Agricultura. Revolução em 10 anos

Aumentar o peso do setor, torná-lo sustentável e apostar na inovação são as metas do Ministério para a próxima década. Verbas comunitárias e também nacionais dão ‘empurrão’.  

O Governo quer ‘revolucionar’ o setor agrícola na próxima década. E, para isso, o Ministério apresentou esta sexta-feira a Agenda de Inovação para a Agricultura 2030, ou seja, o plano estratégico de inovação para o setor, sob a insígnia Terra Futura. A fórmula é simples: aumentar o peso da agricultura de forma sustentável e baseada na inovação. «Isso só será possível, defendendo uma sociedade mais consciente da sua alimentação e bem-estar, protegendo o planeta e valorizando os recursos naturais, apostando numa cadeia de valor inovadora e competitiva e contando com um Estado que promove o seu desenvolvimento», diz ao SOL, Maria do Céu Antunes, a ministra da tutela.

E os desafios, segundo a responsável, são vários e vão desde as alterações climáticas à diminuição demográfica. «A agricultura é particularmente sensível às alterações climáticas sentidas no dia-a-dia por todos os cidadãos. Por outro lado, o cenário demográfico aponta para uma diminuição da população em Portugal, mas de aumento a nível mundial e de concentração nas cidades e isso leva, inevitavelmente, a que continuemos a assistir a uma mudança dos padrões de consumo. Por outro lado, os recursos são cada vez mais escassos», referindo-se à água, aos problemas associados ao solo e à biodiversidade.

O novo programa está assente em quatro pilares: alimentação, (saúde e bem-estar); território (proteção do planeta e dos recursos naturais; ação climática; valorização dos recursos endógenos; inclusão social e coesão territorial); cadeia de valor (inovação, competitividade e mais rendimento) e Estado (apoia a agricultura, os produtores e promove o desenvolvimento).

Com este programa, o Ministério da Agricultura «pretende responder aos grandes desafios do setor agroalimentar: aumentar a produtividade agrícola e reduzir o défice da balança agroalimentar; responder ao desafio das alterações climáticas, reduzir o consumo de adubos e de energia, incrementar a proteção biológica das plantas, proteger a biodiversidade e os solos; assegurar uma nutrição equilibrada e reduzir as doenças crónicas associadas às dietas não apropriadas», refere a governante ao SOL.

Em torno destes quatro pilares foram apresentadas 15 iniciativas (ver infografia na página 56). Uma delas passa pela aposta na alimentação sustentável. A ideia é valorizar e estimular o consumo de produtos endógenos, garantindo a autenticidade e promovendo a confiança dos consumidores. E isso, passa, por exemplo, por «promover os circuitos curtos e os mercados locais; alteração do regime de contratos públicos para promover o consumo de produtos locais na restauração coletiva; ações de informação e educação para combater o desperdício alimentar».

‘Uma só Saúde’ é outra das iniciativas que tem como objetivo promover a saúde animal e a sanidade vegetal, tendo em conta a promoção do bem-estar da população. Essa estratégia implica «o desenvolvimento de aplicações para a avaliação remota de indicadores de saúde humana, saúde animal, fitossanidade e higiene ambiental; harmonizar abordagens metodológicas e sistemas epidemiológicos de vigilância».

Alterações climáticas na mira

Reduzir as emissões líquidas de gases com efeito de estufa (GEE) produzidos pela atividade agrícola é outro dos objetivos do plano. No entender do Governo é necessário «desenvolver e adotar sistemas de gestão de estrumes e chorumes que sejam menos emissores de GEE; reduzir a aplicação de adubos azotados e incrementar a aplicação de matéria orgânica no solo».

A par disso, o programa defende que é necessário levar a cabo uma adaptação às alterações climáticas, ou seja, «aumentar a resiliência e a capacidade de adaptação às alterações climáticas», acrescentando que é preciso «desenvolver modelos preditivos e elaborar cartas de risco; promover o pastoreio extensivo em terras sem aptidão agrícola; incrementar a capacidade de armazenamento, distribuição e gestão eficiente da água, nomeadamente para o abeberamento de animais». 

Aposta na sustentabilidade

O programa prevê ainda a aposta na agricultura circular com vista a reduzir a pressão extrativa da atividade agrícola e os custos de eliminação de resíduos transformando-os em subprodutos. E dá exemplos: «Promover a compostagem dos bagaços de azeitona; promover soluções integradas de tratamento de efluentes pecuários associados à recuperação de biogás».

