Apoiar ou até integrar órgãos não executivos de clubes de futebol não é novo na classe política. E, de cada vez que acontece, faz correr sempre muita tinta. O mais recente episódio envolveu o primeiro-ministro, António Costa, e o autarca de Lisboa, Fernando Medina, por integrarem a comissão de honra da recandidatura de Luís Filipe Vieira ao Benfica. Isto apesar de o presidente do Benfica ter retirado todos os políticos da lista e de esta não ter qualquer valor legal, segundo juristas ouvidos pelo SOL.
Ainda assim, o constitucionalista Vital Moreira (que já foi eurodeputado eleito pelo PS) veio a terreiro sugerir a revisão do código de conduta do Governo (criado após a polémica das viagens pagas pela GALP ao Euro 2016): «O futebol entre nós, com o currículo que tem, não é um sítio visitável por políticos honestos, como é o caso; é uma questão de ética política. Se o código deontológico dos governantes não impede essa ligação, devia ser revisto urgentemente», escreveu no seu blogue Causa Nossa antes.
De facto, o código de conduta do Governo é omisso sobre as ligações entre política e futebol, ainda que dê pistas sobre o dever de imparcialidade de qualquer governante.
Este caso estará ultrapassado, mas haverá outros exemplos de políticos que integram órgãos sociais de clubes. Um dos mais visíveis é a Norte, no conselho superior do Futebol Clube do Porto. Trata-se de um órgão consultivo, sem qualquer função executiva. Mas tem Rui Moreira, presidente da Câmara do Porto, e Eduardo Vítor Rodrigues, autarca de Vila Nova de Gaia, na lista eleita.
Nestes casos, há quem admita, entre juristas, que pode haver riscos de nulidade de alguns atos ao abrigo do Código de Procedimento Administrativo. Nomeadamente, caso os autarcas não se declarem impedidos ou não peçam escusa em atos ou decisões que digam respeito aos clubes aos quais se encontrem ligados.
Já Nuno Pinto Coelho de Faria, advogado e especialista em Direito Administrativo prefere deixar um aviso mais genérico: «O dever de reserva seria a melhor profilaxia possível para evitar problemas futuros de suspeições invocadas em função de circunstâncias futuras que mais cedo ou mais tarde acabam por se colocar aos decisores políticos. Esse dever reserva, não diria que é um dever moral, diria que é um dever jurídico para acautelar que não se colocam em situação de suspeição».
Este debate, aliás, já foi feito entre juízes e mereceu a revisão dos seus estatutos. Manuel Soares, Presidente da Direção da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, não comenta os casos políticos. Limita-se a falar dos juízes: «Juízes só na bancada a torcer pelos seus clubes, e depois, de pagarem o bilhete», frisa ao SOL.