o banco público.

 

Estrutura mais apertada

A instituição financeira liderada por Paulo Macedo registou uma queda de 5% nos custos de estrutura, que totalizaram 278 milhões de euros. Só os custos com pessoal passaram de 203 milhões de euros nos três primeiros meses do ano passado para 189 milhões de euros no primeiro trimestre de 2019. A ideia é continuarem a cair. Para este ano, a Caixa prevê a saída de cerca de 570 trabalhadores: 380 através de reformas e pré-reformas e 290 por rescisão por mútuo acordo ou não renovação de contratos a termo.

A CGD tinha no final de março 7.627 trabalhadores na operação em Portugal, menos 48 do que no final de 2018. Em relação aos balcões contava com 520, menos dois do que no final do ano passado.

No âmbito do processo de recapitalização acordada em 2016 com a Comissão Europeia, de quase 5.000 milhões de euros (dos quais 2.500 milhões de injeção direta do Estado), a CGD iniciou um processo de reestruturação que previa um corte de 2.200 trabalhadores até 2020, que já resultou na saída por mútuo acordo de 547 pessoas em 2017 e de 646 trabalhadores em 2018. Ainda assim, é preciso manter o plano de saída em marcha para este ano e para o próximo para cumprir os objetivos acordados com Bruxelas.

 

Comissões sobem

As comissões subiram 4,8% relativamente a igual período do ano passado, para 120,2 milhões de euros, traduzindo-se num aumento de 5,5 milhões de euros. Aliás, a subida de comissões e fins de isenções para alguns clientes pela CGD provocou, nos últimos dois anos, muita polémica, tendo Paulo Macedo defendido por várias vezes que o banco precisa de aumentar proveitos e reduzir custos para melhorar a sua rentabilidade, sob pena de ter de pedir mais dinheiro ao Estado.

Já esta semana, durante a apresentação de resultados, Macedo voltou a referir que «quando se diz que não deve haver comissões sobre contas à ordem [essas contas] têm os encargos da estrutura dos bancos [trabalhadores, sistema informático], têm este encargo [custos regulatórios], que tem um valor sem precedentes, e têm um terceiro encargo, que é pagar o excesso de liquidez que é aplicado no BCE», considerando que são «encargos que não têm qualquer comparação com o que existia há três, cinco ou sete anos».

O produto bancário subiu mais de 4% para 455,9 milhões de euros nos primeiros três meses do ano, enquanto a carteira de crédito a clientes totalizou 50.905 milhões de euros em termos líquidos, o equivalente a uma redução de 4,6% face ao final de março do ano passado. Os depósitos de clientes aumentaram 3317 milhões de euros (+5,4%) quando comparados com o mesmo período de 2018, uma «evolução essencialmente justificada pela captação da CGD Portugal».

No mesmo período, o montante de crédito malparado (NPL) reduziu-se em 2,4 mil milhões de euros: «Além das vendas de carteiras assistiu-se a uma evolução positiva nas componentes de curas e recuperações». O rácio de NPL atingiu os 7,8% no final do primeiro trimestre.

Ainda esta semana foi confirmado que a instituição financeira já tem luz verde por parte do Banco de Portugal, Banco Central Europeu e Direção-geral da Concorrência para distribuir 59% dos lucros de 2018, ou seja, 200 milhões de euros, ao Estado na forma dividendos.

A última vez que o banco público pagou dividendos foi em 2010 e vai ao encontro do que Paulo Macedo garantiu em outubro passado: o banco quer devolver dinheiro aos contribuintes, considerando essa a «sua obrigação».

 

Eventuais processos só depois do verão

Paulo Macedo garantiu ainda que eventuais processos sobre ex-gestores só avançarão depois do verão e repetiu a ideia de que o banco não fará o papel dos tribunais. «Antes do verão, não nos parece. Volto a lembrar que o Ministério Público está com isto há dois anos e meio, o Banco de Portugal está com isto há anos», disse na conferência de imprensa.

O presidente do banco público voltou a garantir que «não é juiz nem tribunal» e portanto não se comportará como tal face a ex-gestores. No seu entender, a comissão parlamentar de inquérito (CPI) à Caixa Geral de Depósitos está a afetar a reputação do banco, e «os mais entusiastas são os nossos concorrentes e os ressabiados».

Macedo não tem dúvidas de que esse processo acabou por afetar o negócio, uma vez que a Caixa teve de dar «prioridade a este tipo de informação em vez de nos mantermos focados no negócio» – isto sem esquecer que a instituição financeira tem sido alvo nos últimos anos de muitas auditorias e inspeções, entre outros escrutínios.

Macedo indicou ainda que as três sociedades de advogados que têm este processo em mãos são a Vieira de Almeida, a Linklaters (ambas já conhecidas) e ainda a Serra Lopes. Em fevereiro, Macedo avisara que a CGD precisava de pelo menos três sociedades de advogados para avaliar processos de responsabilidade civil sobre ex-gestores, devido à existência de conflitos de interesses.