Francisco Rocha Gonçalves. Vice-Presidente da Câmara Municipal de Oeiras
Chegados a setembro e às primeiras chuvas que, na prática, encerram o verão, poucos dias antes do equinócio do outono, percebemos que não regressamos à vida como era antes, depois das férias possíveis. A pandemia de covid-19 mantém-se teimosamente ativa e até se agrava. Não é só em Portugal, é também entre os nossos principais parceiros económicos, a começar pela vizinha Espanha, com números que nos fazem recuar seis meses e alteram as perspetivas esperançosas que pudéssemos ter.
Sabemos que não vamos voltar a fechar-nos compulsivamente, porque seria um golpe desastroso para a economia e para a sociedade, depois de tudo o que já aconteceu. Sabemos, também, que este é o pior ano de que temos registo e que já não há instituições que prevejam uma contração inferior a 9%, a não ser o governo, que deve corrigir o tiro na proposta de Orçamento do Estado para 2021. O pior é que também temos indícios de que a recuperação da atividade económica está a ser mais lenta do que o previsto. Os indicadores do Banco de Portugal referentes à atividade económica e ao consumo privado renovaram mínimos históricos em agosto, mas, para ter a noção de onde nos encontramos, basta ouvir as empresas e ter atenção aos alertas que o presidente da CIP tem deixado. O CFP, como as restantes instituições, prevê que a retoma comece já no próximo ano, de uma forma robusta. Todavia, divergem quanto à velocidade da recuperação, o que é natural, porque a visibilidade que temos é muito pouca ou quase nenhuma neste nevoeiro provocado pela pandemia. Voltar aos níveis anteriores só deverá acontecer em 2023 ou 2024 e isto dependendo da dispersão e insistência da doença, bem como da existência, ou não, de um tratamento eficaz e de uma vacina viável, que são condições de extrema relevância e que vão ditar o que nos espera.
Toda esta introdução para questionar: como vamos garantir a subsistência das pessoas e condições de vida minimamente aceitáveis até que a recuperação económica seja efetiva?
Nos tempos que vivemos, esta pergunta assume uma importância muito maior e mais determinante, não apenas porque assistimos ao extremar do discurso político e das mensagens de inúmeros agentes sociais na sua intervenção no espaço público, mas também porque estamos a marcar o tom para o futuro, quando estamos na antecâmara do acesso a recursos sem precedentes. Como o próprio primeiro-ministro referiu, teremos acesso, anualmente, a praticamente o dobro dos fundos comunitários que tivemos até ao momento.
Chegados aqui, neste contexto, vemos chocar de frente duas conceções antagónicas de promoção do desenvolvimento económico e social da nossa comunidade, entre redistribuidores e investidores, entre aqueles que consideram que tudo se resolve forçando o aumento dos rendimentos, porque atrás virá o desenvolvimento, e aqueles que teimam em investir em condições para aumentar a competitividade do tecido empresarial, para que, através de mais e melhor produção, se consiga criar riqueza.
O risco, neste momento de particular importância do Estado no apoio à atividade económica, é o de pender a balança política em demasia para os distribuidores, sem o devido equilíbrio. Notamos isso, por exemplo, quando, talvez por imposição das necessidades de negociação da nova “geringonça”, a tónica política tem sido sobretudo colocada no aumento dos rendimentos e não na preservação do emprego, na distribuição e não na criação, indiciando que, vingando apenas esta tese, o acordar para a retoma será dolorosamente endividado e impreparado para a concorrência com países onde as opções foram diferentes.
Portugal, sabemo-lo, continua a ser um País demasiado desigual. Todavia, a redistribuição de riqueza carece de políticas públicas focadas na criação da mesma. Deveria ser consensual perceber-se que é preciso criar riqueza para a poder distribuir.
Não há, em Portugal, discursos políticos centrados na criação de riqueza ou na criação de emprego. A necessidade de chamar alguém exterior ao governo para haver programa de criação de riqueza apenas comprova esta afirmação.
O espaço público tem sido dominado por temas que, interessando a alguns, nada dizem à maioria, particularmente aos setores da sociedade que não vêm saída para o seu desemprego e a sua pobreza.
Enquanto o discurso político e as prioridades estiverem capturadas pelas franjas, estas crescerão, mas o País, esse, continuará a piorar…