“Olhe, estão aqui jornalistas italianos para verem o que é um país com estabilidade", disse aos repórteres o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, após sairem os resultados à boca de urna – apontando para uma vitória do PS nestas legislativas. Talvez o "arquiteto da Geringonça" se referisse ao correspondente em Lisboa do La Reppublica, que escreveu: "As sondagens recompensaram os três partidos da Geringonça". A explicação dada pelo jornal italiano é o facto do Governo ter tirado Portugal da crise, devido a "uma política que cancelou algumas das medidas impostas pela Troika, sem estragar – graças à excelente situação económica e o boom do turismo – o equilibrio orçamental". Itália observa com interesse a estabilidade do Governo português, dado que o seu próprio Governo também é uma aliança inaudita – neste caso entre os sociais-liberais do Partido Democrático e os populistas do Movimento 5 Estrelas. Mas, para além de Itália, um pouco por todo o mundo, muitos estiveram atentos às eleições portuguesas.
Mesmo aqui ao lado, em Espanha, o 'milagre português' é uma discussão recorrente e já serviu de exemplo. Recentemente, os esquerdistas Unidas Podemos tentaram-se coligar com os socialistas do PSOE – sem sucesso. O líder do PSOE, Pedro Sánchez, gostou tanto do modelo português que queria a sua própria Geringonça – ou seja, ter o apoio da esquerda sem a ter no Governo. Mas Sánchez não se conseguiu entender com o Unidas Podemos, que queria um Governo de coligação, com direito a ministros.
Olhando para a campanha eleitoral portuguesa, os vários jornais espanhóis focaram-se em aspetos diferentes. O El País salientou que a Geringonça "não vacilou sequer com a onda de greves que abalou o país no último ano", explicando que "aos camionistas aplicaram o estado de 'alarme nacional', a greve de enfermeiros dos blocos operatórios foi anulada por decreto lei e as restantes ignoradas". Já o El Mundo deu grande destaque ao choque entre António Costa e um idoso, descrevendo-o como "um assunto viral que dominou a cobertura da campanha". E salientou: "Os analistas políticos vêm como provável que o confronto resulte em danos para a imagem de Costa".
"Vitória sim; maioria absoluta não", escreveu o El País após serem divulgadas as sondagens à boca de urna. Para o jornal espanhol, o resultado significou uma "clara vitória do primeiro-ministro António Costa" e um "descalabro da direita". Já o El Mundo viu na ausência de uma maioria absoluta um sinal de que "o relato do 'milagre português' não parece ter convencido uma parte substâncial do eleitorado, que vive uma realidade pouco utópica em terras lusas". Ou seja, "se bem que se registou uma melhoria financeira", muitos lamentam "a continuidade dos cortes nos serviços públicos, a carga fiscal de 35% e a bolha imobiliária provocada pelo boom do turismo".
Estabilidade política
Se em Portugal se salientou a fragmentação do espectro partidário – com o crescimento do PAN e do Livre e o surgimento do Chega e da Iniciativa Liberal – o resto da Europa ficou surpresa com coesão dos partidos tradicionais em Portugal. "Por toda a União Europeia, novos partidos radicais estão a reconfigurar o cenário político, enquanto os partidos socialistas tradicionais perdem terreno. Mas esse não é o caso em Portugal", notou a Euronews. O canal referia-se às brutais perdas eleitorais de partidos como o PASOK na Grécia, o PSF em França ou o Partido Trabalhista holandês, após aplicarem programas de austeridade. Enquanto isso, António Costa "conseguiu desde 2015 virar a página da austeridade, sem renunciar a uma disciplina orçamental estrita" lê-se no Libération.
Extrema-direita
“Nada de populistas barulhentos, nenhum grupo de extrema-direita em ascensão, um Partido Socialista liberal que dá as boas vindas aos imigrantes… as eleições legislativas portugueses, este fim-de-semana, fazem do país um caso isolado na Europa”, escreveu há dois dias a Associated Press. Os resultados à boca de urna confirmam o prognóstico da agência norte-americana, dando ao PNR menos de 1% e ao Chega no máximo um deputado. “A imigração nem sequer é um assunto eleitoral”, lê-se. Uma das explicação dadas foi que “nos últimos 50 anos os portugueses emigraram em massa, tornando-os sensíveis à maneira como os migrantes são tratados”. Mas também foi notado que "a vaga de imigrantes para a UE praticamente passou ao lado de Portugal".
Do outro lado do Atlântico, no Brasil, em pleno mandato do Presidente Jair Bolsonaro, a Veja noticiava que "sem risco de eleger a extrema-direita, Portugal vai às urnas". Já a G1 concordou que "Portugal é um dos únicos países europeus onde a extrema-direita não ganha espaço".