‘Prédio Coutinho’ Símbolo da prepotência do Estado e da inutilidade do jornalismo

Não me lembro de alguma vez ter assistido, no meu país, nem sequer durante a ditadura, a uma demonstração de despotismo absoluto como esta parece ser – e, no entanto, não me apercebo de que alguém, no espaço público, tenha chamado a atenção e, ainda menos, que se haja revoltado ou indignado perante esta situação-limite…

Há mais de 40 anos foi construído, em Viana do Castelo, um prédio urbano de 13 pisos e com mais de 100 apartamentos, a maior parte dos quais foram entretanto adquiridos por múltiplos cidadãos, para aí residirem.

Longe de ser uma edificação clandestina feita à socapa, o dito prédio, antes de poder ser construído (aliás num local bem visível e central da cidade), teve de obedecer a todos os critérios, regulamentos e licenças da respectiva câmara municipal, que o terá aprovado.

Ora, apesar de tudo isto se ter passado às claras e de forma legal, o país tem assistido, desde há anos, a sinais sucessivos de um complexo (e kafkiano) processo judicial em que determinadas entidades estatais, baseadas unicamente em meras “justificações estéticas”, tentam, persistentemente, levar por diante a única solução que, para elas, é compatível com o interesse geral: a demolição total do prédio, mesmo que à custa do despejo, imposto pela força ou pela ‘asfixia’ (o prédio já deixou, esta semana, de ter fornecimento de água e electricidade) das pessoas que nele residem e desejam continuar a residir.

Para meu espanto e horror (pois não pensava viver num país cujo regime fosse a tal ponto arbitrário, despótico e desrespeitador dos direitos individuais mais básicos), as decisões dos tribunais, tanto quanto julgo saber, têm dado razão a quem pretende destruir o prédio, e não a quem nele habita pacificamente após ter comprado a sua casa.

Não me lembro de alguma vez ter assistido, no meu país, nem sequer durante a ditadura, a uma demonstração de despotismo absoluto como esta parece ser – e, no entanto, não me apercebo de que alguém, no espaço público, tenha chamado a atenção e, ainda menos, que se haja revoltado ou indignado perante esta situação-limite de violência injustificada.  

É como se os meus concidadãos, e a comunicação social em particular, tivessem chegado à conclusão de que, quando no país quem manda é um animal feroz ou um habilidoso-mor, só é possível sobreviver sem danos desde que se fique quieto e muito caladinho – pois, como se vê, passou a existir entre nós um risco real, que pode ir até ao extermínio.