A lei que garante o exercício do direito de preferência pelos arrendatários na transmissão das habitações foi declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional (TC).
De acordo com a notícia avançada pela agência Lusa, que cita o acórdão, os juízes do TC concluíram que o regime especial de preferência "sacrifica excessivamente o direito à livre transmissibilidade do prédio, sem satisfazer o objetivo da estabilidade habitacional".
"Trata-se, pois, de uma intervenção legislativa que, nos seus efeitos restritivos ou lesivos, não se encontra numa relação proporcional ou razoável – de justa medida – com os fins prosseguidos", refere.
De realçar que o pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade do diploma tinha sido feito pelo CDS-PP e PSD em outubro de 2018. A lei tinha sido promulgada pelo Presidente da República a 12 de outubro de 2018, já depois da apresentação de uma segunda versão do diploma pelo parlamento, após a primeira versão ser vetada pelo chefe de Estado.
A versão da lei, agora declarada inconstitucional, foi aprovada em setembro pelo Parlamento, com votos contra de PSD e CDS-PP e a favor de PS, BE, PCP, PEV e PAN.
Na altura, Nuno Magalhães, do CDS-PP, considerou que as normas que tinham entrado em vigor violavam "princípios constitucionais fundamentais previstos na Constituição da República Portuguesa", incluindo o direito à propriedade privada, os princípios da proporcionalidade e o direito à justa indemnização.
O BE já reagiu à declaração de inconstitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional. À agência Lusa, o partido anunciou que vai apresentar novamente o projeto original que já tinha entregado na Assembleia da República. Esta foi uma medida que o Bloco de Esquerda chegou a usar na tese de campanha negativa contra o vereador demissionário do partido, Ricardo Robles.
"Esta é uma decisão incompreensível, porque parece sobrepor os interesses dos proprietários, na esmagadora maioria dos casos fundos imobiliários que promovem a especulação, ao princípio constitucional do direito à habitação. Mas o Tribunal Constitucional dá também a entender que, se existir a divisão prévia em propriedade horizontal, estarão ultrapassados os problemas de constitucionalidade", disse a deputada bloquista Maria Manuel Rola à agência noticiosa.
O Tribunal Constitucional considera que "a intervenção na propriedade excede a medida constitucionalmente adequada da vinculação social". "Chegamos assim à conclusão, e decerto não podia ser outra, de que a possibilidade da preferência numa quota do prédio não permite alcançar os objetivos que estão na sua base, pois dessa forma o inquilino não acede de imediato à propriedade da habitação, nem se consegue eliminar a eventual especulação imobiliária", acrescenta.
"A transformação do arrendatário em comproprietário pode criar uma situação de maior 'instabilidade habitacional'", defende ainda o acórdão, de acordo com a Lusa.
Para o Tribunal Constitucional, a norma viola o artigo 62.º da lei fundamental do país. Este artigo diz que "a todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte", conjugado com o n.º 2 do artigo 18.º, que diz que "a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos".