Anda por aí uma verdadeira histeria à volta de André Ventura.
Os comentadores falam dele em termos exaltados.
Os cartoonistas transformam o seu corpo de braços abertos numa cruz nazi.
Os debates fazem dele o centro das atenções e comparam-no a Hitler, dizendo que quer expulsar os negros de Portugal como o führer expulsou os judeus da Alemanha.
Há petições para o expulsarem do Parlamento.
Só falta dizer que vêm aí os campos de concentração.
Tudo isto começou numa piadola de mau gosto escrita por Ventura no Facebook.
Segundo as notícias, Ventura teria proposto que a deputada Joacine Katar Moreira fosse ‘deportada para o seu país’.
Ora, não foi bem isto o que ele disse.
Reagindo a uma proposta de Joacine para que fossem inventariados os bens ‘roubados’ pelos portugueses nas ex-colónias, para se proceder à sua devolução, Ventura escreveu qualquer coisa como: «Já agora, com esses bens, também pode ir a Joacine».
Isto é muito diferente de uma ‘proposta de deportação’.
E – adiante-se – Joacine ‘pôs-se a jeito’ quando festejou a eleição para o Parlamento português com uma bandeira da… Guiné-Bissau.
O curioso no meio desta histeria é que André Ventura é um deputado entre 230.
Ou seja, representa 0,4% do conjunto dos deputados; nem chega sequer a 1%.
É caso para dizer: o que andam lá a fazer os outros 229 deputados?
Não têm as mesmas armas que ele?
O próprio presidente da Assembleia, Ferro Rodrigues, mostra-se desorientado e não sabe lidar com o fenómeno.
Num dia manda calar Ventura por ele insistir na palavra «vergonha», mas, no dia seguinte, faz o contrário e aconselha os outros partidos a não reagirem às suas ‘provocações’, para não lhe darem ‘palco’.
Foi o que aconteceu quando convenceu os líderes parlamentares a não avançarem com um ‘voto de indignação’ contraVentura por causa das declarações sobre Joacine.
Toda esta loucura à volta de André Ventura, todas estas acusações de que é de extrema-direita, xenófobo, racista, fascista, nazi, estão a ter uma consequência óbvia: a banalização do racismo e, até, do nazismo, (lagarto, lagarto!).
À força de se dizer que Ventura quer expulsar os ‘pretos’, à força de o comparar a Hitler, de o transformar em cruz gamada, as pessoas menos avisadas ficam confusas: mas o racismo é isto?
Mas o nazismo era assim?
Hitler era igual a André Ventura?
O partido nazi era igual ao Chega?
Então, não era tão mau como dizem…
E esta confusão é tanto maior quanto é certo que, muitas vezes, Ventura limita-se a dizer o que para muitos é evidente.
Ele diz no Parlamento o que muita gente diz em casa.
Não acredito que todos os portugueses concordem com a devolução do património trazido das ex-colónias.
Não acredito que todos os portugueses concordem com o permanente exercício de autoflagelação em relação aos Descobrimentos e à colonização portuguesa.
Não acredito, noutro plano, que todos os portugueses concordem com o facto de o Estado pagar as operações de mudança de sexo.
Ou com o ensino da ‘ideologia de género’ a crianças de dez anos.
André Ventura limita-se, muitas vezes, a ser a voz dessa gente discordante.
Portanto, antes de os comentadores, os analistas, os cartoonistas, os outros deputados o atacarem, deviam fazer a pergunta básica: por que é que ele suscita tanta polémica e tantas adesões?
Por que é que, nas sondagens, já aparece igual ao Partido Comunista, que existe há 100 anos?
E a resposta é simples: por que ele não corresponde aos 0,4 % que tem no Parlamento mas sim à representação de muita gente pelo país fora.
A política é quase sempre um exercício de hipocrisia.
Os políticos não dizem o que pensam, mas o que ‘convém dizer’.
Já escrevia Eça: ‘Sobre a nudez forte da verdade, o manto diáfano da fantasia’.
Ora, Ventura teve o mérito de romper esse manto.
De romper com as conveniências.
De romper com o politicamente correcto.
Assim – repito –, em vez de o atacarem histericamente, os outros políticos deviam tentar perceber as razões do seu sucesso.
E essas podem resumir-se em meia dúzia de palavras: ele veio representar uma parcela da população que sentia não ter ninguém que a representasse.
Ele veio dar voz a muita gente que sentia não ter voz.
Tão simples quanto isto.