Na visão estratégica para a recuperação económica e social nos próximos dez anos apresentada pelo Professor António Costa e Silva estão identificadas condições para que tudo funcione, nomeadamente, a existência de «uma justiça eficiente e eficaz».
Esta semana saiu a acusação de Ricardo Salgado e de outros envolvidos naquilo que se poderá vir a provar como um dos maiores crimes de colarinho branco da história de Portugal. O processo da queda do Grupo Espírito Santo já custou aos contribuintes milhares de milhões de euros. No entanto, um dos mais pesados custos é a sombra de dúvida que lança sobre a credibilidade das instituições que suportam a democracia. As suspeitas divulgadas envolvem não só o sistema bancário como a corrupção ativa do então primeiro-ministro José Sócrates que terá, alegadamente, recebido um suborno de 17,4 milhões de Salgado.
A acusação demorou seis anos a ganhar forma e anuncia-se que a procissão vai no adro. Possivelmente, quando sair uma sentença definitiva parte dos acusados já não estará entre nós, restando-lhes a justiça divina, sejam culpados ou inocentes. Entretanto, este tempo da Justiça humana arrasa a confiança das pessoas tanto no sistema político, pela alegada corrupção de um primeiro-ministro ao mais alto nível do poder executivo, como no papel de supervisão, estando sob escrutínio a ação do Banco de Portugal.
Neste momento, precisávamos de um sinal político inequívoco de transparência da parte do atual Governo. E o que temos? Por um lado, o Conselho de Ministros, onde se sentam ex-ministros de José Sócrates, recomenda a nomeação para Governador do Banco de Portugal de um dos seus, Mário Centeno, quando o Governador deveria ter, entre outras, a tarefa supervisionar com independência decisões tomadas pelo ministro das Finanças daquele Conselho. Por outro lado, a ministra da Justiça Francisca Van Dunem nomeia para seu adjunto o Juiz Conselheiro José Luís Lopes da Mota, condenado, em 2009, pelo Conselho Superior do Ministério Público a uma pena disciplinar de 30 dias de suspensão por ter pressionado procuradores a arquivarem os autos do caso Freeport, abertos contra o então primeiro-ministro José Sócrates.
Neste episódio trágico da nossa história, que fiquem escritos em pedra dois factos. Primeiro, foi o então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho quem disse «não» a Ricardo Salgado, iluminando as alegadas ilegalidades do Grupo Espírito Santo. Segundo, os deputados e deputadas de todas as forças políticas da Assembleia da República deram um sinal de vigor e de esperança com o trabalho desenvolvido e tornado público na Comissão Parlamentar de Inquérito. Mesmo que não venham a existir sentenças definitivas no nosso tempo de vida, ficarão evidências, tal como ficaram nas Comissões de Inquérito a Camarate. Por estas descobrimos que o desastre de 1980, onde morreram o então primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro, o então ministro da Defesa Nacional Adelino Amaro da Costa e os seus acompanhantes, não foi um acidente, mas um ato «causado por um agente explosivo que visou a eliminação física de pessoas, tendo constituído por isso ação criminosa».
Hoje, peço ao Professor António Costa e Silva para dar prioridade absoluta a uma única frase de entre as suas 120 páginas “ter uma justiça eficiente e eficaz.” Esse é verdadeiramente o nosso calcanhar de Aquiles e a nossa missão para a próxima década.