Tem 46 anos e iniciou o percurso académico na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde se licenciou em Linguística. Prosseguiu estudos na Universidade de Leiden, na Holanda, na mesma área de especialização, onde concluiu o doutoramento. É professor catedrático na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Diretor desta última instituição até novembro de 2015 e também presidente do Conselho Científico das Ciências Sociais e Humanidades da Fundação para a Ciência e Tecnologia, já passou por outros cargos como o de membro do Conselho Científico do Plano Nacional de Leitura. João Costa, secretário de Estado da Educação do Governo de António Costa há quatro anos, esteve à conversa com o i sobre o panorama da educação em Portugal.
Em termos gerais, como descreveria o panorama educacional português?
Portugal tem uma evolução, na educação, admirável. Temos 45 anos de escola democrática e o que foi conseguido é muito, embora por vezes não tenhamos noção disso. Estamos sempre a falar mal das escolas, dos professores, dos alunos e dos pais, mas as taxas de escolarização, alfabetização, insucesso escolar e abandono precoce têm evoluído de forma notável. Temos muitas conquistas: basta ver que, por exemplo, hoje, as taxas de frequência dos ensinos secundário e superior são extremamente mais elevadas do que antes do 25 de Abril. Temos, contudo, ainda questões para resolver e uma delas é o facto de sermos um dos países onde os alunos reprovam mais: o cerne da questão não é a retenção por si só, mas sim o facto de esta estar associada à condição socioeconómica dos alunos. Ou seja, o insucesso escolar é um problema de justiça social porque já respondemos bem aos mais favorecidos e não encontrámos resposta para aqueles que mais precisam da escola.
Do ano letivo de 2010-2011 até agora perderam-se cerca de 175 mil alunos em todos os níveis de escolaridade. Por exemplo, há menos 43 mil crianças nos jardins-de-infância. Isto deve-se às alterações demográficas?
Sim, essencialmente. Temos uma demografia muito deprimida, um problema sério para o país, e um dos eixos principais do programa eleitoral do PS é esse mesmo: centrar a ação política na questão demográfica.
No âmbito do programa “Gratuitidade dos Manuais Escolares” foram emitidos 2,8 milhões de vales para que os alunos dos 1º e 2º ciclos tivessem acesso a manuais, sendo apenas 107 mil livros reutilizados. A sustentabilidade do programa está em causa pela fraca reutilização?
Sempre foi afirmado pelo Governo que a gratuitidade tem de estar associada à reutilização. A minha colega Alexandra Leitão [secretária de Estado Adjunta e da Educação] tem dito várias vezes que a reutilização é um caminho a trilhar. Não há esta tradição, mas temos de pensar que não falamos apenas de sustentabilidade financeira, mas sim ambiental. Se pensarmos que temos uma média de seis manuais por aluno num país que não reutiliza, isto significa, anualmente, mais de seis milhões de livros deitados ao lixo. Num momento em que todos dizemos estar preocupados com as alterações climáticas e o ambiente, a reutilização é um dever civilizacional.
Muitos pais queixam-se de serem obrigados a apagar aquilo que os filhos escreveram nos manuais e de terem de pagar pelos livros porque supostamente estão em mau estado. O que não está a funcionar bem?
Existe um compromisso da reutilização: para eu receber um voucher, tenho de garantir que o aluno que receberá os livros no ano seguinte os terá em bom estado. Quanto à obrigatoriedade, as soluções são muito diversas: em alguns casos, são os próprios alunos que, no final do ano letivo, numa atividade ligada à cidadania, fazem este trabalho. Noutros casos, são os pais ou outros adultos. Colocar a questão em termos de obrigatoriedade é o mesmo que questionar se somos obrigados a separar o lixo e a reciclar: sim, somos, civicamente. Este ato compromete-nos a todos.