«Só se pode alcançar um grande êxito quando nos mantemos fieis a nós mesmos»
Friedrich Nietzsche
Portugal, com muitos séculos de história enquanto território, povo e comunidade politica, tem tido muitos heróis decisivos para a sua independência, para a sua identidade, para a sua afirmação histórica, cultural e política.
Noutros países, os heróis mereceram e merecem reconhecimento e são frequentemente recordados como figuras incontornáveis da época em que viveram — mas também são reconhecidos, recordados e enaltecidos na contemporaneidade como bons exemplos. Em Portugal, pelo contrário, vivemos há alguns anos numa espécie de nebulosa – e nalguns casos, até, de esquecimento propositado – em relação ao passado, no que diz respeito a pessoas e a factos.
Sabemos e sentimos todos os dias que, nas sociedades contemporâneas, vivemos num tempo mediático e coletivo em que não se respeita o silêncio, a memória e muitos outros valores que durante anos foram fundamentais para o cimento das nossas vidas coletivas e individuais. No tempo da sociedade do ‘homo comunicatus’, da sociedade aberta, vivemos quase em tudo das nossas vidas em ‘diretos’ permanentes.
Nos últimos anos, passámos da assistência a competições desportivas em direto ao tempo em que assistimos (e, cada vez mais, provocamos…) a guerras em direto, catástrofes em direto, etc.
Nessa espécie de modo de vida em direto – e de se viver muito com base no que se diz e acontece a uma velocidade alucinante – não se dá o valor devido à memória, ao passado e ao que sucede fora da volúpia mediática. `
Aliás, recentemente, uma figura pública (e muito mediática…), referindo-se ao que considera serem alguns males da sociedade dos nossos dias, dizia – e bem – que «conseguimos colocar na cabeça da maioria das pessoas que tudo o que tenha mais do que um ou dois anos é o limite […] para fixar factos e acontecimentos, sobretudo positivos».
Neste quadro complexo e de grande exigência para ‘furar’ o império de algumas corporações que se alimentam e vivem ‘nos’ e ‘dos’ media, não faz sentido a resignação e até o alheamento dos ‘válidos’ de várias áreas das nossas vidas.
Tendo Portugal a história que tem e os heróis que tem tido, faz todo o sentido criar condições para, em nome da projeção de um futuro diferente, os enaltecermos, mostrarmos a sua importância para a identidade coletiva e para os principais sentimentos de pertença – pilares da nossa consciência nacional.
Heróis como Nuno Álvares Pereira – ou, melhor dizendo, Nun’Álvares –, o nobre que se tornou condestável e se fez mais tarde monge, é um grande exemplo. Herói da independência nos finais do século XIV, figura determinante para o despontar da consciência nacional, que liderou a ‘luta’ de um povo contra a tentativa de hegemonia estrangeira. Uma figura da nossa história que representa para nós, portugueses, idealismo e heroísmo.
Foi com Nun’Álvares que um povo se levantou e lutou. Foi com ele que esse povo foi vencedor e que uma nação consolidou a sua independência. Tudo começou em 1383 com Portugal a enfrentar a sua primeira grande crise desde a independência. Com o terminar da dinastia afonsina, provocada pela morte do Rei D. Fernando. Com a sucessão a poder recair na sua filha D. Beatriz, casada com o Rei de Castela D. João. Com a alta nobreza a defender a legitimidade de D. Beatriz. E o clero, alguma nobreza, parte da burguesia e a chamada ‘arraia miúda’, o povo, a defender D. João mestre da Ordem Militar de Avis, primo do monarca falecido, como sucessor do Rei D. Fernando.
Com a aclamação de D. Beatriz como rainha de Portugal, a revolta foi grande. E de entre os revoltosos destacou-se D. Nuno Álvares Pereira, jovem fascinado pelo desporto medievo de cavalaria e admirador dos feitos da Távola Redonda. A sua vida transformou-o numa das mais relevantes figuras da história de Portugal. A ele devemos muito. A independência. Muita da nossa consciência nacional. A sua vida é uma lição de coragem, consciência, coerência, força, vitória e desprendimento. Nos últimos anos da sua vida, o seu desprendimento é um dos exemplos do que foi, é e será sempre um dos melhores de todos nós.
É por isso que todos devemos ver nele – e noutros como ele – um exemplo a seguir. E que não devemos deixar de dar a Portugal, aos portugueses, à Europa e aos europeus o seu bom exemplo. À semelhança do que outros países e povos têm feito. Formas de o fazer não faltam. Mas haveremos de voltar ao tema.