As férias dos políticos já terminaram e o presidente do PSD, Rui Rio, não terá rentrée, tal como outros líderes partidários com execção do do PCP. Mas é expectável que o partido apresente um plano estratégico a dez anos algures em meados de setembro. O objetivo é ter traves-mestras de propostas para o país, se e quando o PSD chegar um dia ao poder.
Apesar de não haver rentrée formal por causa pandemia da covid-19, Rui Rio já teve alguns pontos de agenda: exigiu conhecer os relatórios sobre o surto de covid-19 em Reguengos de Monsaraz, pediu reforço de verba orçamental para os bombeiros e até comentou os apelos do chefe de Estado para que não haja uma crise política no Orçamento de Estado para 2021. "Como português, é bom que não haja uma crise e que eles sejam capazes de resolver o Orçamento de Estado 2021", argumentou Rui Rio, referindo-se ao BE, PCP e PEV. E, para que não restem dúvidas, esclareceu que o PSD não conta dar a mão aos socialistas: "O Orçamento de Estado vai ser construído pelo PS, PCP e BE, portanto, nessas circunstâncias, o PSD é um espectador atento e, depois, quando o Orçamento de Estado entrar na Assembleia da Republica, logo faremos as nossas considerações em função do documento", lembrou Rui Rio esta semana numa das duas intervenções públicas feitas em direto para as televisões.
No partido, há quem considere que Rio foi mais duro com o PCP por causa da sua rentrée política – a Festa do Avante! – do que com o Governo – e a polémica entre o primeiro-ministro e os médicos. Em todo o caso, o líder social-democrata não terá oposição interna como teve no passado. "A oposição está adormecida", sintetizava ao SOL esta semana um destacado militante. Que preferiu o anonimato por não querer alimentar qualquer ruído interno.
Mas nos últimos três dias houve dois momentos que servirão para memória futura.
Primeiro, um artigo de opinião de Miguel Pinto Luz, vice-presidente da Câmara de Cascais, no Público, a lembrar que "pela primeira vez em anos, o PSD tem uma real possibilidade de vencer as autárquicas. O PSD pode ter mais votos, mais mandatos e mais Câmaras e Rui Rio será o protagonista merecido dessa remontada eleitoral". Pinto Luz, recorde-se, foi candidato à liderança do PSD nas últimas diretas de janeiro. Por isso mesmo, assinalou (no mesmo artigo) que "o PSD está, e bem, pacificado desde as diretas de janeiro. E, como não podia deixar de ser, o presidente do partido tem tido toda a amplitude política para implementar a sua agenda. Ao contrário do PS, entregue a uma nada surda guerra pela sucessão, o PSD é hoje um partido tranquilo". E foi mais longe, dando-lhe um caderno de encargos com várias perguntas: "O discurso da rentrée política de Rio será por isso o momento ideal para dar um sinal, sobre qual é a proposta política com que o PSD se propõe mobilizar o país. Que agenda irá defender? Qual é o espaço que uma social-democracia moderna deve ocupar no contexto nacional e europeu? Quais são as prioridades que Portugal deve eleger para ultrapassar os próximos anos? Que escolhas vai Rui Rio fazer para enfrentar o desafio das autárquicas?".
O partido está pacificado, mas esta opinião sinaliza que a fasquia eleitoral para as autárquicas pode ser alta para os sociais-democratas. E deverá ser mesmo o chamado teste de algodão à liderança de Rui Rio. Isto porque as próximas eleições, com dimensão nacional, as presidenciais, não terão grande surpresa. O PSD vai esperar que Marcelo Rebelo de Sousa se defina, em novembro, para dizer se será recandidato a novo mandato, e só depois dirá que o apoia. Um cenário natural, mas que não entusiasma muitos militantes do partido.
De realçar que o PSD poderá ter de gerir também uma candidatura presidencial na Madeira. Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional da Madeira e líder do PSD/Madeira, não a descartou na semana passada. E quando decidirá? Não há prazo definido, apurou o SOL.
