Nuno Artur Silva pode voltar a ficar com Produções Fictícias

Caso os compradores não paguem no prazo de dois anos, o negócio poderá acabar revertido.

O prometido foi cumprido. Nuno Artur Silva toma posse este sábado como Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media, já afastado das Produções Fictícias, empresa que fundou há 26 anos.

No entanto, o agora membro do Governo pode não ficar afastado da produtora de conteúdos durante muito tempo. Nuno Artur Silva deu um prazo de dois anos aos compradores para pagarem as quotas agora cedidas – a sua participação, de 150 mil euros, e uma participação de 30 mil da Seems SGPS, gerida pela sua mulher. Caso os compradores não paguem essas quotas, o negócio pode ser revertido.

 O SOL tentou obter uma reação de Nuno Artur Silva à possibilidade de reversão do negócio mas não obteve resposta até ao fecho desta edição.

O contrato de venda foi celebrado a 18 de outubro. Nuno Artur Silva acabou por vender a sua participação ao sobrinho, André Caldeira. A empresa poderá fazer negócios com o Estado ou empresas públicas, dado que este grau de parentesco não levanta qualquer problema à luz do regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, que apenas impede empresas geridas pelos próprios ou em conjunto com familiares diretos de um membro do Governo de realizarem negócios com o Estado. Ainda assim, o novo secretário de Estado não poderá participar em qualquer decisão relacionada com a contratação da empresa, dado que a lei determina que os membros do Governo não podem intervir na negociação, celebração e execução de procedimentos de contratação pública entre o Estado e as empresas por si detidas nos últimos três anos». Numa nota enviada ao SOL, Nuno Artur Silva salientou que, «considerando que a RTP e a Lusa são entidades do setor empresarial do Estado, o futuro Secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Média não irá intervir nas decisões relativas à negociação, celebração e execução de contratos referentes à programação e conteúdos das mesmas». Tais decisões, acrescenta, competem aos conselhos de administração de ambas. Como tal, conclui, «não se verificam quaisquer incompatibilidades e impedimentos ao exercício do cargo».

 

Dúvidas

No dia em que foi anunciado o negócio, João Paulo Batalha, presidente da associação Transparência e Integridade, defendeu ao jornal i que a venda a pessoas de confiança pode não afastar por completo conflitos de interesse: «Estar a vender a amigos, ou no caso, a familiares, nada impede que venha a readquirir a participação». Segundo Batalha, existe o risco, «teórico com certeza, mas um risco» de fazer «políticas públicas que beneficiem a empresa direta ou indiretamente». O responsável defende que a lei portuguesa ainda não tem mecanismos preventivos mais robustos como o blind trust, que obriga os titulares de cargos políticos a entregarem a gestão dos seus bens a um fundo ‘cego’, passando a ser administrados por alguém que não conhece. «Poderia ser um mecanismo mais útil do que a venda, que sendo uma tentativa de afastar o conflito de interesses, não é o suficiente», disse Batalha, destacando ainda assim o esforço na venda da participação: «Tivemos situações no passado em que nem sequer isto se fazia».