Já é oficial – a TVI apressou-se a anunciá-lo depois de ter sido questionada pelo SOL. A líder parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, será a nova comentadora residente do programa Circulatura do Quadrado, emitido na TVI24, e na rádio TSF. A parlamentar e dirigente nacional socialista sucede, assim, a Jorge Coelho, antigo dirigente do PS, que abandonou o programa no passado dia 29 de julho, após doze anos e « 500 programas depois», conforme recordou o próprio na hora da despedida. A hora, agora, é da deputada, encarada como uma reserva para o futuro entre socialistas, num cenário ainda remoto de sucessão de António Costa no PS.
O antigo ministro alegou razões pessoais e profissionais para deixar o programa onde participava com António Lobo Xavier, Pacheco Pereira e Carlos Andrade. A informação foi confirmada ontem pela TVI numa nota onde se pode ler que Ana Catarina Mendes foi «a primeira escolha, por unanimidade, dos restantes membros do painel». A líder parlamentar socialista, recorde-se, não é uma estreante no programa. Já lá esteve, por exemplo, no dia 22 de julho. O prato forte do debate foi o conselho europeu e o fundo de recuperação económica da União Europeia.
Segundo apurou o SOL, a saída de Jorge Coelho já estava combinada muito antes da sua despedida pública daquele programa de comentário e análise. A sua queijeira, em Mangualde, ocupa-lhe boa parte do tempo e o antigo dirigente socialista já não tinha tanta disponibilidade para acompanhar todos os temas da atualidade.
Na hora da despedida, Jorge Coelho destacou que, quando entrou no programa, os seus pares de painel eram todos seus meros conhecidos. «Hoje tenho grandes amigos para a vida», afirmou nos últimos minutos do programa no passado dia 29 de julho.
O anúncio da escolha da sucessora de Jorge Coelho veio acompanhado de uma declaração de Carlos Andrade a explicar a opção:«A escolha de uma mulher, apesar de não ter sido critério, é muito positiva e vem reforçar um espaço que, pela sua matriz fundadora, se quer de espíritos livres».
A Circulatura do Quadrado nem sempre se chamou assim. Foi durante bastantes anos a Quadratura do Círculo, transmitida na SIC-Noticias, entre 2004 e 2019. Mas acabou e nasceu o programa, nos mesmos moldes mas com um nome diferente na TVI24 e na TSF ( rádio onde já tinha sido emitido inicialmente).
António Costa, atual primeiro-ministro também foi comentador residente na versão Quadratura do Círculo, tendo abandonado o programa em 2014 para preparar uma nova missão: a campanha eleitoral das legislativas de 2015.
Foi nesse palco, no programa de análise, que Costa aproveitou durante anos para demonstrar as suas diferenças, fosse em relação a José Sócrates, no tempo de primeiro-ministro dos governos PS (2005 a 2011) , fosse na fase em que António José Seguro liderou os socialistas, na oposição.
A versão mais dura foi nos tempos da liderança de Seguro, quando lhe deu um ultimato no início de 2013 para manter a estabilidade dentro do PS. «O que resultou da comissão política é um empenho de todos para procurar construir essa unidade (…) Esse esforço clarifica-se rapidamente até porque há calendários que estão a correr: há uma comissão nacional do PS dia 10 de fevereiro. Até lá tem de haver clarificações da possibilidade ou impossibilidade de haver esse entendimento comum». Esse entendimento chegou em fevereiro de 2013, conhecido como Documento de Coimbra. Mas esta espécie de armistício durou pouco mais de um ano. Nas europeias de 2014, o resultado vitorioso do PS foi curto, Costa desafiou Seguro e ganhou numas primárias inéditas.
Antes, em 2010, quando o governo de José Sócrates aumentou o IVA e apresentou um plano de austeridade, Costa também não gostou dessa opção. Antes já tinha criticado a passividade do então executivo socialista, que contrastava com a determinação do chefe do Governo. Na altura, Costa era presidente da Câmara de Lisboa.
Agora, Ana Catarina Mendes ganha mais um espaço para a avaliação política, além do trabalho parlamentar no PS, onde lidera uma bancada que revelou alguns desalinhamentos no final da sessão legislativa (nos apoios públicos à tauromaquia, na nova lei do mar ou no fim dos debates quinzenais).
De realçar que Ana Catarina Mendes foi, na anterior legislatura, a secretária-geral-adjunta do PS, uma espécie de número dois do secretário-geral, a par com o presidente do PS, Carlos César. É um nome da estrita confiança do primeiro-ministro, tendo um perfil mais discreto.
Apesar de a escolha do nome de Ana Catarina Mendes para o programa Circulatura do Quadrado ser da inteira responsabilidade dos seus participantes, não deixa de ser notório como a deputada e dirigente socialista tem ganho espaço político, inclusivé com batalhas internas no PS ganhas (e Costa a colocar-se ao lado das suas opções). Foi o caso, por exemplo, na formação das listas para as legislativas. O momento mais tenso terá sido na elaboração da lista por Braga. Na altura, o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos (potencial sucessor de António Costa), terá questionado as soluções encontradas numa reunião do secretariado nacional. As questões ( e as críticas) eram para a excessiva interferência da dirigente nacional. E aqui, o primeiro-ministro e secretário-geral do PS terá defendido que a versão encontrada por Ana Catarina Mendes era a que garantia maior equilíbrio para a qualidade das listas.
A história tem um ano e algumas semanas, mas bem pode ser um sinal para o futuro, quando chegar o momento da sucessão de António Costa. Que até já respondeu ao tema com uma pergunta: «Quem lhe diz que não pode ser uma mulher?», questionou o primeiro-ministro no final de uma resposta à Visão sobre hipotéticos sucessores.
Quanto ao programa Circulatura do Quadrado, que fez uma pausa para férias, estará de regresso no dia 2 de setembro.