Ao mesmo tempo, defende a sustentabilidade dos territórios e isso passa por promover o uso sustentável dos recursos naturais e dos ecossistemas. Uma estratégia assente no aumento da área de produção biológica, de agricultura de conservação e da agro ecologia, no desenvolvimento e adoção de práticas integradas e ecológicas de proteção das plantas que permitam reduzir o uso e o risco dos pesticidas, assim como, promover a apicultura e infraestruturas ecológicas nos campos agrícolas e a plantação e cultivo de variedades regionais de plantas.

Também a revitalização das zonas rurais não ficou esquecida. E, nesse campo, o Ministério liderado por Maria do Céu Antunes pretende promover a atratividade dos territórios rurais. «É necessário melhorar os instrumentos de apoio à renovação geracional; apoiar o desenvolvimento de plataformas de comercialização e de redes de cooperação que facilitem o acesso aos mercados de venda de bens agrícolas; incentivar a diversidade das atividades económicas em meios rurais, nomeadamente de serviços ligados à agricultura», acrescenta o programa. 

Promoção do setor

Promover a transformação digital do setor agroalimentar – Agricultura 4.0 – é outra das apostas e tem como missão «adotar novas tecnologias que promovam o desenvolvimento da agricultura de precisão; explorar as potencialidades da deteção remota e de proximidade (sensores no solo ou nas plantas); capacitação em agricultura 4.0 e literacia digital». Além disso, pretende estimular o consumo dos produtos agroalimentares portugueses. A ideia, de acordo com o Executivo é «valorizar os produtos agroalimentares portugueses, substituindo as importações e aumentando as exportações. Para isso, é fundamental implementar estratégias comuns de comercialização e marketing de produtos agroalimentares e outros setores da atividade económica; desenvolvimento de novos produtos e conceitos para mercados específicos)».

Criar fundo de mutualistas

O programa para a próxima década pretende ainda focar-se na organização da produção e no reforço da posição dos agricultores na cadeia de valor. E, segundo o Ministério da Agricultura, a solução passa pela «criação de fundos mutualistas na agricultura; promover organizações de nível superior, como sejam as interprofissionais ou organizações de produtores de segundo nível; reconhece modelos inovadores de organização de produtores adequados à pequena agricultura familiar e multiprodutos». 

Ao mesmo tempo, o plano tem como objetivo descarbonizar o setor agroalimentar e reduzir os custos com a energia através da ‘Transição Agro Energética’. «Fomentar a eficiência energética e a participação dos agricultores nas comunidades de energia; implementar os direitos consagrados no estatuto da agricultura familiar, nomeadamente a utilização de energia com base em fontes de produção renováveis, sendo muito relevante para o rendimento dos agricultores e para a competitividade do setor agrícola» são as grandes metas desta medida .

Outra das políticas de bandeira do programa passa pela promoção da investigação, inovação e capacitação: «Para que a inovação seja o motor de transformação da agricultura e alimentação», dando como exemplo, o estabelecimento de «linhas orientadoras da investigação e inovação na agricultura e alimentação no período 2020-2030; promover o reforço das qualificações de técnicos e produtores; promover redes de demonstração, coaching e grupos de aprendizagem)».

Também a implementação de uma rede de inovação, tal como o i avançou esta sexta-feira, é outra das apostas do programa. A fórmula é simples: «Reforçar o ecossistema de inovação na agricultura e alimentação, de forma a responder às medidas definidas nas orientações estratégicas, desde as atividades de conservação e valorização das variedades regionais e raças autóctones, até à dinamização da criação de uma rede de incubadoras de empresas de base rural».

A criação de um portal único da agricultura, outra das medidas já avançada pelo i, é uma das metas do Ministério de Maria do Céu Antunes e pretende «agilizar e simplificar a relação do agricultor, dos cidadãos, das empresas e de outros agentes económicos com a Administração Pública, designadamente com os serviços prestados pelos organismos tutelados pela área governativa da agricultura».

Por último, o programa prevê simplificar, reorganizar procedimentos e acelerar a transição digital nos organismos do Ministério da Agricultura, de forma a aumentar a eficiência dos serviços e melhorar as respostas aos cidadãos, aos agricultores e às empresas.

Recorde-se que a ministra da Agricultura tem chamado a atenção para a resposta do setor agrícola e do complexo agroalimentar perante a pandemia, considerando que foi «fundamental e determinante», ao garantir o abastecimento de alimentos aos portugueses.

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