O segundo momento da semana foi a entrevista de Pedro Rodrigues, antigo líder da JSD e atual deputado, à Visão. O parlamentar foi apoiante de Rui Rio mas entrou em rota de colisão com a direção nacional, após a polémica sobre a necessidade de um referendo sobre a despenalização da eutanásia. E foi duro com o líder social-democrata: "Não me recordo – e já sou militante há 25 anos – de um presidente do partido que exercesse o poder de forma tão isolada, tão solitária, com tão pouca discussão interna e com tão pouca sensibilidade para o cultivo da diferença dentro do PSD".
Esta declaração, contudo, é, nesta fase, uma posição solitária, porque dificilmente se encontrará eco destas críticas em público nos próximos tempos.
A incerteza aumenta do ponto de vista da pandemia e a gestão da crise estará do lado do Governo. Que começou já a preparar terreno para o aumento de casos de covid-19 com o anúncio de que avançará com o estado de contingência a partir de 15 de setembro.
À direita, a Iniciativa Liberal pediu, entretanto, uma audiência urgente ao Presidente da República por causa deste anúncio. O partido, liderado por João Cotrim de Figueiredo, quer debater a legalidade desta decisão. Sinal de que, neste espectro político, os consensos sobre medidas a aplicar para prevenir uma segunda vaga não serão tão fáceis de aplicar como o foram no início da pandemia, em março.
Também o Chega, liderado por André Ventura, entregou um projeto de resolução para reverter esta decisão, anunciada no último Conselho de Ministros. "Como diz o povo, o Governo está a tentar que Portugal não morra da doença, mas sim da cura, e isso é inadmissível", lê-se no texto da resolução.
Já o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa considerou que o anúncio do Governo (que lhe foi explicado previamente) serve para "prevenir os portugueses" sobre um contexto de regresso às aulas, ao trabalho e às atividades desportivas amadoras. Dito de outra forma: é o contexto e não tanto as evidências claras científicas que determinam esta avaliação. e, tal como no passado, o Executivo avaliará o evoluir da pandemia a cada quinze dias.
Por sua vez, o CDS focou-se esta semana na educação e no regresso às aulas. Francisco Rodrigues dos Santos, líder do partido, defendeu numa declaração em vídeo que "nenhuma família portuguesa sabe quais são as regras para o próximo ano escolar — a incerteza e o receio, esses sim, são a verdadeira situação de contingência em que o Governo mergulhou o país". Os centristas pretendem ter uma iniciativa de rentrée parlamentar nos Açores, onde haverá eleições regionais marcadas já para o dia 25 de outubro.
Mas o único partido com rentrée formal à direita do PSD foi o Chega. Que já a fez em Loulé, com discursos a pensar também na candidatura presidencial do seu líder. André Ventura está demissionário do cargo de presidente do partido, terá congresso em setembro, mas quis fazer um jantar-comício em Loulé. Segundo a organização, estiveram presentes cerca de 400 pessoas e Ventura disparou para todos os lados. Aos jornalistas, o também deputado deixou um aviso ao PSD: "Ou o PSD entende que tem que fazer estas reformas estruturais com o Chega, em vez de apelar a moderações e a menos radicalização, ou então não contará com o Chega, nem para nenhum governo, nem para nenhuma base de incidência parlamentar". E, por fim, o ataque ao primeiro-ministro: "Nós temos um primeiro-ministro que não sabe ser primeiro-ministro. Em que todos os que se lhe opõem responde mal, responde com agressividade e mostra aquilo que é. António Costa perdeu o controlo. Do país e do Governo" (aludindo à polémica que opôs António Costa aos médicos). Pelo caminho, aproveitou para dar uma farpa a Marcelo Rebelo de Sousa: "Quando vejo o Presidente da República ignorar estas ofensas aos médicos e dizer que o Governo está a fazer tudo o que pode, eu não percebo". Ventura referia-se diretamente a uma expressão em off do primeiro-ministro que circulou nas redes sociais, num vídeo de sete segundos, onde era audível a palavra "cobardes" dirigida a médicos no caso do surto de covid-19 no lar de Reguengos de Monsaraz.