O investimento chinês em Portugal tem vindo a ser reforçado nos últimos anos. Os setores da energia, banca, seguros e saúde estão em destaque, mas há mais áreas onde os chineses investem. O mais recente exemplo aconteceu esta semana, com o Novo Banco a vender o Monte do Pasto a investidores chineses.
A compra foi formalizada em Lisboa pelo grupo CESLAsia, através das suas subsidiárias Focus Platform e Focus Agriculture, numa transação globalmente avaliada em 37,5 milhões de euros. «Trata-se de uma aquisição significativa de importantes capacidades de gestão e operações em Portugal, com integração no CESL Asia da equipa do Monte do Pasto, além de um ativo que compreende 3700 hectares de terras agrícolas, usadas principalmente como pastagens, mas que pode ser desenvolvido e valorizado por meio de atividades agrícolas adicionais», explicou o grupo em comunicado.
Mas há muito mais áreas onde os chineses investem e esta última aposta mostra que a tendência é para continuar. O maior peso foi à boleia das privatizações, durante o período da troika. Com milhares de milhões de euros aplicados em Portugal, a aposta não ficará por aqui, já que são visíveis manifestações de interesse na compra das mais diversas atividades, quer na totalidade quer de forma parcial.
Energia
A privatização da EDP foi a primeira paragem de uma viagem que já vai longa no que diz respeito às relações comerciais entre Portugal e China. A venda da EDP à China Three Gorges (CTG) foi feita no início do mandato do anterior Governo e no arranque do programa da troika, quando a perceção de país resgatado se impunha nos mercados financeiros. Nessa altura, a gigante chinesa pagou 2690 milhões de euros por 21,35% do capital da elétrica nacional, mas ao longo dos anos foi reforçando posição. Em 2018, o acionista chinês lançou uma oferta de aquisição pública (OPA) à EDP mas, quase um ano depois, a operação chegou ao fim com um resultado que já era esperado: os acionistas da empresa chumbaram a alteração dos estatutos para acabar com a limitação dos direitos de voto a 25% do capital – a proposta foi rejeitada com 56,6% do capital representado –, pondo fim à operação. António Mexia garantiu, na altura, estar tranquilo com o futuro da elétrica.
A par da EDP, também a REN chamou a atenção dos investidores chineses. Em fevereiro de 2012 foi a vez da venda da REN, com os chineses da State Grid a ficarem com 25% do capital, pagando 387 milhões de euros pela posição na empresa gestora das redes energéticas nacionais.
Seguros
Foi através do mercado segurador que os chineses da Fosun se estrearam em Portugal. A empresa pagou mil milhões de euros por 30% do mercado segurador português (Fidelidade e Multicare), mas o encaixe total ascendeu a quase 1209 milhões de euros, em resultado da distribuição prévia de dividendos de 208,9 milhões de euros. Esta venda representou a terceira privatização realizada pelo Executivo liderado por Pedro Passos Coelho. E na base desta decisão esteve o facto de os chineses se mostrarem mais flexíveis para serem parceiros da CGD na Caixa Seguros, dado que o banco público português se mantém, com uma posição de 15%, no capital da holding dominada pela Fosun. Aliás, uma das imposições do contrato que esteve a ser negociado dava ao adquirente da Caixa Seguros (e ao vendedor, a CGD) exclusividade mútua, por 25 anos, na comercialização dos produtos da Fidelidade aos balcões do banco estatal.
A Fosun prometeu também que o grupo chinês iria expandir as operações da Caixa Seguros na China e noutros mercados asiáticos.
Saúde
Foi na saúde que a Fosun expandiu a sua presença em Portugal ao adquirir o grupo Espírito Santo Saúde. A marca ES Saúde chegou mais tarde ao fim, com o processo de venda à Tranquilidade, mas passou a designar-se Luz Saúde. A seguradora detida pela chinesa Fosun comprou 96% da empresa na sequência da oferta pública de aquisição que lançou à dona do Hospital da Luz. Com este negócio, a seguradora pretendia ter uma visão mais integrada, mais global dos clientes e, ao mesmo tempo, alargar as soluções, pois detinha a Multicare e isso iria permitir aumentar o número de clientes abrangidos.
Banca
Este é um dos setores que mais atraem os investidores chineses para Portugal. O primeiro grande negócio protagonizado pelos chineses nesta área em Portugal foi a compra do BESI, banco de investimento do universo Espírito Santo, por parte da Haitong. A operação teve um custo de 379 milhões de euros e o banco passou a designar-se Haitong Bank. O grupo não escondeu as grandes ambições de expansão que trazia com este negócio e a Haitong entrou depois na Europa e na América.
Mais tarde, a Fosun voltou a investir na banca, desta vez com o BCP: o grupo pagou 175 milhões de euros por 16,7% do capital da instituição financeira. A operação foi concretizada através de um aumento de capital e, no ano passado, reforçou a sua posição para 27%. Atualmente, a sua participação é de 27,25%, continuando assim a ser a maior acionista do BCP.
Tecnologia
A marca chinesa Huawei é uma das marcas tecnológicas mais usadas pelos portugueses, principalmente pela sua relação qualidade/preço. Em 2012, a marca abriu um centro tecnológico em Lisboa, num investimento de cerca de 10 milhões de euros. A aposta foi ainda reforçada com um centro de inovação e experimentação de produtos. Ainda este ano, o diretor comercial da área de consumo da Huawei Portugal, Tiago Flores, prometeu que a multinacional vai continuar a promover a tecnologia 5G «de forma ativa» no nosso país.
A única área que foi alvo de desinvestimento foi a aviação. A chinesa HNA, a maior companhia aérea privada chinesa e acionista da companhia aérea Azul, comprou 9% da TAP, mas acabou por vender esta participação em março deste ano.
A verdade é que as apostas poderão não ficar por aqui. Em abril deste ano, o ministro dos Negócios Estrangeiros português garantiu que Portugal quer consolidar as relações económicas com a China no quadro da União Europeia e considerou que este cria «condições muito promissoras» para novo investimento chinês em Portugal.
Augusto Santos Silva deu o turismo como um exemplo desses investimentos, considerando esta área como «absolutamente decisiva».
Importações e exportações
Outro campo importante desta aposta diz respeito à balança comercial entre os dois países. Os dados do INE a que o SOL teve acesso são claros: nos primeiros sete meses deste ano, as exportações de bens portugueses para Pequim ascenderam a quase 354 milhões de euros, menos 35 milhões quando comparado com igual período do ano passado. Mas as importações apresentam números bem superiores. De janeiro a julho deste ano, as importações ascenderam a 1,7 mil milhões de euros, um valor que é superior ao registado em igual período do ano passado: 1,3 mil milhões.
Quanto aos produtos que lideram a lista de exportações, o destaque vai para produtos minerais, com quase 59 milhões de euros. Mas não só. Seguem-se as pastas de madeira ou de outras matérias fibrosas celulósicas, papel ou cartão para reciclar e papel, com um valor a chegar aos quase 50 milhões. Em ambos os casos, o valor é consideravelmente superior ao gasto em igual período do ano passado.
Do lado das importações, é nas máquinas e aparelhos, material elétrico e suas partes, aparelhos de gravação ou reprodução de som e imagem, suas partes e acessórios que é gasto mais dinheiro: quase 691 milhões – um valor superior em quase 200 milhões quando comparado com os primeiros sete meses de 2018.
Seguem-se as matérias têxteis e suas obras, com quase 197 milhões, um valor que também neste bem é inferior ao período homólogo, altura em que foram gastos mais de 89 milhões.