Apesar de o Governo continuar intransigente em relação à futura localização do novo aeroporto no Montijo, o projeto volta a sofrer um novo impasse. A ‘culpa’ é do impacto provocado pelo novo coronavírus. O aeroporto de Lisboa, que já estava no limite de número de passageiros ao receber cerca de 30 milhões por ano, está praticamente parado e vai estar encerrado depois de o Governo ter decretado o seu fecho durante a Páscoa. Fonte oficial da ANA Aeroportos garante ao SOL que «neste momento a prioridade é combater a pandemia», mas salvaguarda que «concluído o estado de emergência, o processo do aeroporto complementar do Montijo será retomado».
O mesmo acontece, segundo a empresa, com as restantes obras nos aeroportos, que irão «continuar em curso».
Também o Ministério das Infraestruturas afirma que «o Governo mantém os pressupostos quanto à necessidade da construção do novo aeroporto no Montijo». E acrescenta que se trata de «uma infraestrutura aeroportuária cuja necessidade se mantém no médio e longo prazo e com enorme impacto na atividade económica e de criação de postos de trabalho diretos e indiretos, como sempre tem sido referido». O ministério de Pedro Nuno Santos, ainda que reconhecendo que a prioridade é o combate à crise pandémica, reafirma que «o país não pode parar, pelo que o Governo continua a trabalhar na solução da construção do novo aeroporto do Montijo».
Uma decisão que vai ao encontro do que defendem os analistas contactados pelo SOL, que admitem que o projeto deixou de ser um investimento urgente nos próximos meses. «Considerando a situação económica atual e a previsão para os próximos meses, penso que o investimento deve ser para já suspenso. A fase que vivemos irá afetar negativamente setores cruciais da economia», refere Francisco Alves, analista da Infinox.
Uma opinião partilhada por André Pires. O analista da XTB defende que «a questão do novo aeroporto não voltará à mesa durante muito tempo».
No entanto, os dois economistas estão de acordo ao considerar que tudo depende de como vai evoluir a situação económica. Para Francisco Alves, «tudo depende da forma como a pandemia for controlada. Pressupondo que tudo volta ao normal fluxo de turistas, o aeroporto irá novamente atingir lotação máxima de uma forma gradual», diz ao SOL.
Também André Pires acredita que «a não ser que a atual situação pandémica gere uma crise profunda (ou pior), a situação deverá normalizar rapidamente, mesmo em termos de turismo». Ainda assim, o analista considera que, mesmo que a situação do aeroporto de Portela volte ao estado em que estava, a necessidade «de um novo aeroporto deverá demorar a ser tema de discussão, uma vez que o país terá de digerir a atual queda do PIB».
Já em relação a outros grandes investimentos públicos a opinião dos dois economistas não difere. Para Francisco Alves, neste momento, só devem avançar grandes obras públicas relacionadas com a saúde, como hospitais. «Quanto mais rápido combatermos a pandemia menor repercussões teremos no futuro económico de Portugal». O mesmo pensa André Pires. «Não faz sentido grandes obras públicas neste momento. No entanto, a dificuldade atual nos hospitais em gerirem a afluência de casos de covid-19 pode ser um sintoma da falta de investimento e renovação deste setor», diz ao SOL.
Transportadoras em layoff
Este impasse ganha novos contornos depois de a TAP ter avançado com layoff para 90% dos cerca de 11 mil colaboradores. No entanto, a companhia aérea vai garantir dois terços dos salários a todos os trabalhadores neste regime, assumindo a diferença nas remunerações que fiquem acima do teto máximo de 1.905 euros. Recorde-se que o regime anunciado pelo Governo estipula que o trabalhador recebe um limite máximo correspondente a três salários mínimos (1.905 euros).
Além disso, a TAP vai implementar a redução do período normal de trabalho em 20% para os restantes colaboradores e os «administradores executivos e não executivos propuseram, de forma voluntária, uma redução maior da sua remuneração, no valor de 35%», ao abrigo destas medidas, que «impactam todos os colaboradores de forma transversal».
Uma decisão que não agradou à Comissão de Trabalhadores da empresa, que voltou a reforçar o apelo para que a transportadora se torne 100% pública. A estrutura considera «que estas medidas são gravosas para os trabalhadores sob vários aspetos», pelo que não pode «concordar com as mesmas», questionando se «são necessárias», uma vez que entende que «o caminho pode ser outro, assim haja vontade».
A CT exige «que o Governo assuma as suas responsabilidades para com a companhia de bandeira, garante da continuidade territorial e da soberania e economia nacionais, nacionalizando-a e garantindo todos os postos de trabalho assim como todas as remunerações».
Um cenário afastado por Humberto Pedrosa, presidente do Grupo Barraqueiro e sócio detentor de 50% da Atlantic Gateway – em parceria igualitária com David Neeleman. Pedrosa considera que a nacionalização da empresa representaria «um passo atrás», uma vez que «o contributo dos acionistas privados na TAP tem sido muito positivo, sobretudo na modernização da empresa e na renovação da sua frota de aviões», disse ao Jornal Económico.
É de referir que a TAP conta com uma participação de 50% do Estado, através da Parpública, estando 45% da companhia aérea nas mãos dos privados do consórcio Atlantic Gateway e 5% nas mãos dos trabalhadores.
Uma questão que levou o Bloco de Esquerda a pedir ao presidente do conselho de Administração da companhia aérea uma audição, com caráter de urgência, sobre a situação atual da empresa e a política laboral e comercial. O pedido foi aprovado por unanimidade pela Assembleia da República. «Estando todos e todas conscientes da dificuldade inédita da luta contra esta pandemia, é da maior importância que se compreenda como é que o Governo e as administrações das empresas lidam com setores estratégicos», diz o requerimento entregue na Assembleia da República.
Mais otimista está o presidente executivo da TAP. Numa mensagem vídeo enviada aos trabalhadores, Antonoaldo Neves garante que a companhia vai sair da crise que a covid-19 provocou e que a transportadora «vai estar pronta» para aproveitar as oportunidades que o mercado apresentar. «Hoje a TAP tem condições e força para enfrentar esta situação desafiante que temos vivido. Tanto do lado dos acionistas, como dos fornecedores, dos colaboradores, dos clientes, temos recebido de todos o apoio, a confiança e a confirmação de que estão todos aqui prontos para poder apoiar a TAP no que for preciso para que a TAP continue viva e sustentável, protegendo o emprego de todos os trabalhadores», referiu.
Depois da TAP foi a vez da SATA considerar que o layoff é um «instrumento adequado» face aos impactos que a pandemia da covid-19 está a provocar na transportadora, que tem um total de 1.400 trabalhadores.