«Às vezes alguém cria uma grande impressão por ter dito alguma coisa, e às vezes alguém cria uma impressão igualmente grande ficando calado».
Dalai Lama
A politização do fenómeno migratório tem vindo a aumentar nos últimos anos. Em Portugal e na Europa. Se, de início, era positivo que assim fosse, atualmente começa a ser mais negativo do que positivo. Ou seja, tira serenidade e solidez aos políticos para criarem, construírem, solidificarem e concretizarem verdadeiras ‘políticas públicas (e comunitárias, no caso europeu) de imigração.
O ‘excesso de politização da imigração’, quer em Portugal, quer na Europa, alimenta infelizmente muitas vezes perceções erradas, impondo respostas ‘a quente’, pouco maturadas, para problemas muito complexos e de respostas difíceis.
A imigração é um fenómeno metajurídico, que não pode ser visto isoladamente.
Que não se pode sintetizar em poucos minutos de telejornais e chamadas de primeira página de jornais e revistas, com fotos bombásticas.
As sociedades contemporâneas, plurais e inclusivas, têm de lidar com o fenómeno migratório com mais razão do que com mais emoção.
Não devemos olhar para a imigração como um problema, mas sim como uma oportunidade. Não podemos reduzir a imigração ao ‘efeito chamada’ ou ao ‘efeito papão’. As coisas não são assim. Não podem ser assim. A preto e branco.
O fenómeno das migrações (da dupla vertente da imigração e da emigração) deve ser visto e interpretado numa perspetiva integrada. E comparada. Politicamente, socialmente, economicamente, religiosamente, historicamente e até antropologicamente. Os cada vez mais muros que infelizmente nos separam não são a solução. Antes são uma ilusão passageira. Mais não são do que, em muitos casos, gasolina para semear novos fogos de proporções inimagináveis.
O século XX foi o século do povo. O século XXI é – e será cada vez mais – o século do movimento dos povos. Dos mais de sete mil milhões de pessoas que o mundo tem nos seus quase duzentos países, a priorização às políticas nacionais e supranacionais das migrações é uma necessidade num mundo progressivamente mais aberto, em que a velocidade da informação (e de circulação de capitais) é avassaladora.
A gestão dos fluxos migratórios, quer nacionais, quer continentais, quer intercontinentais e mundiais, é um desafio que tem de ser enfrentado mais com base na realidade e menos em perceções gerais erradas. O mundo dispõe já nestas matérias de alguns instrumentos para a regulação das migrações. As Nações Unidas e a OIM (Organização Internacional das Migrações), por sinal ambas lideradas por dois portugueses, têm muito trabalho para fazer.
O direito internacional humanitário tem ainda um longo caminho à sua frente. A Europa parece estar bloqueada por divisões insanáveis nesta matéria. Prisioneira de setores populistas, nacionalistas, racistas e de extrema-direita, por um lado, cercada pela extrema-esquerda, que se alimenta do laicismo radical e de soluções demagógicas, por outro.
O futuro da Europa e dos europeus depende de como souberem tratar o fenómeno migratório. Não será com arruadas mediáticas do tipo ‘Je suis Charlie’ que se conseguirá o equilíbrio nestas matérias. O que se passa na bacia do Mediterrâneo Ocidental é uma vergonha para nós europeus. O mesmo se deve dizer em relação à fronteira Leste, sobretudo em países como a Hungria e a Áustria. A política de imigração na Europa tem sido má para todos: europeus, refugiados, asilados e imigrantes.
Em Portugal soubemos durante quase duas décadas fazer a diferença pela positiva. Como referi sucessivamente, quando tive a oportunidade de servir Portugal e os portugueses no Governo com responsabilidades nestas matérias, «não há uma fórmula de esquerda ou de direita de ultrapassar e de resolver as expectativas e os problemas nestas áreas. Ou se resolvem ou não se resolvem. Com realismo e defesa dos superiores interesses do país e dos portugueses. Estudando, comparando, decidindo. Fugindo a perceções erradas e alimentadas muitas vezes mediaticamente, que não conformes minimamente à realidade». Disse-o várias vezes. E mantenho-o. O caso português está aí para o comprovar. Para um país como o nosso. Um país de migrantes: emigrantes e imigrantes.
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